O setor de energia renovável no Brasil enfrenta um trade-off entre o fomento de estratégias para a descarbonização da matriz energética e a complexidade de viabilizar novos projetos diante dos desafios atuais.
A crescente adoção de práticas corporativas e políticas sustentáveis, combinada com as vantagens competitivas do Brasil, confirma seu papel de destaque na pauta de transição energética.
Paralelamente, desenvolvedores e investidores enfrentam incertezas regulatórias, imprevisibilidade de receitas e variáveis exógenas que impactam projeções de longo prazo, incluindo restrições do sistema e cenários econômicos voláteis.
Por um lado, observa-se um descompasso entre o excesso de demanda e baixa capacidade instalada nos momentos de pico, reflexo da rápida expansão da matriz e alocação de recursos que demandam maior equilíbrio.
Por outro, discussões acerca de um modelo de precificação mais realista refletem a maturidade do setor, marcando um ponto crucial de inflexão com desafios operacionais e financeiros a serem superados.
No que tange à avaliação econômico-financeira de investimentos — que inclui, mas não se limita, aos ativos renováveis — ambientes de maiores incertezas se refletem em um spread de risco mais elevado, que justifica o custo de oportunidade associado à alocação de capital naquele investimento específico.
Nesse cenário, alcançar a taxa mínima de atratividade torna-se mais desafiador para investidores, impactando a viabilidade de novos projetos.
Para escolhas de investimento condicionadas a teses mais sólidas, o caminho mais sustentável é a busca por fundamentos consistentes que prezem por uma maior eficiência operacional e gestão mais eficiente dos portfólios.
Para isso, devem ser adotadas estratégias integradas que envolvem otimização tecnológica, diversificação de ativos e mecanismos financeiros sofisticados para mitigar riscos. A transição energética demanda flexibilidade e controle sistêmico eficaz.
Dentro desse contexto, limitadores de transmissão, disponibilidade de rede e capacidade de compensar efeitos do curtailment são pontos críticos justamente por não serem fatores endógenos ao desenvolvedor ou gerador.
Essa condição eleva a complexidade das decisões de investimento, já que a mitigação desses desafios depende tanto de intervenções regulatórias quanto de ações coordenadas entre agentes do sistema.
A expansão adequada da capacidade de transmissão combinada às soluções complementares, como a implantação de armazenamento em larga escala (baterias e hidrelétricas reversíveis), são sensíveis para limitar o crescimento observado das perdas e sustentar a pauta de descarbonização.
Este cenário se torna ainda mais evidente quando a discussão recai sobre a abertura do mercado livre para consumidores de baixa tensão, que amplia as oportunidades, mas também demanda soluções flexíveis e eficientes para garantir a sustentabilidade no setor.
O Brasil possui um potencial competitivo significativo na economia verde, sustentado por uma matriz energética diversificada e abundante em recursos renováveis. O avanço de tecnologias digitais, como inteligência artificial, tem o potencial de dinamizar o lado da demanda por energia limpa e fomentar novos modelos de negócio mais eficientes.
Data centers, impulsionados pelo regime Redata, desponta como um segmento promissor à competitividade e atração de players globais através de incentivos fiscais. Para que este cenário se consolide, regras claras e segurança jurídica, combinada à transparência e rastreabilidade dos algoritmos usados para decisões críticas (como despacho ou precificação) se mostram elementos-chave.
As Medidas Provisórias 1300 e 1304 representam avanços significativos e um claro indicativo da maturidade do mercado. Contudo, para que o setor se alinhe a parâmetros mais consistentes, são necessárias segurança jurídica na implementação das novas regras e um período adaptativo para a viabilidade financeira dos projetos e a readequações contratuais.
Ademais, persistem preocupações quanto à plena repercussão tarifária e ao risco de que medidas restritivas limitem a adoção de modelos inovadores e flexíveis, essenciais para a competitividade do setor.
Reconhecer essa dualidade é fundamental para que o mercado brasileiro de energia renovável evolua de maneira sustentável, equilibrando segurança regulatória, atratividade econômica e capacidade de inovação.
O avanço tecnológico aliado a uma agenda regulatória mais integrada e fortalecimento de instrumentos financeiros é essencial para o Brasil capturar todo o potencial de sua matriz limpa.
Os exemplos internacionais mostram que a transição energética de fato ocorre com investimentos robustos em armazenamento de longa duração, digitalização e gestão inteligente do sistema.
Paralelamente, é imprescindível acelerar a expansão da transmissão e aprimorar os mecanismos de gestão da demanda, criando um ambiente flexível que suporte o crescimento sustentável. Dessa forma, o compromisso com uma matriz robusta e autossustentável se consolida.
Sasha Sampaio é VP de Finanças Estruturadas da Lightsource bp no Brasil
