Opinião

Renováveis em transição

É imprescindível acelerar expansão da transmissão e aprimorar mecanismos de gestão da demanda, escreve Sasha Sampaio

VP de Finanças Estruturadas da Lightsource bp no Brasil, Sasha Sampaio
VP de Finanças Estruturadas da Lightsource bp no Brasil, Sasha Sampaio

O setor de energia renovável no Brasil enfrenta um trade-off entre o fomento de estratégias para a descarbonização da matriz energética e a complexidade de viabilizar novos projetos diante dos desafios atuais.

A crescente adoção de práticas corporativas e políticas sustentáveis, combinada com as vantagens competitivas do Brasil, confirma seu papel de destaque na pauta de transição energética.

Paralelamente, desenvolvedores e investidores enfrentam incertezas regulatórias, imprevisibilidade de receitas e variáveis exógenas que impactam projeções de longo prazo, incluindo restrições do sistema e cenários econômicos voláteis.

Por um lado, observa-se um descompasso entre o excesso de demanda e baixa capacidade instalada nos momentos de pico, reflexo da rápida expansão da matriz e alocação de recursos que demandam maior equilíbrio.

Por outro, discussões acerca de um modelo de precificação mais realista refletem a maturidade do setor, marcando um ponto crucial de inflexão com desafios operacionais e financeiros a serem superados.

No que tange à avaliação econômico-financeira de investimentos — que inclui, mas não se limita, aos ativos renováveis — ambientes de maiores incertezas se refletem em um spread de risco mais elevado, que justifica o custo de oportunidade associado à alocação de capital naquele investimento específico.

Nesse cenário, alcançar a taxa mínima de atratividade torna-se mais desafiador para investidores, impactando a viabilidade de novos projetos.

Para escolhas de investimento condicionadas a teses mais sólidas, o caminho mais sustentável é a busca por fundamentos consistentes que prezem por uma maior eficiência operacional e gestão mais eficiente dos portfólios.

Para isso, devem ser adotadas estratégias integradas que envolvem otimização tecnológica, diversificação de ativos e mecanismos financeiros sofisticados para mitigar riscos. A transição energética demanda flexibilidade e controle sistêmico eficaz.

Dentro desse contexto, limitadores de transmissão, disponibilidade de rede e capacidade de compensar efeitos do curtailment são pontos críticos justamente por não serem fatores endógenos ao desenvolvedor ou gerador.

Essa condição eleva a complexidade das decisões de investimento, já que a mitigação desses desafios depende tanto de intervenções regulatórias quanto de ações coordenadas entre agentes do sistema.

A expansão adequada da capacidade de transmissão combinada às soluções complementares, como a implantação de armazenamento em larga escala (baterias e hidrelétricas reversíveis), são sensíveis para limitar o crescimento observado das perdas e sustentar a pauta de descarbonização.

Este cenário se torna ainda mais evidente quando a discussão recai sobre a abertura do mercado livre para consumidores de baixa tensão, que amplia as oportunidades, mas também demanda soluções flexíveis e eficientes para garantir a sustentabilidade no setor.

O Brasil possui um potencial competitivo significativo na economia verde, sustentado por uma matriz energética diversificada e abundante em recursos renováveis. O avanço de tecnologias digitais, como inteligência artificial, tem o potencial de dinamizar o lado da demanda por energia limpa e fomentar novos modelos de negócio mais eficientes.

Data centers, impulsionados pelo regime Redata, desponta como um segmento promissor à competitividade e atração de players globais através de incentivos fiscais. Para que este cenário se consolide, regras claras e segurança jurídica, combinada à transparência e rastreabilidade dos algoritmos usados para decisões críticas (como despacho ou precificação) se mostram elementos-chave. 

As Medidas Provisórias 1300 e 1304 representam avanços significativos e um claro indicativo da maturidade do mercado. Contudo, para que o setor se alinhe a parâmetros mais consistentes, são necessárias segurança jurídica na implementação das novas regras e um período adaptativo para a viabilidade financeira dos projetos e a readequações contratuais.

Ademais, persistem preocupações quanto à plena repercussão tarifária e ao risco de que medidas restritivas limitem a adoção de modelos inovadores e flexíveis, essenciais para a competitividade do setor.

Reconhecer essa dualidade é fundamental para que o mercado brasileiro de energia renovável evolua de maneira sustentável, equilibrando segurança regulatória, atratividade econômica e capacidade de inovação.

O avanço tecnológico aliado a uma agenda regulatória mais integrada e fortalecimento de instrumentos financeiros é essencial para o Brasil capturar todo o potencial de sua matriz limpa.

Os exemplos internacionais mostram que a transição energética de fato ocorre com investimentos robustos em armazenamento de longa duração, digitalização e gestão inteligente do sistema.

Paralelamente, é imprescindível acelerar a expansão da transmissão e aprimorar os mecanismos de gestão da demanda, criando um ambiente flexível que suporte o crescimento sustentável. Dessa forma, o compromisso com uma matriz robusta e autossustentável se consolida.


Sasha Sampaio é VP de Finanças Estruturadas da Lightsource bp no Brasil

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