Quando uma empresa explora e produz petróleo e gás natural no Brasil, sujeita-se à assinatura de um contrato com a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Esses contratos preveem a destinação obrigatória de 1% (Contratos de Concessão e de Partilha) e 0,5% da receita bruta (Contratos de Cessão Onerosa) à pesquisa, desenvolvimento tecnológico e inovação.
Essa cláusula vigora nos contratos da ANP há 25 anos e, atualmente, determina que do valor de investimento, no mínimo 30 a 40% seja destinado a empresas brasileiras com o intuito do desenvolvimento da cadeia de fornecedores, 30 a 40% a instituições de ensino e pesquisa e 20 a 40% à própria empresa petrolífera ou em outras empresas brasileiras.
Com o avanço das questões climáticas, o processo de descarbonização também passou a ser regulado pela ANP e, desde 2022 há também a possibilidade de investimentos com recursos da cláusula de PD&I na área de meio ambiente e novas energias em geral, incluindo os biocombustíveis, a captura e utilização do carbono, hidrogênio, energia eólica, solar, dentre outras.
O programa sempre teve um enorme sucesso e em 2022 o volume de investimentos superou 4 bilhões de reais.
Atualmente o programa é regido pela Resolução ANP nº 918/2023. Um projeto de PD&I pode ser executado, individualmente ou em coexecução, por empresas brasileiras ou instituições credenciadas, e financiado por uma ou mais empresas petrolíferas.
De acordo com a Resolução 918, são admitidos projetos de pesquisa básica, pesquisa aplicada, desenvolvimento experimental, construção de protótipo, construção ou aprimoramento de unidade piloto, estudo de bacias sedimentares com aquisição de dados, projeto de tecnologia industrial básica e de engenharia básica, dentre outros.
Sugere-se que a negociação da propriedade intelectual seja realizada antes do início dos projetos, abrangendo todo o escopo da pesquisa, já que a Resolução não determina regras específicas acerca do tema. Em geral a empresa petrolífera exige a titularidade ao menos parcial da propriedade intelectual do resultado do projeto, para utilizá-lo em suas atividades de pesquisa ou de operação, licenciá-lo para terceiros ou receber royalties pela sua utilização.
Ou ela pode ter outros interesses, como obter preferência de uso do resultado do projeto, receber descontos sobre o preço de venda do produto final, ter acesso a uma quantidade definida de serviços de suporte gratuitos por um determinado período, dentre outras possibilidades.
Empreendedorismo e transferência tecnológica
A Resolução estimula também o empreendedorismo e o desenvolvimento de startups no setor em parceria com instituições credenciadas, visando a transferência de tecnologia.
Os projetos devem ser enquadrados nas áreas, temas e subtemas constantes do Anexo I da Resolução. Os principais temas são exploração e produção, gás natural, abastecimento, biocombustível, outras fontes de energia (hidrogênio, energia solar, outras fontes alternativas), além de temas transversais como segurança e meio ambiente, distribuição, logística e transporte. Constam também temas de cunho regulatório, econômico e jurídico.
O prazo máximo de duração de um projeto é de sessenta meses.
A ANP também possui um programa de recursos humanos chamado PRH que, a partir de 2019, começou sua 2ª fase com investimentos da Cláusula de PDI.
O programa de PD&I deve seguir adiante com muitos investimentos, já que o setor apresenta sempre uma forte demanda em novas tecnologias e recursos humanos.
Com a produção em águas cada vez mais profundas, chegando a 7 mil metros de profundidade, há a necessidade de novos equipamentos e tecnologias subsea e de separação de CO2.
Há a necessidade de adaptação das refinarias ao óleo leve do pré-sal e outras inúmeras questões relacionadas à digitalização, transporte de óleo e derivados, descarbonização, segurança, meio ambiente, dentre tantas outras questões.
Os recursos da Cláusula de PD&I tem sido fundamentais para o desenvolvimento de novas tecnologias necessárias para a indústria de óleo e gás. Além disso, é notório que as tecnologias desenvolvidas por essa indústria impactam de forma positiva em outros setores da economia brasileira, gerando inovação, competitividade, emprego e renda no país.
Atualmente esses recursos são também cruciais para que o Brasil possa atingir suas metas de redução de emissões, e fazer a transição para uma economia de baixo carbono.
Este artigo expressa exclusivamente a posição da autora e não necessariamente da instituição para a qual trabalha ou está vinculada.
Júlia Borges da Mota é sócia do Murayama, Affonso Ferreira e Mota Advogados. Graduada em Direito Internacional pela Universidade de Aix-Marseille III, na França (1994). Tem pós-graduação em Direito Aeronáutico e em Economia e Gestão do Transporte Aéreo pelo Instituto do Transporte Aéreo da Universidade de Aix-Marseille III, na França (1995). Sócia-fundadora e presidente da Câmara Brasileira de Resolução de Conflitos em Energia e Mineração – CBME.