Não, não foi bem a Lava-jato que direcionou a criação de uma diretoria de governança na sociedade de economia mista conhecida como Petrobras. Se, no Brasil, ela era vista como vítima, os investidores internacionais, sobretudo nos EUA, a viram como algoz.
Tanto que a Petrobras foi investigada pelo Departamento de Justiça, pela SEC (Securities and Exchange Commission) e até foi processada por investidores nos EUA, houve arbitragem em outros lugares, inclusive no Brasil. E fez acordos bilionários com alguns deles, inclusive um Non Prosecution Agreement (NPA), de natureza penal.
Ainda está no ar, inclusive, um site criado há alguns anos para investidores americanos.
Mas simplificar a descrição da Petrobras, naquele período ruim, entre 2014 e anos seguintes, como algoz é outro risco e, certamente, um erro.
Não obstante, pode ser muito mais fácil pegar um peixe grande do que um pequeno, a depender de como se pesca. A Petrobras é um peixe grande, facilmente identificável até dos EUA. Daí que lá ela é até passível de punição na esfera penal, sem prejuízo da punição civil e até administrativa, pela SEC, a CVM de lá.
Quem abusou dela, dentro ou fora, como político, como diretor, como contratado, o que seja, somente poderia ser responsabilizado se a Petrobras, o peixe grande, colaborasse com as investigações.
Colaboração com investigações é uma premissa que nós mesmos, no Brasil, adotamos quando é o caso de negociação de acordo de leniência (como o NPA da Petrobras) e de colaboração. Ganha-se pontos, diminui-se até multas, reduz-se os custos astronômicos que estão envolvidos nesses casos, inclusive por limitação a mercados.
A leniência é a colaboração premiada das empresas e permite que se consiga uma punição mais branda para quem assina e que está do lado oposto ao da autoridade pública que tem o dever de propor punições em razão de ilícitos e eventuais erros de agentes do estado, sejam brasileiros, sejam estrangeiros, podem e merecem ser corrigidos.
Leniências e colaborações são a segunda melhor alternativa às restrições de direito, de crédito e, no caso das pessoas físicas, à liberdade, com maior rapidez que inquéritos e processos judiciais podem oferecer.
Mais pragmatismo, menos ideologia
Falando em crédito, como teria sido aquela capitalização gigante da Petrobras em 2010 sem os investidores estrangeiros? Não teria sido. Melhor aceitar os fatos.
Além disso, a prática comum nesses casos de envolvimento de empresas em esquemas de corrupção, fraude, lavagem de dinheiro, improbidade etc., é a implementação de mudanças concretas para que absurdos não voltassem a acontecer.
Que mudança não mágica poderia ter sido e foi feita na Petrobras e tantas outras empresas que passaram pelo apuro que elas passaram? Começa com a estruturação de uma área de governança, que pode se chamar de área de integridade, compliance etc. O nome importa menos do que ela faça, a autonomia que tenha, quem a lidere, o orçamento de que disponha etc.
Bom, mas por que se dobrar a essas “práticas do imperialismo”… em 2023 ainda existe quem use e compre esse discurso dos tempos de outrora? A soberania e o globalismo se equilibram, claro. Somente o antiglobalismo precisa ser deixado para trás, para sempre. E pragmatismo é importante demais para dar espaço para mais ideologia.
Além disso, ninguém aprendeu nada com a invasão do Capitólio em 2021, o 8 de janeiro de 2023 no Brasil?
E, se nada mais sensibilizar quem precisa repensar algumas questões para atender o melhor interesse público, o “não abrimos mão da nossa soberania” de hoje pode soar como o “não abro mão da minha autoridade” de pouco tempo atrás, um discurso, uma prática, uma política que não deu nada certo para o Brasil.
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