A Associação Brasileira de Grandes Consumidores de Energia e de Consumidores Livres (Abrace) reuniu na última semana economistas dos candidatos à presidência da República para mostrar suas propostas e demandas para os setores de energia e gás natural no país. O encontro aconteceu em São Paulo.
A epbr conversou com o presidente da Abrace, o ex-diretor da Aneel, Edvaldo Santana, sobre as propostas da entidade. Ele prega a necessidade de racionalidade para que as decisões do setor sejam tomadas com lógica econômica, defende a mudança na gestão das agências e também na indicação de diretores para os órgão reguladoras.
O bate-papo com o presidente da Abrace faz parte de uma série de matérias feitas pela epbr para mostrar os pleitos de todos os segmentos da indústria de energia no Brasil para o(a) próximo (a) presidente do país. Já mostramos por aqui o que os estaleiros querem e o que as petroleiras indicam para quem estiver no Palácio do Planalto a partir de janeiro de 2019.
Veja abaixo os principais pontos da entrevista:
Energia elétrica
“O que tem atrapalhado o setor elétrico nos últimos tempos é que as coisas não são decididas de forma racional. A gente prega a racionalidade econômica em tudo. Antes de fazer, analisar se faz sentido. Já cansei de falar da MP 579 e o estrago que ela causou. E não foi apenas ela.
Para ter mais racionalidade precisa ter menos intervenção. Se a gente tivesse que escolher uma coisa só para dizer para um candidato, acho que diria que o setor elétrico fica melhor resolvido se conseguirmos uma maneira de blindar o setor das intervenções. Se conseguir isso já resolve 50%.”
Como faz isso?
“O pano de fundo da nossa proposta é o mercado. Na Abrace, para ser associado, é preciso ser livre. O consumidor livre paga hoje 25% ou 30% menos do que o consumidor regulado. Na energia, não na tarifa final. Como paga menos, todo subsídio que tem na hora de repartir é alocado para o consumidor de alta tensão, que é o livre. Então não adiantou o consumidor migrar.
Se todo mundo fosse mercado. Todos os consumidores. Isso seria muito mais difícil de fazer. E todos os consumidores lutariam para barrar os subsídios e não para cada um ter o seu subsídio. Por isso que a gente defende que a forma de blindar contra intervenção é o mercado.
Sabemos que intervenção no setor de infraestrutura sempre vai existir. Existe no mundo inteiro. Até nos Estados Unidos. Mas em excesso é complexo.”
Como fazer isso com indicações para as agências vindo da política?
“Uma das principais sugestões que damos é sobre isso. A estrutura de governança das agências precisa mudar. Faça como é feito na Inglaterra, no Chile. O diretor-geral da agência reguladora lança edital quando tem dois, três meses para acabar um mandato e começa a receber currículos para aquela vaga. Nomeia uma banca. Na Inglaterra são profissionais de Oxford, Cambridge nessa banca. Eles avaliam e escolhem um currículo. E não passa por mais lugar nenhum.
Então. Seja lá quem for eleito tem que fazer uma grande reforma para o setor elétrico andar pelas próprias pernas. A agência tem que ter capacidade para ajudar a formular. Essa capacidade de formular eu não sei se ainda existe.”
A participação do governo na gestão regulatória é prejudicial ao setor?
“É uma das principais ineficiências do setor elétrico brasileiro. Isso para mim é muito mais importante do que o projeto de lei 1917, que trata sobre a portabilidade da conta de luz. Sem resolver isso pode fazer 500 projetos de lei. Esse é o ponto fundamental. O modelo não funciona. Não adianta fazer nada sem fazer uma profunda alteração na estrutura de governo. Hoje existem decisões que deveriam ser tomadas pelo ONS e acabam sendo tomadas no Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE). Isso tem que mudar.”
Como o senhor enxerga o projeto da Lei Geral das Agências Reguladoras?
“Tem coisas positivas, como a quarentena prévia. Mas não resolve o problema das indicações. No resto é bem positivo.”
E quais são os problemas que vocês enxergam no setor de gás natural?
“O setor de gás natural tem menos absurdos, mas são grandes desafios. A falta de transparência é um problema. Tenho ficado impressionado com o diretor-geral da ANP, Décio Oddone, depois da greve dos caminhoneiros. Eles abriram uma chamada pública para quem quiser ocupar o espaço que ficará disponível no gasoduto Brasil-Bolívia (Gasbol). Isso era impensável até um tempo atrás.”
Mas qual é o grande problema hoje?
“A Lei do Gás já cria o mercado livre. Mas para ter mercado tem que ter espaço. O que a gente mais quer é transparência. Que alguém controle o uso do gasoduto e diga: tem espaço para tanto. Aí sim tem mercado livre. Se resolver isso já dá um grande passo.”
Isso resolve?
“A gente não quer subsídios. Queremos escolher de quem comprar. Transparência e mercado.”