Mudança de posição de Trump sobre o Irã causa dor de cabeça a investidores

Donald Trump
Donald Trump

Donald Trump, como ninguém, tem preferência por algumas expressões ao falar com entusiasmo sobre algo. Quem acompanha com certa regularidade o presidente dos EUA no noticiário e no Twitter deve ter percebido que palavras como “realmente”, “sinceramente” e “gravemente” são indispensáveis em seu vocabulário, principalmente quando trata de assuntos como “fechar um negócio rapidamente”.

Essa preferência linguística de Trump veio à tona novamente na terça-feira, quando o presidente insistiu que o que realmente queria do Irã não era uma mudança de regime, mas um país sem armas nucleares, disposto a conversar. “Eu realmente acredito que o Irã deseja fazer um acordo”, foram suas palavras iniciais em uma coletiva de imprensa durante sua visita ao Japão, antes de complementar: “Acho que isso seria bastante sensato da parte deles e acredito que é possível que isso aconteça”.

O fato de o Irã não demonstrar qualquer desejo de fechar tal acordo com Trump parece ser menos importante neste momento.

Poucas horas depois das manifestações do presidente, jornais e colunas de opinião o criticavam por fazer pouco caso do bem conhecido desejo do seu Assessor de Segurança Nacional, John Bolton, de mudar o regime no Irã.

Para piorar ainda mais a incredulidade causada por sua mudança de posição em relação ao Irã, Trump fez uma declaração imprecisa de que o último teste com mísseis da Coreia do Norte não havia violado as resoluções da ONU, novamente fazendo pouco caso de Bolton.

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Vaivém sobre o Irã repercutirá mais no petróleo do que em qualquer outro lugar
Embora o vaivém de Trump sobre o Irã sem dúvida seja uma preocupação para todo o mundo, em nenhum outro lugar essa nova crise de confiança em torno da sua política será mais sentida do que no mercado de petróleo.

Gráfico 5 Horas do WTI - Powered by TradingView
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Isso porque o chamado risco geopolítico gerado pelas tensões no Oriente Médio, responsável por grande parte da força do petróleo nos últimos dois meses, é fruto do conflito entre EUA e Irã e do bloqueio feito pelo governo Trump às exportações petrolíferas da República Islâmica.

Além dos cortes de produção da Opep e das sanções norte-americanas ao petróleo venezuelano, o suporte mais importante do petróleo neste momento é a situação iraniana, principalmente com o acirramento da guerra comercial entre EUA e China, que está espalhando medo por causa dos seus impactos à economia mundial. Sem uma adequada demanda mundial de petróleo, a restrição de oferta é praticamente a única forma de manter o “equilíbrio” do mercado – termo usado pela Opep para preços mais altos.

Se tudo o que o presidente dos EUA quer é ter certeza de que o Irã não está produzindo armas atômicas ou enriquecendo urânio – o que o governo Rouhani nega, sem dar a Trump a satisfação de uma reunião para provar isso –, não haveria muitas razões para sancionar o país. Afinal, essa era justamente a razão de ser do Plano Global de Ação Conjunta, programa de política externa criado pelo presidente Barack Obama, que Trump rasgou assim que assumiu o cargo.

Alívio temporário nas sanções geraria uma grande dor de cabeça para os touros
Se Trump realmente sugerir um alívio, ainda que temporário, para as sanções às exportações petrolíferas do Irá, a fim de convencer o país a ir à mesa de negociação, isso gearia uma dor de cabeça e tanto para os touros do mercado, em razão do provável crash seguinte nos preços tanto do West Texas Intermediate norte-americano quanto do britânico Brent – independentemente dos cortes da Opep liderados pela Arábia Saudita. Nesse cenário, é possível que os sauditas tenham ficado presos a uma situação de cortes de oferta indefinidos, a fim de evitar perdas maiores, principalmente diante da indisposição da Rússia, sua principal aliada até agora no suporte do mercado, em continuar contendo as exportações de petróleo por muito tempo.

Enquanto diversas manchetes tentam dar algum sentido a esse novo posicionamento mais ameno de Trump em relação ao Irã – país que ele havia ameaçado com ação militar há apenas algumas semanas – nada disso é uma surpresa para nós, do Investing.com.

Já em 5 de abril, escrevemos que Trump poderia oferecer ao Irã a opção de negociar se quisesse evitar uma crise econômica maior por causa do seu programa nuclear.

Para Trump, poucas coisas são mais importantes do que os preços baixos para o petróleo
Acreditamos que poucas coisas importam mais ao presidente americano do que manter os preços do petróleo nos menores níveis possíveis até sua campanha de reeleição, em novembro de 2020. Ainda há um longo caminho pela frente, mas ele tentará fazer isso – essa é a nossa convicção.

Essa também pode ser a razão pela qual Trump não firmará um acordo com a China imediatamente. Um acordo comercial entre os dois países poderia dar um incrível impulso ao petróleo, diante da disposição de Pequim de adquirir o petróleo norte-americano assim que o acordo for fechado. Os preços do petróleo despencaram 7% na semana passada, pois as hostilidades comerciais entre EUA e China poderiam se intensificar com a falta de um acordo.

Como sugerimos em nosso artigo anterior, a mera noção de um Acordo Nuclear 2.0 entre EUA e Irã que permitisse ao país árabe voltar a exportar seu petróleo, ainda que com algumas restrições, poderia reduzir o valor nominal do petróleo em US$ 5 ou mais.

Mesmo assim, destacamos razões pelas quais tal acordo pode não ocorrer. Entre elas estaria a falta de simpatia do presidente iraniano Hassan Rouhani para com Trump, em comparação com seu antecessor, Barack Obama, e também protestos por parte de Israel. A relação histórica com a Arábia Saudita e Israel tem sido central para a política norte-americana no Oriente Médio, a fim de fazer frente às ambições regionais do Irã. Todas essas razões continuam presentes.

Mas, a julgar pelo temperamento de Trump, ele pode propor a realização de tratativas com o Irã só para derrubar o mercado.

Ninguém esperava que Trump se sentasse com Kim Jong-un depois de um ano trocando farpas com ele, embora a cúpula com o líder norte-coreano não tenha permitido que Washington avançasse nenhum passo em seu objetivo de desarmar nuclearmente Pyongyang. Até agora Trump tem feito o jogo chinês nas tratativas com a Coreia do Norte.

Embora pareça que os iranianos estejam indignados com a negociação sugerida por Trump, negando inclusive a oferta de mediação do Japão, o Ministro de Relações Exteriores do país, Javad Zarif, no entanto, pediu que o presidente americano provasse suas intenções “por meio de ações, e não palavras”.

Para um presidente empenhado em reduzir os preços do petróleo, um alívio temporário nas sanções poderia ser visto como uma forma de aplacar os iranianos. E a necessidade econômica poderia, em última instância, forçar os iranianos a se sentar à mesa – como aconteceu em 2015. Sem falar que Trump sempre pode reimpor sanções, tal como fez com o aumento de tarifas sobre a China, caso as tratativas não avancem como ele deseja.