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Espera por leis complementares da reforma tributária preocupa indústria de óleo

Lacunas sobre obrigações fiscais, a serem preenchidas por legislação complementar, podem trazer implicações significativas para os investidores e operadores no Brasil, escrevem Monique Lourenço de Almeida e Orlando Velasco

Lacuna sobre obrigações fiscais na espera das leis complementares da reforma tributária preocupa indústria de petróleo. Na imagem: Painel no Senado exibe votação da PEC 45/2019, da reforma tributária, em 8/11/23 (Foto: Roque de Sá/Agência Senado)
Painel no Senado exibe votação da PEC 45/2019, da reforma tributária (Foto: Roque de Sá/Agência Senado)

A Reforma Tributária está prestes a redefinir os contornos da economia e impactar, diretamente, as estratégias de planejamento das organizações no Brasil. A adoção completa do novo sistema ainda depende da aprovação de leis complementares que trarão as diretrizes para o regramento de novos tributos em diversas indústrias – a serem aprovadas em breve.

Assim, no atual momento, as novas regras possuem lacunas sobre as obrigações fiscais, o que tem gerado preocupações em alguns setores, mais notadamente o de Óleo e Gás (O&G), onde a falta de previsibilidade pode trazer implicações significativas para os investidores e operadores no país. As incertezas passam, também, pelo risco no desenvolvimento de novos projetos.

Um ponto de preocupação nesse debate é quanto às isenções tributárias para incentivar a evolução do setor.

Um desses benefícios é o Repetro – regime aduaneiro especial que permite a importação e aquisição local de equipamentos específicos para atividades de pesquisa, exploração e produção de petróleo e gás natural, com suspensão  de tributos federais, como Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), Programa de Integração Social (PIS) e Contribuição da Seguridade Social (Cofins), e suspensão ou alíquota de 3% do imposto estadual sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS).

O regime é estratégico, uma vez que simplifica as rotinas aduaneiras, contribuindo na redução de custos associados a essas operações e facilitando o acesso à tecnologia de ponta. Um dos questionamentos mais ouvidos pela Deloitte nesse sentido, feitos por executivos do mercado, é se as isenções dos novos tributos – Contribuição Sobre Bens e Serviços (CBS) e o Imposto Sobre Bens e Serviços (IBS) – para aquisição de bens de capital vão alcançar o setor na mesma medida que o Repetro. 

Outro fator importante é sobre os itens que não são considerados bens de capital. Para estes, as regras definem o pagamento dos novos tributos, mas, considerando que grande parte do petróleo produzido no país é destinado à exportação, as leis complementares precisarão definir como e em quais termos ocorrerá a devolução desses créditos fiscais ao exportador.

Outras dúvidas que circulam dentro dessas organizações se referem à cadeia de suprimentos. Atualmente, o Repetro concede a suspensão da cobrança de tributos na aquisição de matérias-primas usadas na fabricação dos equipamentos para a produção do petróleo e gás natural no país.

O novo sistema tributário precisará definir se a isenção de IBS/CBS para bens de capital atingirá as etapas antecedentes a essa fabricação, e como os fabricantes locais serão ressarcidos pelo possível acúmulo de créditos – visto que não haverá exportação do produto final para ter acesso à devolução dos créditos fiscais em dinheiro.

Lacuna regulatória pode afetar decisões de investimento

A Reforma Tributária também trouxe uma mudança crucial para a indústria extrativista: a criação do imposto seletivo, voltado para produtos considerados prejudiciais à saúde e ao meio ambiente. No texto do novo sistema, apenas o setor de recursos minerais não-renováveis teve alíquota máxima definida, de 1%. A preocupação das organizações é em relação ao valor sobre o qual incidirá essa porcentagem, que ainda está em aberto e deve ser dimensionado pelas leis complementares

Diante do cenário tributário que se desenha, outras questões práticas se tornam incertezas para o setor de O&G. O afretamento de embarcação, atividade fundamental na logística e operação das organizações, está sujeito às mudanças que virão. A atual carga tributária no afretamento local que, atualmente, escapa do Imposto Sobre Serviços (ISS), será impactada pelo novo IBS. Já no âmbito internacional, a isenção de tributos no afretamento internacional de embarcação será atravessada pelo IBS/CBS, o que causará um aumento dos custos operacionais e redução na capacidade de investimentos. 

Investidores, sejam nacionais ou estrangeiros, buscam ambientes regulatórios estáveis e previsíveis para tomar decisões estratégicas. A falta de definição nas leis complementares da Reforma Tributária por um prazo muito longo poderá atrasar as decisões de investimento no país.

Para não falar dos impactos econômicos sem um quadro tributário claro e consistente, em que as empresas do setor de O&G enfrentarão dificuldades para avaliar os riscos e benefícios associados aos seus empreendimentos, o que pode resultar na postergação de projetos ou até mesmo na redução de suas operações.

Restaurar a confiança dos investidores exigirá não apenas a resolução dessas lacunas regulatórias tão logo possível, mas também a demonstração de comprometimento com a estabilidade e previsibilidade do ambiente de negócios. Dessa forma, será possível mitigar os riscos de um impacto negativo duradouro nos investimentos e promover um crescimento sustentável no setor.

Este artigo expressa exclusivamente a posição dos autores e não necessariamente da instituição para a qual trabalham ou estão vinculados.

Monique Teixeira Lourenço de Almeida é sócia de VAT e Global Trade Tax da Deloitte.

Orlando Velasco é sócio de Impostos Indiretos da Deloitte.