Parece disco riscado, mas não é. De novo vemos a questão da interferência da presidência em questões da Petrobras e a queda brutal do preço das ações dela.
O contexto, porém, é outro.
Quem votou no atual governo federal já sabia que o Ministro da Economia seria favorável à saída do Estado, diretamente ou via sociedades de economia mista e estatais, da economia. E quem não votou? Bom, a democracia exige saber perder e aceitar a situação, a que se pode oferecer uma oposição, mas que precisa ser razoável, menos ideológica.
A discussão – sobre onde o Estado deve estar presente e onde não deve – é antiga, internacional e toma novos contornos a cada ciclo, que pode ser e tem sido curto. As maiores empresas de energia do mundo (até há pouco referidas como empresas de petróleo) não são estatais. Isto já dá uma forte dica de onde o Brasil pode estar errando, mas é claro que se deve admitir que a fórmula brasileira pode ser diferente e, quem sabe, o melhor para o Brasil é que a Petrobras continue a ser estatal, mas definitivamente com maior foco.
Que foco?
Vem do voto popular no governo federal uma certa legitimidade para os projetos de desinvestimento da Petrobras, inclusive e talvez sobretudo, nas bilionárias refinarias que serviram de mecanismos para o abastecimento de campanhas políticas, como já ficou tão conhecido em razão da Lava-Jato.
Não é possível continuar a ignorar que, embora o papel da Petrobras como sociedade de economia mista englobe uma função social maior do que a das empresas fora do controle estatal, há limite para tudo, inclusive para o que se faz com recursos dela.
Sobrecarregar a Petrobras com custos do diesel não repassados ao consumidor onera os já irritados investidores que restaram. Sim, a Petrobras tem acionistas minoritários, além da União.
Alguns operadores, de um passado em que o mercado de capitais não importava, já defenderam que quem investe em estatal está interessado em dividendos. Nada mais ultrapassado. Quem investe em ações de estatais quer retorno para o investimento, seja no curto, médio ou longo prazo, na forma de valorização das ações. Dividendos são bônus, dentro de um pacote de atração (ou não) para investidores.
Tudo somado, eventual interferência do governo federal nas decisões gerenciais da Petrobras deve ser tida apenas como uma recomendação para evitar o caos social, que pode advir de uma nova greve de caminhoneiros, e dentro exclusivamente de uma estratégia de transição para fora do setor de refino. A concorrência, no setor de refino, é urgente e não pode esperar mais, sob pena de expor a Petrobras a maiores intempéries, quer de investidores, quer da sociedade civil em geral, assim como de uma vasta cadeia de fornecedores, muitos dos quais somente conseguirão concretizar projetos com financiamento externo.
É do setor de refino que a Petrobras deve também sair, para focar em atividades mais próximas do que ela sabe fazer melhor, que é a Exploração e Produção de petróleo, sobretudo no pré-sal.
E, se nada convence quem continua a insistir na presença da Petrobras em todos os subsetores de petróleo, que tal considerar que enquanto a Petrobras continua a ser verdadeiramente achacada por ideologias estatizantes, o risco para fornecedores competentes e íntegros continua elevado? Mais especificamente, quem vai poder ou querer fornecer embarcações de alta especificação (que exigem financiamento externo), de forma sustentável, para produção de petróleo do pré-sal para um cliente – a Petrobras – dentro de um contexto de dúvidas sobre a sua independência do governo federal?
Falando de contratadas, são elas que terão, individualmente, a capacidade de captar e desenvolver novos negócios e de desenvolver talentos, contribuindo para o crescimento do país. A Petrobras, sozinha, não conseguirá promover mudanças em caráter duradouro, com sério risco para a economia nacional, e tampouco tem todas as tecnologias necessárias e sujeitas a propriedade intelectual de terceiros, para contribuir para o desenvolvimento do setor de E&P no país.
Vale lembrar que ninguém quer entrar num mercado já naturalmente complexo – quer pelo sistema tributário injusto, quer pela elevada percepção de falta de integridade (sim, melhor reconhecer que ela existe, como reiteradamente colocado pela Transparência Internacional) – para ter apenas um cliente, a Petrobras, quase monopolista do refino e até poucos anos atrás, monopolista da operação do pré-sal.
Além disso, uma empresa que esteja em vários subsetores está, também, exposta a um sistema regulatório mais complexo, exigindo compatibilizações de políticas, sistemas e procedimentos que não são necessárias para quem tem foco em menos negócios.
Os inconformados podem continuar a bradar, mas fiquem eles alertas às sanções políticas e não políticas que possam ser aplicadas em razão do apego a ideologias bizarras e/ou eventuais interesses ilegítimos.