Todo 8 de março é a mesma coisa: a data vai se aproximando e começo a ficar ansiosa pensando “o que posso escrever de diferente?”
Entra ano, sai ano e a gente segue falando sobre baixa representatividade das mulheres na energia, nos espaços de poder, nas discussões que afetam nossas vidas, nossos corpos, nossos lugares no mundo.
E não só em março. Quando comecei a editar a Diálogos da Transição, uma das missões era (e continua sendo) buscar mais fontes mulheres — além de abordar mais o tema da diversidade.
Uma das minhas primeiras matérias na agência epbr foi sobre isso.
Novos empregos, velhos padrões, de outubro de 2020, traz um dado inquietante: 80% dos novos empregos na economia de baixo carbono serão em setores dominados por homens.
Quase dois anos depois, o relatório da Agência Internacional de Energia (IEA, em inglês) sobre empregos nessa indústria mostra que apenas 16% das vagas em setores tradicionais são ocupadas por mulheres.
Assim como no restante da economia, a participação em altos cargos é de pouco menos de 14% em média, com grandes variações por segmento: nuclear e carvão têm as piores taxas, com 8% e 9%, respectivamente, enquanto as concessionárias de energia elétrica estão entre as mais altas, com quase 20%.
Se as coisas não mudam — ou mudam muito vagarosamente –, como escrever sobre outras coisas?
A não ser que eu invente uma realidade paralela para reportar, não dá para desviar dessa pauta.
Desde a última sexta-feira, meu e-mail está abarrotado de releases de empresas divulgando suas ações de diversidade. É legal que exista a preocupação em mostrar resultados, mas como isso se aplica no dia a dia de uma empresa?
De 423 companhias listadas na bolsa de valores brasileira, aproximadamente 60% não têm nenhuma mulher entre seus diretores estatutários, e 37% não possuem participação feminina no conselho de administração, mostra um levantamento publicado pela B3 em agosto do ano passado.
Já a consultoria Deloitte aponta que mulheres ainda são 10,4% em conselhos administrativos no Brasil — ficamos abaixo da média mundial (19,7%) em participação feminina, atrás de nações como Nigéria (21,7%), Filipinas (17,7%) e Índia (17,1%).
Mais recente, uma pesquisa da agência TRIWI com 10 mil empresas em fevereiro deste ano descobriu que 67% das entrevistadas contam com até 38% dos cargos ocupados por mulheres, 23% não contam com mulheres em cargos de liderança e 25% não possuem mulheres negras em seus quadros.
No setor de energia, somos apenas 6% nos cargos de liderança no Brasil.
Para alguns, esse monte de número não quer dizer nada. Mas para quem vive na pele essa dominância masculina, significa muita coisa. Inclusive, microviolências no ambiente de trabalho que desmotivam e afastam mulheres do mercado.
A boa notícia é que estamos mais unidas
E, um passo de cada vez, vamos conquistando mais espaço e puxando outras profissionais talentosas para ocupá-los conosco.
Vejo essa mudança, por exemplo, quando estou entrevistando mulheres para as mais diversas pautas de transição energética.
Outro dia, conversando sobre hidrogênio verde com duas advogadas que estão acompanhando de perto a discussão regulatória para o novo energético, ouvi que precisamos entrevistar mais mulheres. E concordo.
“Por conta dessa exigência interna que cada mulher tem, acabamos estudando e aprimorando muito mais. Estamos falando de futuro. Os homens estão mais confortáveis no business as usual. A mulher nunca está confortável”
Por isso mesmo, elas observam que os debates com empresas interessadas na transição energética são cada vez mais conduzidos por mulheres.
Elas estão liderando a agenda climática, e a diversidade vem junto. Sabe por quê?
Cerca de 80% das pessoas deslocadas pelas mudanças climáticas são mulheres, mostra relatório do Women in Finance Climate Action Group.
Mulheres e meninas constituem a grande maioria das pessoas pobres do mundo, de acordo com a ONU, muitas vezes dependentes da agricultura de subsistência – extremamente vulnerável ao clima.
E 75% acreditam que uma mudança climática requer outros hábitos e estilo de vida, em comparação a 64% dos homens.
Apesar disso, a maioria das estruturas de política climática de governos nacional, regional e multilateral ainda não incorpora questões de gênero ou ignora a conexão entre gênero e financiamento climático.
É por isso que “todo 8 de março é a mesma coisa”. Se você, homem, está cansado dessa pauta, imagine nós, mulheres, que a vivemos todos os dias.
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