Se existe uma pessoa que esteja feliz com a guerra comercial com a China, essa pessoa é Donald Trump. O presidente dos EUA deixou isso claro há duas semanas: “Adoro a posição em que estou”, declarou ele ao se gabar da receita que seu governo provavelmente arrecadaria com as maiores tarifas – o que os economistas contestampor sinal. Trump dizia tudo isso enquanto Pequim já planejava retaliá-lo por seus diversos atos de hostilidade, muito antes do acirramento do conflito com a Huawei.
Mas existe outra coisa que deve estar fazendo a alegria de Trump neste momento, além da punição à China no comércio, embora não esteja tuitando sobre isso, como de costume: os preços mais baixos do petróleo.
Uma das maiores vítimas da guerra comercial desta semana foi justamente o petróleo.
Por ser um dos ativos de maior risco no cenário macroeconômico, não é de surpreender que o petróleo também seja um dos mais vulneráveis no atual ambiente.
Por que Trump intensificaria a guerra comercial agora?
O que ainda continua ambíguo, no entanto, é o momento em que tudo isso está acontecendo.
Trump tem sido claro quanto às razões que o levaram subir o tom contra o setor de tecnologia chinês neste momento em particular, além de fazer transparecer que se trata de uma progressão dos seus esforços para frear uma China obstinadamente rebelde no comércio.
Sim, é irritante quando alguém com quem você vem negociando há meses parece estar recuando em relação ao que já havia sido acordado.
Mas, se a História servir de parâmetro, nunca foi fácil tirar vantagem da China no comércio.
Trump vem dizendo à sua base eleitoral, durante os comícios das últimas semanas, que continua focado em garantir para a América o “melhor acordo” e que o acirramento da guerra comercial era um mal necessário para o bem maior dos Estados Unidos, algo que ele acusa seu antecessor, Barack Obama, de ter intencionalmente negligenciado.
Mesmo assim, não faz muito sentido para seus detratores o fato de o presidente ter jogado fora seis meses de negociações com o líder chinês Xi Jinping, iniciadas na cúpula do G20, em dezembro do ano passado, em Buenos Aires – especialmente depois de as autoridades de ambos os países terem garantido repetidas vezes que tudo estava indo bem e que o acordo era iminente.
Não é de surpreender que os rivais de Trump suspeitem que ele tenha feito isso por conveniência política, já que, mesmo após o fim da investigação Mueller, o presidente continua enfrentando um possível impeachment por parte dos Democratas, que acusam o presidente de ter recebido ajuda da Rússia para vencer as eleições de 2016. Essa teoria é explicada por iniciativas como seu auxílio direto de US$ 16 bilhões a agricultores norte-americanos prejudicados pela guerra comercial. Embora certamente essa concessão tenha seus méritos, não se pode deixar de considerar que ela também pode favorecer Trump perante sua base eleitoral, particularmente os produtores de soja no Centro-Oeste, à medida que se prepara para sua reeleição em novembro de 2020.
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A redução dos preços do petróleo não sai da agenda de Trump
Gostando ou não, os preços baixos do petróleo continuam sendo uma prioridade na agenda política do presidente, não importa se o atual crash do mercado seja, na verdade, um “bônus” não intencional da guerra comercial.
De fato, a eficácia com que o enfrentamento de Trump à China vem neutralizando as tensões provocadas pelas outras batalhas do presidente contra o Irã e a Venezuela – responsáveis por fazer os preços do petróleo atingirem as máximas de 2019 – parece sugerir que existe algum plano astuto de sua parte para obter tais resultados, ao invés de ser apenas uma feliz coincidência.
Embora Trump tenha aplicado tarifas adicionais à China no dia 5 de maio, suas últimas ações contra a Huawei começaram apenas em 15 de maio. Isso aconteceu um pouco antes da reunião de 19 de maio da Opep+ em Jidá, que já indicava ao setor de energia qual seria seu resultado: a Arábia Saudita não tinha qualquer intenção de relaxar os cortes de produção, apesar da disparada de quase 40% dos preços do petróleo neste ano.
Evidentemente, a queda na cotação do petróleo nesta semana não foi causada apenas pela China. Em grande parte, ela se deveu ao inesperado aumento nos estoques de petróleo nos EUA de cerca de 5 milhões de barris, em média, pela segunda semana consecutiva e à operação reduzida das refinarias antes do feriado de segunda-feira, o Memorial Day, que geralmente marca o início do pico da temporada de viagens automotivas nos EUA.
Sugerir que o presidente interrompeu as tratativas comerciais com a China somente para reduzir os preços do petróleo parece ofender os defensores do governo Trump.
Mas, como os analistas geralmente consideram que a falta de um acordo comercial é a única barreira para conter a disparada incontrolável do petróleo, capaz inclusive de fazer o Brent atingir US$ 90, não é demais supor que Trump deseja ardentemente que o impasse continue neste momento.