Correção de desigualdades de gênero desacelera no 1º ano de pandemia

Julie Matatiken é a técnica sênior de Laboratório na indústria de pesca industrial nas Seychelles. Foto por UN Women, Ryan Brown

O Brasil se tornou um país mais desigual para mulheres em 2020, mostra o Global Gender Gap Report 2021, do Fórum Econômico Mundial (WEF). Com uma pontuação de 0,695 – sendo 1 a paridade total de condições e oportunidades – o Brasil ficou em 93º lugar no ranking de 156 países. 

Em 2020, o país havia ficado no 92º lugar.

Em todo o mundo a situação piorou: o tempo estimado para que a lacuna de desigualdade de gêneros seja fechada globalmente aumentou em uma geração, de 99,5 anos para 135,6 anos.

São os efeitos prolongados da pandemia de covid-19 aprofundando desigualdades. A paridade de gênero estagnou em grandes economias e indústrias, em parte pelo fato de as mulheres serem mais frequentemente empregadas nos setores mais afetados pelos lockdowns.

A situação se agrava com as pressões adicionais de funções domésticas.

Veja a publicação na íntegra (.pdf, em inglês).

Situação no Brasil

O relatório, publicado na terça (30), divide em quatro áreas a análise de desigualdade entre gêneros:

Empoderamento político (pontuação do Brasil: 0,138). É o pior indicador do país, que fechou apenas 13,8% a lacuna entre homens e mulheres na política. Nessa área, o Brasil está em 108º lugar no ranking, quatro posições pior em relação ao ano anterior.

O relatório destaca que existem poucas mulheres parlamentares (15,2%) e ministras (10,5%) e apenas uma mulher esteve no papel de chefe de estado, por apenas cinco anos – a ex-presidente Dilma Rousseff (PT), removida pelo impeachment de 2015.

Participação econômica e oportunidades (0,665). Pelos critérios da análise, 66,5% da lacuna foi fechada. Embora a classificação, 89º lugar, tenha se mantido, a pontuação foi ligeiramente melhor que em 2019 (0,653). Persistem a desigualdade salarial em funções semelhantes (pontuação 0,542 ou uma lacuna de 45,8%) e a diferença de renda (0,567, lacuna de 43,3%).

Em menor extensão, as disparidades de gênero também continuam na participação na força de trabalho, onde se enquadram 61,9% das mulheres adultas e 80,1% dos homens (0,772). Em termos de presença feminina em cargos seniores, as mulheres são 39,4% de todos os gerentes (0,651).

Saúde e sobrevivência (0,980). Neste ponto, 98% da lacuna foi preenchida. A área considera a taxa de nascimento de ambos os gêneros (0,944) e a expectativa de vida (1.060 – as mulheres têm expectativa de vida maior).

Escolaridade. A paridade entre homens e mulheres foi alcançada em todos os níveis de ensino, mas mesmo sem haver lacunas nas taxas de matrícula no ensino primário, secundário ou ensino superior, apenas 10,7% das mulheres brasileiras em universidade estão matriculados em cursos de Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática, contra 28,6% dos homens.

Apesar da equidade entre gênero, em média a população brasileira tem apenas oito anos de estudos, quando o período esperado é de 15,4 anos.

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Mais de um século para corrigir desigualdades

O aumento do tempo para correção da disparidade considera os quatro critérios. Na média, a metodologia do estudo indica que os países levariam mais de um século para eliminar as disparidades. 

“Estes números são motivados principalmente por um declínio no desempenho dos grandes países. Em sua trajetória atual, serão necessários agora 135,6 anos para fechar a lacuna de gênero em todo o mundo”, destaca o relatório.

Na política, ainda que mais da metade dos 156 países indexados registrem uma melhora, as mulheres ainda detêm apenas 26,1% das cadeiras parlamentares e 22,6% dos cargos ministeriais em todo o mundo. 

A diferença econômica de gênero teve uma melhora apenas marginal desde a edição de 2020 e deve levar mais 267,6 anos para ser fechada. 

O lento progresso nessa área se deve a tendências opostas – enquanto a proporção de mulheres entre os profissionais qualificados continua a aumentar, as disparidades de renda persistem e poucas mulheres estão representadas em cargos gerenciais.

As lacunas de gênero na educação e na saúde estão quase fechadas. Na educação, embora 37 países tenham alcançado a paridade de gênero, levará mais 14,2 anos para fechar completamente essa lacuna devido à desaceleração do progresso. Na saúde, mais de 95% dessa lacuna de gênero foi eliminada, registrando um declínio marginal desde o ano passado. 

Lideram o ranking Islândia (0,892) Finlândia (0,861) Noruega (0,849) Nova Zelândia (0,840) Suécia (0,823) , Namíbia (0,809), Ruanda (0,805) Lituânia (0,804) Irlanda (0,800) e Suíça (0,798).

No outro extremo, estão Arábia Saudita (0,603) Chade (0,593) Mali (0,591), República Islâmica do Irã (0,582) República Democrática do Congo, (0,576), Síria (0,568) Paquistão (0,556), Iraque (0,535), Iêmen (0,492) e Afeganistão (0,444).

Entre países mais populosos, a China chegou ao 107º lugar, com pontuação de 0,682, Índia está 140º lugar, com 0,625; o Mexico foi a 34º, com 0,757; a Rússia está em 81º, com 0,708. 

Já os Estados Unidos estão em 30º, 23 posições acima do ranking do ano anterior, pontuando 0,763. A melhora expressiva no ranqueamento do país é atribuída ao progresso na área de empoderamento político, onde a pontuação dobrou para 0,329.

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Senado aprova projeto para equidade salarial

Nesta terça (30), o Senado Federal aprovou a aplicação de multa por discriminação salarial contra as mulheres. O texto vai a sanção presidencial e prevê punição para empresas que pagarem salários diferentes para homens e mulheres que exerçam a mesma função.

O projeto insere a multa na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). A empresa punida deverá compensar a funcionária alvo da discriminação com o pagamento de valor correspondente a até cinco vezes a diferença verificada. Essa indenização deverá ser multiplicada pelo período de contratação, até um limite de cinco anos, segundo informações da Agência Senado.

“Uma mulher no mercado de trabalho chega a receber três quartos do salário de um homem na mesma posição e com a mesma qualificação. O nome disso é discriminação. Vergonhosa, imoral e inconstitucional. Hoje, o que o Senado faz é honrar as mulheres brasileiras, não só porque somos maioria mas porque somos iguais”, afirmou a líder da bancada feminina, senadora Simone Tebet (MDB/MS).

A proposta tramitou por dez anos no Congresso Nacional. O relator final, senador Paulo Paim (PT/RS), fez alterações para chegar a um consenso, como a inclusão de um limite de cinco anos para aplicação da multa e retirar a previsão que a punição seja equivalente a cinco vezes a diferença salarial. No fim, a Justiça do Trabalho vai determinar o valor.

Editada por Gustavo Gaudarde ([email protected])