Como está a atratividade do segmento de E&P no Brasil?

Como está a atratividade do segmento de E&P no Brasil?

O resultado da Décima Quarta Rodada de Licitações foi festejado pelo governo e vários atores importantes da indústria. O recorde da arrecadação de bônus (R$ 3,8 bilhões) sinaliza um elevado interesse das empresas pelo upstream nacional. Entretanto, quando avaliamos mais cuidadosamente o resultado do leilão, percebe-se que a atratividade está ligada a uma situação geológica específica, ou seja, a área do Pré-sal.

A Rodada 14 ofertou 287 blocos nas mais diversas bacias sedimentares brasileiras. Deste total, 37 blocos (12,7%) foram arrematados. Entretanto, 94% do bônus arrecadado se refere a apenas 6 blocos oferecidos na Bacia de Campos, em áreas perto do polígono do Pré-sal. Em entrevista após o leilão, o presidente da Petrobras, Pedro Parente, justificou o bônus de R$ 2,24 bilhões oferecido pelo bloco C-M-346 em parceria ExxonMobil pela possibilidade de existência de Pré-sal neste bloco. Certamente, o interesse da ExxonMobil nos outros 5 blocos adquiridos na mesma bacia se deve à mesma possibilidade.

Quando se avalia o resultado do leilão nas outras bacias, percebe-se que o interesse das empresas foi muito baixo. Poucos blocos foram arrematados e quase sempre sem disputa significativa. Este baixo interesse pelas bacias fora do Pré-sal é um sinal amarelo importante para a indústria de E&P nacional e merece uma reflexão.

A Rodada 14 deixou claro que a Petrobras e demais grandes empresas petrolíferas presentes no Brasil estão mais interessadas e focadas á área do Pré-sal. Isto é natural quando comparamos a geologia do Pré-sal com as outras áreas geológicas do país. Atualmente, a produtividade média dos poços produtores do Pré-sal é de 21 mil boe/d, enquanto que em campos offshore fora do pré-sal esta produtividade média situa-se em 2,48 mil boe/d (ANP, 2017).

Em junho de 2017, a produção nacional de petróleo foi de 2,675 milhões b/d enquanto a produção de gás natural atingiu 111 milhões m3/d. Uma década após terem sido descobertas, a geologia do pré-sal já é responsável por 51% da produção nacional de petróleo e por 48% da produção nacional de gás natural. Enquanto isso, durante o mesmo período, a produção petrolífera das áreas do pós-sal experimentou uma queda de mais de 800 mil barris por dia desde 2010. Essa tendência de queda também foi acompanhada pela produção das bacias terrestres desde 2006, passando de um pico de 196 mil b/d para 149 mil b/d em 2016 (MME, 2017)

O Brasil vai rapidamente se tornando o país do Pré-sal no setor petrolífero. Entretanto, o Brasil possui 35 bacias sedimentares, as quais compõem uma área de 6,4 milhões de quilômetros quadrados, sendo 4,9 milhões de quilômetros quadrados compostos por bacias terrestres e 1,5 milhão de quilômetros quadrados por bacias localizadas na plataforma continental. O país tem muito a ganhar se conseguir também valorizar as bacias fora do pré-sal

O esforço exploratório brasileiro vem caindo desde 2012, em função da interrupção das rodadas de licitação entre 2009 e 2012 e do foco crescente dos principais players do setor nos campos do pré-sal. Este cenário de desaceleração do esforço exploratório foi agravado com a queda dos preços a partir da segunda metade de 2014 e a crise financeira da Petrobras. Os investimentos na exploração e produção fora do polígono do pré-sal caíram abruptamente em 2016, apontando para uma crescente concentração da produção nacional de óleo e gás no ambiente de águas profundas no polígono do pré-sal.

O número de sondas exploratórias presentes no Brasil atingiu seu mínimo histórico no início de 2017 (Gráfico 1). Consequentemente, o número de poços perfurados também caiu de forma dramática (gráfico 2).

Gráfico 1 – Evolução do número de sondas em operação no Brasil

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Fonte: Almeida et. al. (2017b)

Gráfico 2 – Total de poços perfurados segundo o tipo – 2006 – 2015

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Fonte: Almeida et. al. (2017b)

Uma eventual decadência das bacias fora do pré-sal pode até não comprometer a autossuficiência brasileira na oferta de petróleo e gás no curto e médio prazos. Entretanto, esta tendência pode trazer algumas consequências importantes para o setor de óleo e gás nacional. A concentração da produção no polígono do pré-sal desvia a política petrolífera nacional de alguns objetivos importantes, quais sejam:

  1. a maximização dos impactos econômicos dos investimentos no setor de exploração e produção de petróleo e gás natural em todo o território nacional;
  2. a busca de um suprimento abundante, diversificado e competitivo de gás natural;
  3. a segurança do abastecimento através da diversificação das fontes de suprimento de petróleo e gás produzido no país.

Com relação à maximização dos impactos econômicos, vale ressaltar que dado o grande diferencial na produtividade dos campos gigantes do pré-sal em relação a outros ambientes do upstream, a elevação da produção de petróleo pode ocorrer com um baixo esforço exploratório e poucos poços produtores. Dessa forma, a concentração do investimento no pré-sal pode reduzir significativamente o nível de atividade no setor petrolífero e setores correlatos. Desta forma, um benefício importante da promoção de investimentos fora do pré-sal é a retomada do nível de atividade econômica, viabilizando a criação de empregos diretos no setor petrolífero e indiretos através dos efeitos de encadeamento nas demais atividades primárias, industriais e de serviços.

Além do dinamismo econômico gerado por atividades de exploração diversas, a diversificação do esforço de E&P no Brasil pode contribuir para melhora as condições de garantia do abastecimento nacional. A promoção da exploração em áreas terrestres e águas rasas, por exemplo, pode contribuir para reduzir a dependência por importações no mercado nacional de gás natural. Nos anos de 2014 e 2015, o gás importado da Bolívia e por gás natural liquefeito (GNL) representou cerca 50% do gás ofertado ao mercado. No ano de 2016, este valor caiu para cerca de 40% em função da menor demanda das termelétricas a gás natural. Dessa forma, a promoção da exploração de gás natural deve ser considerada uma dimensão importante da política exploratória nacional.

Vale ressaltar que a produção de gás natural em águas profundas apresenta grandes desafios por seus custos de escoamento e, particularmente no pré-sal, custos relevantes de produção em função da profundidade dos reservatórios e nível de contaminação (e.g. concentração de CO2), afetando assim sua comercialidade (1). Portanto, a busca de um suprimento doméstico abundante e competitivo de gás natural passa pela promoção da atividade de exploração nas diversas bacias brasileiras.

A atração de investimentos para campos maduros e para exploração petrolífera fora do pré-sal vai depender das condições de atratividade destes investimentos para o capital privado, vis a vis às opções de investimentos em outros países. O IBP, em parceria com o Grupo de Economia da Energia do Instituto de Economia da UFRJ, realizou em junho deste ano um estudo (2) e um seminário que analisou justamente esta questão.

Este estudo deixou claro que os projetos fora da área do Pré-sal, em ambiente offshore de águas rasas e em áreas terrestres, apresentam uma economicidade desafiadora. Portanto, é necessário implementar uma agenda de mudanças regulatórias e políticas de incentivo que permitam melhorar a atratividade dessas áreas para novos investimentos, que inclui:

    1. Mudanças na regulação para redução dos custos destes projetos através da:
      • redução do nível de government take para cenários de preços baixos;
      • redução do risco regulatório com simplificação do contrato de concessão e reavaliação quanto a seus prazos;
      • Redução do risco do processo de licenciamento ambiental.
    2. Melhoria das condições de monetização da produção dos pequenos campos petrolíferos através de:
      • compartilhamento de infraestrutura de transporte e estocagem e uma política de compras do petróleo por refinarias nacionais;
      • acesso ao mercado de gás e energia elétrica pelos produtores de gás natural.

Além disto, o estudo mostrou que as rodadas de licitação representam medida importante para reativação da indústria, mas têm impacto apenas a médio e longo prazos. É muito importante também atentar para obstáculos para a reativação dos investimentos no curto prazo. O investimento a curto prazo dependerá do desenvolvimento de descobertas existentes dentro e fora do polígono do pré-sal e do aproveitamento das oportunidades para investimentos no aumento da taxa de recuperação de campos maduros localizados em terra e no mar, particularmente na Bacia de Campos.

No atual contexto da indústria, este tipo de investimento tende a não ser o foco da Petrobras, decidida em concentrar investimentos em projetos no pré-sal, que apresentam maior retorno. Neste sentido, a política de desinvestimento da estatal é um fator determinante da retomada dos investimentos no fora do pré-sal, pois abre a possibilidade de que outros atores invistam em ativos existentes.

A aceleração do investimento nos campos maduros no curto prazo dependerá da agilidade e do encaminhamento deste plano de desinvestimento. Neste ponto, é fundamental enfrentar as barreiras que possam criar dificuldades para o processo de desinvestimento da Petrobras. O governo pode ter um papel mais ativo na redução da insegurança jurídica e do risco regulatório do processo de venda de ativos da Petrobras. É importante solucionar questões regulatórias que possam criar insegurança aos compradores desses ativos tais como: o prazo das concessões e a regulação de descomissionamento.

Incertezas quanto às condições para renovação dos contratos de concessão ou quanto aos passivos relativos ao descomissionamento destes ativos, certamente contribuem para desvalorizar os ativos. Por sua vez, as operações de venda de ativos com preços mais baixos, em função do maior risco regulatório, tendem a sofrer uma maior oposição política e jurídica. Desta forma, a redução da incerteza regulatória contribui não apenas para a valorização dos ativos da Petrobras, mas também agilizando o processo de desinvestimento da empresa e, consequentemente, a retomada dos investimentos no setor.

Referências Bibliográficas
AGÊNCIA NACIONAL DE PETRÓLEO, GÁS NATURAL E BIOCOMBUSTÍVEIS -ANP (2016). Anuário Estatístico 2016.
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ALMEIDA, E; LOSEKAN, L. CLAVIJO, W.; NUNES, L. BOTELHO, F. COSTA, F Waeger, L. (2017a). Gás do Pré-sal: Oportunidades, Desafios e Perspectivas. Disponível em: https://www.ibp.org.br/personalizado/uploads/2017/04/2017_TD_Gas_do_Pre_Sal_Oportunidades_Desafios_e_Perspectivas-1.pdf
ALMEIDA, E; LOSEKAN, L. CLAVIJO, W.; NUNES, L. BOTELHO, F. COSTA, F (2017b). “Atratividade do Upstream Brasileiro para Além do Pré-sal”. Texto para Discussão GEE-IBP. Disponível em:https://www.ibp.org.br/personalizado/uploads/2017/07/TD_Atratividade-do-Upstream-Brasileiro-para-Al%C3%A9m-do-Pr%C3%A9-Sal-SITE.pdf
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BASTOS, C.; SANTOS, A.; RAMOS, M. (2017). Desafios e lições aprendidas para o aumento de fatores de recuperação na Bacia de Campos através da integração de disciplinas. Apresentação no I Seminário sobre Aumento do Fator de Recuperação no Brasil. Petrobras. 23 e 24 de Março de 2017.
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GAUDARDE, G. (2017a). Quinhentos dias sem novas descobertas offshore. Brasil Energia. 24 de abril 2017.
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MINISTÉRIO DE MINAS E ENERGIA – MME (2017a). Grupo de Trabalho do Programa De Revitalização das Atividades de Exploração e Produção de Petróleo e Gás Natural em Áreas Terrestres. Brasília.
MINISTÉRIO DE MINAS E ENERGIA – MME (2017b). Boletim de Exploração e Produção – Setembro. Disponível em http://www.mme.gov.br/documents/1138769/0/Boletim+DEPG+edi%C3%A7%C3%A3o+65+-+set2017___.pdf/c4864446-aa86-4db8-9e96-b387b410b8da
O GLOBO (2016). Petrobras e Statoil ampliam parceria em campos maduros, dizem fontes. 4 de outubro 2016.
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