Angra 3

Cadeia de suprimentos nuclear no Brasil está fragmentada, avalia Framatome

“Várias coisas foram interrompidas, o que freou o nosso planejamento”, diz Alexandre Honaiser

Alexandre Honaiser, diretor-executivo da Framatome, durante evento da Abdan, no Rio de Janeiro. Foto: Abdan/Divulgação
Alexandre Honaiser, diretor-executivo da Framatome, durante evento da Abdan, no Rio de Janeiro. Foto: Abdan/Divulgação

RIO — A interrupção de projetos nucleares no Brasil, como a paralisação das obras a usina de Angra 3 em 2015, deixou a cadeia de suprimentos nacional em situação crítica, avalia o diretor-executivo da Framatome para América do Sul, Alexandre Honaiser

“A cadeia de suprimentos foi quebrada […] O governo brasileiro, por não ter uma continuidade de projetos, levou uma situação complicadíssima às várias empresas da cadeia produtiva”, disse o executivo, em entrevista à agência eixos.

A Framatome é fornecedora de equipamentos e tecnologia para Angra 3, além de realizar serviços de manutenção e modernização nas usinas de Angra 1 e 2, todas operadas pela Eletronuclear. 

“Várias coisas foram interrompidas, o que freou o nosso planejamento”, diz o executivo. 

Até o momento, aproximadamente 86% dos equipamentos para Angra 3 já foram entregues, apurou a agência eixos, e seguem aguardando em galpões, enquanto segue o impasse sobre a continuidade das obras da terceira planta nuclear no Brasil.

A decisão sobre retomada das obras está na pauta da próxima reunião do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), marcada para 4 de dezembro.

Com 66% das obras prontas, o empreendimento na Costa Verde do Rio de Janeiro deve ficar pronto entre 2030 e 2031 caso o CNPE aprove sua conclusão.

Hoje, estima-se que a Eletronuclear gaste R$ 100 milhões por ano para a preservação de mais de 11 mil equipamentos que estão nas instalações da usina. Além disso, a estatal suspendeu pagamentos a fornecedores, incluindo a Framatome, por falta de recursos em caixa. 

“Temos que reativar algumas empresas brasileiras para ajudar a Eletronuclear. A Framatome é o detentor da tecnologia. Vamos fazer o que for possível para ajudar a Eletronuclear e o Brasil a seguir adiante. Vamos desenvolver parcerias com empresas brasileiras para que consiga fazer a Angra 3”, defende Honaiser. 

Foco na Argentina

Enquanto a decisão do governo não sai, o foco da Framatome está na manutenção de Angra 1 e 2 e no suporte ao setor nuclear argentino, com a extensão da Usina de Atucha I, e suporte de operação às plantas de Atucha II e Embalse, no país vizinho. 

A empresa chegou a suspender novas contratações de funcionários no Brasil, enquanto alguns contratos com a Eletronuclear não estão sendo honrados. 

Segundo Honaiser, a ruptura nas políticas de expansão nuclear também leva à perda de técnicos qualificados, que buscam oportunidades no exterior. 

“Os técnicos foram para o exterior fazer treinamento… agora mandei um para a Argentina. Temos o planejamento de ter mão de obra brasileira, mas isso foi travado pela falta de andamento de Angra 3”, explica.

Falta escala

Honaiser também pontua os desafios enfrentados pelas principais estatais do setor, como a Indústrias Nucleares do Brasil (INB) e a Nuclebrás Equipamentos Pesados (Nuclep).

“A INB fornece combustível a Angra 1 e Angra 2. Ela não é economicamente viável fabricando combustível para as duas usinas”, afirmou Honaiser.

Segundo ele, a produção sem escala faz com que a empresa seja deficitária, enquanto as reservas nacionais de urânio permanecem inexploradas por falta de licenciamento.

“A entrada de Angra 3 torna o INB reequilibrado. Ele passa a ser economicamente viável. E a entrada de uma quarta usina torna o INB lucrativo.”

Outro ponto crítico levantado foi a situação da Nuclep, cuja estrutura foi planejada para suportar a construção de oito usinas nucleares, mas que hoje sobrevive com atividades fora do seu foco original, como a produção de torres de transmissão, estruturas para plataformas de petróleo e contratos com a Marinha. 

“São estatais que dependem de demanda que não está existindo. E por política. Porque estão construindo termelétricas a gás, muito poluente comparado com eólica, solar e nuclear”. 

Para reverter esse cenário, Honaiser defende o cumprimento do Plano Nacional de Energia (PNE) 2050, de dar prosseguimento do programa nuclear brasileiro, após Angra 3, com uma expansão mínima de 4 GW, podendo alcançar 8 GW até 2030, nas regiões Sudeste e Nordeste. 

“A intenção é realmente crescer com o país, com o Brasil. E essa não é uma visão minha. Essa é a visão estratégica da alta direção da empresa na França, na Alemanha”, conclui o executivo.