Brasil e EUA tentam reanimar setor nuclear com cooperação e busca ao setor privado

(Official White House Photo by Tia Dufour)
(Official White House Photo by Tia Dufour)
Dan Brouillette assumiu em dezembro a Secretaria de Energia. Foto: D. Myles Cullen/White House

RIO – Brasil e Estados Unidos devem estreitar a cooperação no setor nuclear no mês que vem, quando o secretário de Energia dos Estados Unidos, Dan Brouillette, vem ao Rio de Janeiro para a primeira reunião ministerial do Fórum de Energia Brasil-Estados Unidos (USBEF).

Brouillette e o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, participam da cerimônia de assinatura de um memorando de entendimento para promover a cooperação bilateral entre o Instituto de Energia Nuclear (NEI, na sigla em inglês) e a Associação Brasileira para Desenvolvimento de Atividades Nucleares (ABDAN). O norte-americano ainda vai participar de uma mesa redonda com representantes da indústria nuclear.

O encontro marca um novo passo na tentativa dos dois países de firmar uma cooperação no setor. Em discurso nessa segunda-feira (27) na Índia, Albuquerque afirmou que o setor de nuclear tem um importante papel a cumprir para a transição energética e seguirá sendo uma prioridade no Brasil.

Albuquerque participou do Fórum Empresarial Brasil–Índia (IBBF), em Nova Délhi, onde esteve com o presidente Jair Bolsonaro. O ministro frisou que o Brasil busca se tornar um ator relevante no mercado de combustível nuclear. Para isso está promovendo a abertura do setor de mineração de urânio e investindo em energia nuclear em associação com o setor privado.

O governo Bolsonaro promete buscar um parceiro privado para retomar as obras a usina nuclear de Angra 3, uma agenda prioritária para Albuquerque desde que chegou ao cargo há um ano. No período, no entanto, nenhum passo concreto foi dado. A definição do modelo da parceria com o setor privado para a obra, prometida para julho passado, ainda não ocorreu. No ano passado, o governo afirmava querer lançar o edital para a retomada das obras em junho de 2020.

O discurso de defesa da energia nuclear como opção para garantir a redução de emissões de gases de efeito estufa não é exclusividade do governo brasileiro. O argumento, adotado também nos Estados Unidos, é mais um ponto em comum nas propostas dos dois países para o setor.

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Trump tenta retomada com lei de cooperação com setor privado

Desde 2018 a administração de Donald Trump tenta encontrar um caminho para apoiar a recuperação do setor no país, onde a energia nuclear foi ainda mais ameaçada nos últimos anos pelo aumento da concorrência do gás natural barato e, em menor grau, das indústrias de geração eólica e fotovoltaica.

Em outubro daquele ano, o presidente Trump – apoiado pelo então secretário de Energia, Rick Perry – assinou uma lei destinada a promover a inovação em tecnologia nuclear (chamada nos EUA de Nuclear Energy Innovation Capabilities Act). A lei foi proposta para promover a cooperação entre os setores público e privado do país, algo semelhante ao plano para Angra 3 – e que o governo brasileiro diz que servirá de base para futuras usinas nucleares.

Para ambientalista, nova geração de usinas nucleares é essencial para redução de emissões

Críticos e defensores da retomada do setor nos Estados Unidos, no entanto, concordam que permitir altos investimentos públicos na área nuclear seria um caminho difícil de defender no momento em que as fontes renováveis ganham espaço – ao que se pode adicionar um conteúdo de risco político em ano eleitoral.

Mas para parte da opinião pública envolvida com o debate do futuro do setor de energia e a necessidade de agir para minorar os impactos do aquecimento global, a promoção da energia nuclear está sendo vista como uma possibilidade para acelerar a redução de emissões de gases do efeito estufa.

É o caso da organização não-governamental ambientalista Center for Climate and Energy Solutions (C2ES), cujo presidente, Bob Perciasepe, afirma que os reatores avançados pode gerar eletricidade com emissões zero de maneira confiável e representam uma tecnologia escalonável. Ele defende a promoção da energia nuclear como essencial para que os Estados Unidos possam cumprir suas metas de redução de ambições.

“Precisamos buscar soluções estáveis que suportem transições políticas e mantenham um ritmo ambicioso para reduzir as emissões”, disse Perciasepe, para quem a nova lei “é um sinal encorajador de que existem parceiros em potencial para ações cooperativas”.

O colunista do Washington Post Hugh Hewitt também defende o reaparelhamento da indústria nuclear dos EUA, sem a qual, diz, “não há esperança de reduções significativas na produção de carbono”. Para ele, “se as pessoas levam a sério a lentidão significativa na redução de emissões de carbono, elas precisam apoiar a produção segura de energia nuclear”.

Hewitt defende que o próximo passo para o governo norte-americano é promover a reabertura de plantas para enriquecimento de urânio. Hoje, cerca de 90% do urânio usado por concessionárias da área de energia nos EUA é importando e a última fábrica de urânio altamente enriquecido do país, no Kentucky, foi fechada no começo da década, após o desastre de Fukushima, 2011.

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Na Alemanha cresce pressão por reativação de usinas; Japão tem desafio para religar reatores

Uma das pioneiras na decisão de abandonar a energia nuclear, a Alemanha, cujas usinas devem ter suas atividades encerradas até o fim de 2022, vê hoje o renascimento do lobby em defesa dessa fonte de energia graças ao desafiador cenário que o país enfrentará nas próximas três décadas para reduzir emissões. Hoje cerca de 33% da energia gerada na Alemanha vem de usinas a carvão, que precisarão ser desligadas. já as sete usinas nucleares ainda em funcionamento representam 10% da matriz energética.

A necessidade de substituir cerca de 40% do fornecimento do país com o subsequente risco de encarecimento da energia e até temores de falta de capacidade de geração preocupam empresários e líderes políticos, que pressionam pela manutenção das últimas nucleares. Em dezembro, um porta-voz do partido da primeira-ministra Angela Merkel, o União Democrata-Cristã, afirmou que foi um erro abandonar a energia nuclear.

Também no Japão o plano de redução de emissões põe em cheque a opção por abandonar as usinas nucleares. Até 2030 o país se comprometeu em reduzir em 26% os níveis de emissão sobre as marcas registradas em 2013.

O Japão trabalha hoje com um plano de religamento de usinas desativadas depois do acidente de Fukushima mas o ritmo lento é visto como uma ameaça aos planos do país de ter entre 20% e 22% e sua matriz oriunda de energia nuclear. O  Japão decidiu em 2014 pela reativação de usinas que preencham os padrões de segurança mais rígidos do mundo. Sem as nucleares a matriz energética japonesa dependeria em 90%de insumos importados, como carvão, gás natural e petróleo para geração térmica.

Fórum Brasil-EUA é alternativa à aproximação com a China

A retomada da proposta de construção do Fórum de Energia Brasil-Estados Unidos ocorreu em março do ano passado, quando durante a viagem da comitiva do presidente Jair Bolsonaro aos EUA, o ministro Albuquerque ouviu de um representante do Departamento de Estado dos EUA que as empresas daquele país têm interesse em investir no Brasil.

Na época, os norte-americanos buscaram marcar uma posição de antagonismo aos interesses chineses no setor de energia no Brasil. O secretário assistente para Recursos Naturais e Energia do DoS, Francis Fannon, afirmou na ocasião que as empresas dos EUA são parceiras melhores que as suas concorrentes chinesas por não estarem subordinadas ao governo. A informação foi antecipada pelo político epbr, serviços exclusivo para assinantes.

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