Diálogos da Transição

Sinal de preço e gradualidade: as características do mercado de carbono elétrico

Proposta para o setor terá entre os desafios evitar choque de preço no curto prazo

“Para o setor elétrico brasileiro, que tem predominância de renováveis, um desenho de mercado mais amplo é uma oportunidade imensa de negócio e pode facilitar eletrificação renovável para segmentos com maior dificuldade de descarbonização”, avalia Giovani Machado. Na imagem: Vista aérea do reservatório e barragem da hidrelétrica de Furnas (Foto: Divulgação Furnas/Eletrobras)
“Para o setor elétrico brasileiro, que tem predominância de renováveis, um desenho de mercado mais amplo é uma oportunidade imensa de negócio e pode facilitar eletrificação renovável para segmentos com maior dificuldade de descarbonização”, avalia Giovani Machado (Foto: Divulgação Furnas/Eletrobras)

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Diálogos da Transição

eixos.com.br | 02/02/22
Apresentada por

Editada por Nayara Machado
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Apresentada pelo governo na semana passada, a proposta de criação de um mercado de carbono para o setor elétrico terá entre os desafios evitar o choque de preço no curto prazo, sob o risco de gerar aversão da sociedade em relação ao instrumento.

O preço da energia já é um ponto sensível. Os efeitos das mudanças climáticas, combinados ao crescimento da demanda, têm colocado os sistemas de eletricidade sob pressão no Brasil e no mundo.

Giovani Machado, diretor de Estudos Econômico-Energéticos e Ambientais da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), explica que há uma série de instrumentos de salvaguardas no desenho do mercado que permitem “modular e calibrar” os efeitos de uma precificação do carbono.

“Uma das vantagens nesse instrumento de mercado de carbono é que ele é um potencializador de transformações, sobretudo com foco em longo prazo”.

A proposta – elaborada pela EPE e em consulta pública até a próxima segunda (7/1) – traz entre as diretrizes a priorização de um mercado multisetorial, gradual e com a possibilidade de compensação (offset) para moderar o preço.

“Ninguém tem dúvida que a trajetória do preço no longo prazo é crescente no custo do carbono. E essa sinalização econômica de longo prazo cria uma série de expectativas e posicionamentos estratégicos dos agentes econômicos”.

Segundo Machado, um dos efeitos desta sinalização é a adaptação das empresas para um futuro de baixo carbono, o que tende a impulsionar o investimento em novas tecnologias.

“Para o setor elétrico brasileiro, que tem predominância de renováveis, um desenho de mercado mais amplo é uma oportunidade imensa de negócio, porque pode, por exemplo, facilitar processos de eletrificação renovável para outros segmentos com maior dificuldade de descarbonização”.

Isso transformaria o setor elétrico, completa o especialista, em um “ofertante de abatimento de carbono” para moderar o custo de adaptação dos outros setores.

“Cria uma possibilidade de um ajuste na economia brasileira, do ponto de vista do carbono, extremamente competitivo e acoplado entre os diferentes segmentos, fora do setor elétrico, como minérios, metais, commodities agrícolas de baixo carbono”.

Machado participou nesta quarta (2/2) de webinar Instituto E+ Transição Energética.

Ele destaca que essas vantagens competitivas são importantes para o Brasil, em uma economia global cada vez mais exigente em termos de carbono. E a regulamentação do Artigo 6 do Acordo de Paris é um exemplo

implementação gradual é outra característica da proposta – e está alinhada com o PMR Brasil (estudo encomendado ao Banco Mundial) e com o que vem sendo discutido no Congresso Nacional, no PL 528/2021 (que cria o mercado regulado de carbono brasileiro).

“É importante ter uma fase piloto, de três a cinco anos, até que se entre em uma fase obrigatória. Essa fase é fundamental para o aprendizado social sobre o funcionamento e o conforto para atuação nesse mercado”.

De acordo com Machado, na fase de aprendizagem o preço costuma ser moderado, e o processo de distribuição de permissões – as allowances – gratuito.

“O processo é feito de tal forma que não gere choques de preços, porque isso pode afetar a aceitação do instrumento”.

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Alta de preços da energia deve continuar em 2022, incentivando instalações de energia renovável, aponta análise da S&P Global Platts Analytics sobre principais tendências de transição energética neste ano.

Segundo os analistas, os fortes preços de energia levaram as margens de energia renovável a níveis historicamente altos nos principais mercados e aumentaram as perspectivas de crescimento mais rápido das instalações em 2022.

“A ironia é que o baixo desempenho das energias renováveis foi um fator-chave por trás do aumento nos preços globais de gás e energia em primeiro lugar”, diz.

Apesar de um aumento de 10% nos custos de comissionamento devido a preços historicamente altos de matérias-primas e questões trabalhistas, as adições de capacidade solar fotovoltaica devem aumentar 4% em 2022, enquanto as instalações eólicas terrestres devem crescer 1%.

No entanto, a previsão é de queda para a energia eólica offshore, que deve contrair 25% em 2022 devido à eliminação gradual dos subsídios da China.

A S&P Global Platts Analytics vê a necessidade de políticas que equilibrem melhor a necessidade de adicionar fornecimento de eletricidade com zero carbono com o custo da despachabilidade/disponibilidade de energia renovável muitas vezes intermitente.

“Há riscos de que a adoção de energias renováveis esteja cada vez mais associada a déficits de energia e consequentes altos preços. A questão será como os formuladores de políticas veem a troca entre a priorização da transição energética ou o fornecimento confiável”, completa.

Vale um destaque: O consumo brasileiro de eletricidade em dezembro de 2021 foi o maior para o mês em toda a série histórica, iniciada em 2004. Com 42.937 GWh, foi o segundo maior consumo total de 2021, perdendo apenas para março.

De acordo com o Ministério de Minas e Energia (MME), comércio e indústria puxaram a expansão. O ano de 2021 fechou com 500.209 GWh de consumo acumulado em 12 meses, crescimento de 5,2% comparado a 2020.

O consumo de eletricidade na indústria expandiu 2,9% no mês, em comparação com igual período do ano anterior, registrando 15.077 GWh, o maior para dezembro desde 2014.

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