Quando se fala em energia elétrica no Brasil, a abertura total do mercado livre se coloca como fator fundamental para proporcionar mais competição, eficiência, produtividade e facilidade, seja para a indústria, empresas ou cidadãos.
Uma ação futura precisa ter essa “régua” como base para que revoluções setoriais como modelos de cobrança “pré-pagos”, atração de data centers ou ampliação da eletrificação da mobilidade urbana possam acontecer.
Estamos na efervescência da implementação da Medida Provisória de Reforma do Setor, que prevê implementação do Desconto Social de Energia Elétrica, ampliando a Tarifa Social — e pode, segundo estimativa do Ministério de Minas e Energia (MME), beneficiar 60 milhões de brasileiros — e a abertura faseada do mercado livre de eletricidade para baixa tensão a partir de 2026.
Temos hoje um aceno positivo de inclusão quanto ao acesso e consumo de energia elétrica no país. Por outro lado, chamo a atenção para a necessidade concebermos um modelo legal-regulatório robusto, adequado e estável, que garanta a liberdade de escolha, competição e previsibilidade de investimentos.
Dessa forma, construiremos uma plataforma sustentável e benéfica para todos. O avanço do setor passa pela abertura completa do mercado de energia. É passada a hora de concretizarmos esta ação.
Relembro que a Lei 9.648/1998, entre outras medidas, estabeleceu a abertura do mercado livre e previa a conclusão desse processo em 2006. Estamos quase 20 anos atrasados. O Brasil tem cerca de 90 milhões de consumidores. Boa parte pertencente às classes econômicas C, D e E, diretamente impactadas pelos altos custos das tarifas reguladas de energia elétrica.
Uma pesquisa do Instituto Pólis, em parceria com o Inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica (Ipec), mostra que 49% da população considera o gasto com eletricidade como o de maior impacto no orçamento familiar, ao lado da alimentação.
Além disso, 25% das pessoas das classes D e E necessitam reduzir ou até mesmo deixar de comprar alimentos básicos, como arroz e feijão, para arcar com o pagamento da energia elétrica.
Não por acaso, 96% dos consumidores querem previsibilidade na conta de luz, como indicou o estudo preliminar da consultoria Futuros Possíveis, encomendado pela LUZ — fornecedora digital de energia com atuação em comercialização varejista.
O comportamento do consumidor foi um dos assuntos que debatemos durante o painel “Futuro da Energia”, no Web Summit Rio, juntamente com a contextualização da infraestrutura do segmento no país.
O brasileiro também quer reduzir sua fatura com energia elétrica. Daí a oportunidade real que se abre com a MP da Reforma do Setor Elétrico (nº 1.300/2025).
Uma boa referência para mensurar custos com essa despesa é o Economizômetro, calculadora digital da Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia (Abraceel), que indicou que a modalidade propiciou R$ 55 bilhões de economia nos gastos com energia elétrica em 2024 para os consumidores do Ambiente de Contratação Livre (ACL).
Reforço que esta opção ainda é restrita e abrange, atualmente, apenas grandes e médios consumidores de eletricidade. Portanto, vemos a proposta de reforma setorial com bons olhos e prudente otimismo. É necessário garantir aos brasileiros o direito de escolha entre o mercado cativo e o livre.
A ampliação de mecanismos como a Tarifa Social, se adequadamente endereçada, poderá ter efeito inclusivo se vier acompanhada de uma reestruturação que estabeleça um cronograma de acesso a todos ao mercado livre. O ritual para a abertura do mercado precisa de regras coerentes e de previsibilidade por exigir capital intensivo e de larga maturação.
O fornecimento de energia elétrica no Brasil é universalizado já há algum tempo, sendo um dos poucos serviços essenciais do país a atingir efetivamente a todos. Se queremos consumidores empoderados, precisamos dar-lhes liberdade de escolha.
Abrir o mercado trará bons frutos, com redução de custos, tarifas mais justas, investimentos, melhora na qualidade do serviço e uma expansão eficiente de toda a cadeia de valor da infraestrutura da indústria da energia elétrica, na medida em que cada unidade consumidora puder individualmente fazer sua melhor escolha.
É uma oportunidade de termos outros avanços que transformarão a energia elétrica em um produto pensado para cada realidade. O futuro começa com a abertura do mercado.
Este artigo expressa exclusivamente a posição do autor e não necessariamente da instituição para a qual trabalha ou está vinculado.
Max Xavier Lins é CEO do Grupo Delta Energia. É engenheiro eletricista pós-graduado em Sistemas de Potência e possui MBA em Finanças. É uma das principais referências no setor elétrico brasileiro, já tendo atuado em destacadas e grandes empresas brasileiras e estrangeiras, implementando transformações estruturais e modernização tecnológica.