Opinião

MP 1300 e MP 1304: o impacto das medidas provisórias no setor elétrico

Medida provisória 1304 pode se consolidar como a medida que evitará um verdadeiro apagão, escreve Wagner Ferreira

MP 1300 e MP 1304: o impacto das medidas provisórias no setor elétrico

A Medida Provisória (MP) 1300 foi aprovada em 17 de setembro de 2025, beneficiando mais de 60 milhões de pessoas. O texto concede isenção total na conta de luz para famílias de baixa renda inscritas no Cadastro Único (CadÚnico) que consumam até 80 kWh por mês — um avanço significativo para quem enfrenta dificuldades em arcar com os custos da energia elétrica.

A partir de janeiro de 2026, a medida também contemplará famílias com renda mensal entre meio e um salário mínimo por pessoa, com consumo de até 120 kWh, que deixarão de pagar a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE).

Esse encargo, que representa em média 15% da fatura de energia, financia políticas públicas como subsídios à baixa renda, estímulo a fontes renováveis, custeio de combustível em áreas isoladas, entre outros. O alívio para parte da população, contudo, implicará aumento de custos para os demais consumidores.

Na prática, a MP 1300 não apenas enfrenta questões imediatas, mas projeta efeitos de médio prazo que precisarão ser absorvidos pelo conjunto do sistema. Benefícios destinados a atividades de irrigação e aquicultura, custeados pela CDE, serão mantidos.

Entre as medidas de maior impacto, destacam-se:

i) o abatimento tarifário de cerca de R$ 6 bilhões para consumidores das regiões Norte e Nordeste, a partir de recursos da repactuação de dívidas de usinas hidrelétricas com a União pelo Uso do Bem Público (UBP). Esses valores serão revertidos em descontos nas contas de luz dos consumidores das áreas da Sudam e Sudene em 2025 e 2026;

ii) a redistribuição dos custos das usinas nucleares Angra I e II, que a partir de janeiro de 2026 passarão a ser rateados entre todos os consumidores, exceto os de baixa renda. Até então, os consumidores livres (em sua maioria grandes indústrias) não arcavam com essa despesa; agora passarão a contribuir, aliviando parte da pressão sobre os demais usuários.

Esses dispositivos indicam que a MP 1300 também buscou corrigir distorções históricas, promovendo uma distribuição mais equilibrada dos encargos entre diferentes perfis de consumidores.

Vale destacar, contudo, que muitos pontos sensíveis do texto original, aqueles considerados mais estruturais e que geravam maior conflito entre agentes do setor, foram transferidos para a MP 1304, que precisará ser votada até 7 de novembro deste ano, sob pena de caducar.

A comissão mista responsável já foi instalada, sob a presidência do deputado federal Fernando Filho (ex-ministro de Minas e Energia) e relatoria do senador Eduardo Braga (também ex-titular da pasta).

Isso significa que a discussão não se encerra com a aprovação da MP 1300, mas se projeta sobre a 1304, que carrega os pontos de maior impacto para a modernização do setor.

Considerando o cenário atual, será necessário um esforço expressivo de articulação entre os atores setoriais para construir consensos relevantes. Sem isso, corre-se o risco de perpetuar o status quo e, pior, de ver o sistema elétrico colapsar diante de uma realidade operacional cada vez mais complexa, marcada pela inserção exponencial de fontes renováveis e pela urgência em modernizar redes físicas e digitais que ainda funcionam sob parâmetros tarifários e regulatórios herdados das décadas de 1980 e 1990.

É como ter uma Ferrari nas mãos, mas limitada a rodar em uma pista de velocidade máxima de 80 km/h. Estamos chegando ao limite sistêmico, e os dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) deixam isso evidente.

Nesse sentido, a defasagem do modelo regulatório ameaça comprometer os avanços tecnológicos e a integração de novas matrizes energéticas. A MP 1304 pode se consolidar como a medida que evitará um verdadeiro apagão, dependendo de sua tramitação e aprovação. Pode, inclusive, marcar um divisor de águas no setor elétrico brasileiro, garantindo as mudanças estruturais necessárias para afastar a estagnação e assegurar a segurança energética do país.


Wagner Ferreira é sócio do Caputo, Bastos e Serra Advogados.

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