Energia

Menos eficientes, usinas a carvão foram as que mais emitiram CO₂ entre termelétricas brasileiras, aponta estudo

Cerca de 72% de toda geração fóssil inventariada foi de responsabilidade de apenas cinco empresas

Menos eficientes, usinas a carvão foram as que mais emitiram CO₂ entre termelétricas brasileiras, aponta estudo. Na imagem: Vista das instalações da termelétrica a carvão mineral Candiota III (RS), com capacidade instalada de 350 MW (Foto: Divulgação CGT Eletrosul)
Termelétrica a carvão mineral Candiota III (RS), com capacidade instalada de 350 MW (Foto: Divulgação CGT Eletrosul)

Atualizada em 13/07/2022 para incluir notas de esclarecimento da Eletrosul e Engie e retificar parágrafo sobre a concentração das emissões em dez empresas

RECIFE — Levantamento do Instituto de Energia e Meio Ambiente (Iema) publicado na última semana revela que Eletrosul, Engie Brasil Energia e EDP Energias do Brasil registraram, respectivamente, as três maiores taxas de emissão de gases de efeito estufa (GEE) por eletricidade gerada entre as proprietárias de termelétricas fósseis conectadas ao Sistema Interligado Nacional (SIN), em 2020.

Localizada no município de Candiota (RS), Candiota III da Eletrosul é a usina a carvão mineral com a maior taxa de emissão. Em 2020, a Eletrosul foi responsável por 1.327 tCO₂e/GWh – mais que o dobro da média observada para o conjunto de empresas proprietárias de térmicas fósseis, de 608 tCO2e/GWh.

Já a Engie, dona de quatro das oito usinas a carvão mineral em operação no país, alcançou a taxa de 1.088 tCO₂e/GWh com a soma da energia gerada em Pampa Sul (Candiota, RS) e as plantas que compõem o conjunto Jorge Lacerda em Capivari de Baixo (SC).

Na avaliação de eficiência, os indicadores também mostram que as usinas movidas a carvão mineral ocupam as piores posições. “Entre as cinco usinas com os menores índices de eficiência energética, quatro utilizam o carvão como combustível”, destaca Felipe Barcellos, pesquisador do Iema e um dos autores do estudo.

O Inventário de Emissões Atmosféricas em Usinas Termelétricas traz um ranking das dez empresas com as maiores taxas de emissão por eletricidade gerada em 2020.

Além dessas três, fazem parte da lista Brentech Energia S/A, CPFL Geração de Energia S/A, Aruana Energia S/A, Usina Xavantes S/A, Centrais Elétricas de Pernambuco S/A, OZ&M Incorporação Participação LTDA e Savana SPE Incorporação LTDA.

Em nota, a Eletrosul afirma que a eficiência da usina, conforme relatório preliminar da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), em 2020, foi de 34,69%, validada pela Aneel. Já as emissões totais da termelétrica naquele ano foram de 1.278.445 toneladas de CO2e.

Já a Engie lembra que a venda do Complexo Termelétrico Jorge Lacerda foi efetivada em outubro de 2021, quando as emissões do empreendimento deixaram de ser contabilizadas no inventário de emissões de GEE da companhia.

Em 2020, a companhia registrou eficiência média de 30,8% no Complexo Termelétrico Jorge Lacerda, com consumo específico de 0,62 ton carvão/MW. Em Pampa Sul, a eficiência energética média foi de 35,2%, com consumo específico de 0,89 ton carvão/MW. Em 2021, a eficiência de Pampa Sul subiu 0,2 p.p.

Ambas as empresas disseram desconhecer a metodologia utilizada pelo Iema. As notas de esclarecimento estão no final da matéria.

Emissões concentradas

Apesar de um parque com 41 empresas geradoras, dez empresas são responsáveis por 88,8% das emissões — o que equivale a mais de 29 milhões de toneladas de gases de efeito estufa emitidas no ano de 2020.

Ao todo, as 72 usinas relacionadas no documento emitiram 32,7 milhões de toneladas de dióxido de carbono equivalente (CO₂e) em 2020, ano em que 49% dos gases de efeito estufa emitidos foram de responsabilidade de dez usinas — seis delas a carvão mineral e outras quatro utilizam o gás natural.

E quase todo o CO₂e emitido (94%) foi proveniente de apenas 36 plantas.

O estudo também revela que 72,3% de toda geração fóssil inventariada foi de responsabilidade de apenas cinco empresas: Petrobras (28,7%), Eneva (14,7%), Engie Brasil Energia (10,5%), EDF (9,4%) e Eletronorte (9,0%).

Três empresas responderam por 59,1% das emissões: Petrobras (24,9%), Engie Brasil Energia (19,0%) e Eneva (15,2%). Na sequência, aparecem Eletronorte (6,7%), EDF (6,1%), Eletrosul (5,0%), EDP (4,6%), Neoenergia (2,9%), Rio Doce Energia (2,5%) e J&F Investimentos (1,8%). Essas dez empresas geradoras são responsáveis por 88,8% das emissões de 2020, o que equivale a mais de 29 milhões de toneladas de gases de efeito estufa.

A pesquisa baseou os cálculos na taxa de emissão determinada pela divisão entre as emissões e a eletricidade gerada por uma usina. Via de regra, para atribuir esse indicador a uma empresa, considera-se tudo que foi emitido e gerado em todo o seu portfólio de usinas, incluindo diferentes fontes energéticas (hidráulica, eólica, biomassa, fósseis etc.).

“Como o escopo deste inventário são termelétricas a combustíveis fósseis de serviço público operando no SIN, as taxas de emissão calculadas para as empresas levam em conta apenas esse universo”, explica Barcellos.

Outro critério adotado pelos pesquisadores foi desconsiderar as usinas que operam em regime de cogeração de eletricidade e vapor (Termorio, Cubatão, Vale do Açú, Termobahia e Termocamaçari, todas pertencentes à Petrobras), para evitar que as taxas de emissão fossem superestimadas.

“Essas cinco usinas podem produzir vapor para processos industriais e a eletricidade é apenas uma saída parcial da planta. Como não foi possível obter os consumos de combustíveis exclusivamente para geração de eletricidade, optou-se por excluir da taxa de emissão as usinas que possuem cogeração”, observa Raissa Gomes, coautora do inventário.

Termelétricas alavancaram emissões

A geração de eletricidade por termelétricas que utilizam combustíveis fósseis aumentou 177% nas duas últimas décadas, passando de 30,6 TWh, em 2000, para 84,4 TWh, em 2020, resultando em um crescimento de 90% nas emissões de gases de efeito estufa no setor elétrico.

Para o Iema, os dados devem acender um alerta para o planejamento energético, onde as termelétricas a combustíveis fósseis, sobretudo a gás natural, ganharam espaço como alternativas imediatas à crise hídrica e risco de racionamento de energia.

O grupo é um dos críticos à previsão de implantação de 8 GW em termelétricas a gás natural espalhadas em todas as regiões do Brasil — que entrarão no sistema entre 2026 e 2030 — e com a postergação de subsídios e da vida útil de usinas a carvão mineral até 2040.

“Infelizmente, o que temos visto é o país caminhar na direção oposta [à transição limpa], com a expansão da operação de usinas termelétricas fósseis. Além da emissão de gases de efeito estufa, esse tipo de geração resulta em uma série de problemas ambientais”, alerta André Luis Ferreira, diretor-executivo do Iema.

Ele cita como exemplos o estresse hídrico por conta da utilização de água para resfriamento de sistemas termelétricos, à emissão de poluentes locais e à competição no despacho de energia com fontes renováveis.

“Sem falar que essas usinas contribuem significativamente para o encarecimento das contas de eletricidade”, acrescenta.

Falta transparência

Em comunicado divulgado à imprensa, o Iema afirma que encontrou dificuldades na obtenção de informações “de boa qualidade e acessíveis para o público, especialmente no que se refere a indicadores ambientais das usinas termelétricas e de suas empresas proprietárias”.

Para coletar os dados de 2020, os pesquisadores analisaram os Relatórios de Atividades Potencialmente Poluidoras e Utilizadoras de Recursos Ambientais, publicados no portal de dados abertos do Ibama.

“Essa foi a razão de 2020 ter sido o ano base adotado para o inventário, visto que informações referentes ao ano de 2021 ainda não se encontram completamente disponíveis”, completa o pesquisador Felipe Barcellos.

Nota de Esclarecimento CGT Eletrosul — A CGT Eletrosul informa que desconhece o método de cálculo utilizado para as estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa (GEEs) pela plataforma SEEG. A empresa ressalta, ainda, que a Termelétrica Candiota III busca continuamente melhorar o desempenho de seu processo industrial alinhado a metas de redução de emissão de gases de efeito estufa. Adicionalmente, a CGT Eletrosul esclarece que a eficiência da usina, conforme relatório preliminar da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), em 2020, foi de 34,69%, validada pela Aneel nos termos da Resolução Normativa 801/2017.

Atualmente, a UTE Candiota III utiliza prioritariamente carvão beneficiado, com significativos ganhos ambientais e de desempenho. No ano de 2020, as emissões totais da termelétrica foram de 1.278.445 TCO2e. Além disso, a usina é equipada com queimadores de baixo NOx, atendendo o limite de emissão estabelecido em sua licença ambiental.

No período de janeiro a março de 2019, foi executado um amplo serviço de manutenção e uma abrangente modificação no projeto para melhorar o desempenho da Termelétrica Candiota III. A partir de março de 2020, a CGT Eletrosul iniciou a operação da Planta de Beneficiamento de Carvão Mineral a Seco, com o objetivo melhorar a qualidade do combustível principal, obtendo ganho de desempenho e eficiência, e com menores emissões de GEEs.

Por fim, a CGT Eletrosul ressalta que a Eletrobras publica anualmente o Inventário de Emissões de Gases de Efeito Estufa, disponível no site, com valores correspondentes a cada empresa subsidiária, incluindo informações sobre as UTEs próprias. O inventário segue a metodologia do IPCC (2006) e as diretrizes do Greenhouse Gas Protocol – GHG Protocol (WRI, 2004), sendo ainda auditado pela PricewaterhouseCoopers, empresa independente de auditoria.

Nota de Esclarecimento Engie — A ENGIE Brasil Energia está direcionada a acelerar a transição energética e segue buscando a substituição da capacidade de geração a partir de fontes fósseis por fontes renováveis, fato comprovado por meio dos investimentos feitos ao longo dos últimos anos. Entre 2017 e 2021, a companhia investiu R$ 21,5 bilhões de reais em construções e aquisições no Brasil, incluindo 32,5% da TAG e o negócio de Linhas de Transmissão, com mais 2800 km de linhas em fase final de implantação, segmento fundamental para que a transição energética ocorra de forma justa e acessível a todos. A ENGIE Brasil Energia cresceu 34% em geração renovável, aumentando em 17% sua capacidade instalada própria. O parque gerador da companhia tem 8.440,9 MW de capacidade instalada própria. A participação de fontes renováveis nesse total cresceu de 86,2%, em 2020, para 96%.

No que tange à pesquisa divulgada pelo Instituto de Energia e Meio Ambiente, lembramos que a venda do Complexo Termelétrico Jorge Lacerda foi efetivada em outubro de 2021, quando as emissões do empreendimento deixaram de ser contabilizadas no inventário de emissões de GEE da companhia. Importante mencionar que a empresa dá total transparência aos dados de emissões de GEE e eficiência de suas usinas ao mercado, anualmente, em seu Relatório de Sustentabilidade. Em 2020, a Companhia registrou eficiência média de 30,8% no Complexo Termelétrico Jorge Lacerda, com consumo específico de 0,62 ton carvão/MW. Em Pampa Sul, a eficiência energética média foi de 35,2%, com consumo específico de 0,89 ton carvão/MW. Em 2021, a eficiência de Pampa Sul subiu 0,2 p.p. Assim,parece necessário uma análise mais aprofundada do estudo para entender qual metodologia matemática foi utilizada para se chegar aos dados relatados, que não condizem com o apurado pela Companhia.

A empresa reforça ainda que a decisão da saída dos ativos a carvão segue como um pilar importante e continua no foco do trabalho em 2022. Os negócios são conduzidos de forma a possibilitar uma transição gradual e justa para a economia das regiões envolvidas – reduzindo impactos socioeconômicos locais que poderiam ser gerados pela descontinuidade abrupta dessas operações. Assim, a expectativa de concretização da venda da Usina Termelétrica Pampa Sul, única usina a carvão remanescente no portfólio está prevista até o final de 2022. A venda é positiva para os planos da ENGIE de direcionar operações e investimentos aos projetos de energia renovável e infraestrutura de transmissão e, além disso, é importante para que a economia da região se reinvente, possibilitando uma transição socialmente justa.

As iniciativas da ENGIE Brasil Energia estão em linha com as metas estabelecidas pelo Grupo ENGIE, em âmbito global, de atingir a neutralidade de carbono até 2045.