Foi com grande expectativa que acompanhamos a publicação do Decreto 11.648 de 16 de agosto de 2023 que institui o programa de Energias da Amazônia. Bioma com 6 milhões de quilômetros quadrados, fundamental para o equilíbrio da biodiversidade do planeta, mas que precisa olhar para a população que lá habita.
O programa está focado nos sistemas isolados, que compreendem algumas partes dos estados do Acre, Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima, Amapá e Mato Grosso.
Ficamos muito satisfeitos em constatar que o programa privilegia as fontes renováveis e que todas as diretrizes e orientações desse programa se encaixam perfeitamente naquilo que o Brasil tem de melhor em geração de energia renovável: a água.
Recurso, que em um bioma mais sensível, viabiliza as Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCH) e a microgeração hídrica (CGH), já que as usinas de grande porte constituem outras variantes ambientais que precisam de aprofundamento.
Levando em consideração que todas as fontes de geração de energia, inclusive as renováveis, têm seu impacto ambiental, as Pequenas Centrais Hidrelétricas são empreendimentos de baixo impacto, em grande parte reversível, pois a vegetação se recompõe rapidamente, sendo a fonte mais renovável de todas e a de menor pegada de carbono, segundo o órgão Internacional do Clima, o IPCC.
Finalmente um programa corajoso que olha para a Amazônia com aquilo que ela tem em abundância e deve ser aproveitado: a água. Recurso tão precioso que deve ser valorizado e reconhecido em todos os seus usos múltiplos, ativos de descarbonização tão importantes em tempos de mudanças climáticas.
O programa Energias da Amazônia tem como premissa instituir ações com vistas a descarbonizar os Sistemas Isolados, visando diminuir a dependência de geração com combustíveis fósseis, o que viabiliza a expansão de geração renovável – inclusive com a implementação de leilões e autorizações de transmissão e geração –, de modo que se promovam suprimento de qualidade nas regiões, permitindo seu desenvolvimento e sustentabilidade com qualidade de vida.
Sinergia das PCHs com o Energias da Amazônia
As diretrizes do programa exigem atributos que todas as fontes renováveis apresentam. Porém, o destaque vai para as PCHs.
As PCHs se encaixam perfeitamente em todas as exigência do programa: a valorização dos recursos energéticos disponíveis na Amazônia legal, onde a água é abundante, e a promoção da redução de perdas e eficiência energética.
A modalidade, dentre as renováveis, é a que oferece esses atributos com o maior fator de capacidade, promoção da estabilidade dos sistemas de transmissão, com o equilíbrio adequado entre confiabilidade e tarifa, já que as PCHs têm mais de 100 anos de vida útil e podem ser relicitadas pelo Governo, a cada 35 anos, e construir suas próprias linhas de transmissão, evitando onerar o consumidor.
As PCHs se encaixam perfeitamente em todas as exigência do programa:
- a valorização dos recursos energéticos disponíveis na Amazônia legal, onde a água é abundante;
- a promoção da redução de perdas e eficiência energética – onde a PCH é a fonte renovável que oferece esses atributos com o maior fator de capacidade dentre as renováveis;
- a promoção da estabilidade dos sistemas de transmissão, com o equilíbrio adequado entre confiabilidade e tarifa – já que as PCHs têm mais de 100 anos de vida útil, podendo ser relicitadas pelo Governo a cada 35 anos, construindo suas próprias linhas de transmissão e evitando onerar o consumidor
Benefícios estruturais e socioambientais
Importante frisar que a fonte hídrica promove dezenas de benefícios, tanto para o Sistema Elétrico Nacional, quanto socioambientais, que nenhuma outra fonte renovável disponibiliza na mesma proporção, como: armazenamento, suprimento, confiabilidade, flexibilidade operativa – geração de energia sem interrupção, pois não tem intermitência, diminuindo as chances de apagão e promovendo a estabilidade do Sistema.
Além disso, reduzem as emissões dos gases estufa provocados pelo uso excessivo de combustíveis fósseis, contribuem para o controle de cheias com regularização da vazão dos rios, para o lazer e a irrigação no período seco.
E a cereja do bolo: como as PCHs são obrigadas a fazer Área de Preservação Permanente (APP) por serem um Bem da União, ainda podem ajudar a preservar e reflorestar a Amazônia, que sofre tanto com queimadas e desmatamento.
- Para aprofundar: Hidrelétricas na Amazônia voltam aos holofotes
Deve-se ressaltar ainda que, por serem um Bem da União, deve ser interesse da União incentivá-las, já que as Pequenas Centrais Hidrelétricas são uma indústria 100% nacional, que geram renda e emprego no Brasil, e não fora dele.
Tal perfil vem ao encontro de outro programa tão importante do Governo Lula: fomentar a neoindustrialização do Brasil Competitivo com a menor pegada de carbono e com a menor tarifa final ao consumidor e à sociedade brasileira, que não suporta mais pagar energia tão cara.
Soluções de geração híbrida exigidas no programa também são diretrizes inteligentes, pois a geração através da água combina com qualquer outra fonte de geração, além de promover intensamente a participação social por meio do fomento à piscicultura nos pequenos reservatórios, gerando renda e emprego à população ribeirinha, trazendo dignidade humana e melhoria da qualidade de vida e servindo de reforço e incentivo para que se perpetuem os costumes naturais e a cultura dos povos tradicionais da região Norte do país.
Nuvens e queimadas prejudicam incidência solar
Por fim, um fato preponderante para que se priorize também as Pequenas Centrais Hidrelétricas nesse programa é o fato de que, segundo o Instituto Nacional de Pesquisa Espacial (Inpe), a região Norte amazônica é a região de menor potencial de produção de energia solar do país, o que faz essa fonte renovável perder parte da sua competitividade nesse programa.
- A Amazônia tem muita cobertura de nuvem e queimadas, o que reduz a incidência solar para produção de energia, aumentando a intermitência e reduzindo a eficiência dessa fonte.
E ainda que as baterias artificiais façam parte do serviço que pode ser integrado ao programa, devem ser repensadas com cuidado, pois são equipamentos de pouca vida útil que deverão ter seu descarte pré-definido de maneira adequada e sustentável, visto não terem ainda divulgado um plano de reciclagem desse passivo ambiental que será gerado.
A melhor bateria natural, duradoura, que promove segurança hídrica, energética e alimentar continua sendo o reservatório de água das hidrelétricas de todos os portes, patrimônio do povo brasileiro, que não deixará resíduos na natureza quando terminar sua vida útil.
Alessandra Torres de Carvalho é presidente da ABRAPCH (Associação Brasileira de Pequenas Centrais Hidrelétricas e Centrais Geradoras Hidrelétricas.
Este artigo expressa exclusivamente a posição das autoras e não necessariamente da instituição para as quais trabalham ou estão vinculadas.