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Diálogos da Transição
eixos.com.br | 17/08/21
Editada por Nayara Machado
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Com Cinthia Leone
A seca que afeta a maior parte do país reduziu a capacidade hidrelétrica, obrigando o acionamento emergencial de termelétricas, que encarecem a conta de luz e tornam a produção brasileira menos competitiva.
Um estudo (.pdf) do Instituto Clima e Sociedade (iCS) defende que o país deve aproveitar o bom momento global para as fontes renováveis para reduzir o risco climático da energia hidrelétrica e aposentar usinas térmicas que pesam na conta de luz.
Para isso seria necessário estabelecer incentivos econômicos que permitam às hidrelétricas manter o nível dos reservatórios, eliminar os subsídios que hoje favorecem as termelétricas e deixar o mercado livre para que solar e eólica assumam o protagonismo no sistema.
“Isso só será possível se houver uma mudança, e é importante que ela seja rápida”, diz Amanda Ohara, consultora do Portfólio de Energia no iCS e uma das autoras do estudo.
Em entrevista à epbr, a engenheira química explica a proposta e faz um alerta sobre pressões setoriais que colocam em risco o planejamento energético do país, em um dos momentos mais críticos da história.
Segundo Ohara, o sistema atual é carregado de subsídios cruzados diversos, e o consumidor não sabe como é feita a composição da sua conta.
Ela cita como exemplos o subsídio para as fontes fósseis, por meio da Conta Consumo de Combustíveis (CCC), que faz o rateio entre todos os consumidores do país do custo de aquisição do combustível usado nas termelétricas, como carvão, diesel e gás.
E a isenção de parte das tarifas de uso, transmissão e distribuição para fontes renováveis, extinta com a aprovação da MP 998 — o governo estuda agora como considerar os benefícios ambientais no sistema.
“Essas políticas foram criadas quando o sistema elétrico era completamente diferente, e o avanço tecnológico permite esta revisão. Mas hoje o risco é tirar o subsídio apenas das fontes renováveis e deixar o das energias fósseis, o que impede a competição isonômica”, analisa.
Na avaliação da especialista, a concorrência só seria realmente livre com a internalização dos benefícios ambientais das fontes renováveis e os impactos climáticos das fontes fósseis.
A seguir, os principais pontos da entrevista com Amanda Ohara.
Quando falta água, o país aciona as usinas térmicas. Nossa segurança energética depende das termelétricas?
Em um contexto como o atual, em que precisamos das térmicas para suprir a falta de energia gerada pela água, cria-se essa ideia geral de que as térmicas são necessárias para garantir a segurança energética.
Mas, na verdade, não precisa ser assim. Já temos alternativas muito mais interessantes para o sistema elétrico.
Quais são essas alternativas?
A melhor ciência que temos recomenda impulsionar a expansão de renováveis intermitentes para mudar a forma de operar o sistema.
Mas um sistema que opera na base com renováveis intermitentes precisa de uma fonte reserva e complementar.
Hoje as hidrelétricas operam na base do sistema, mas elas podem funcionar como grandes baterias.
Elas são remuneradas apenas pela geração de energia, mas não pelos outros serviços que prestam, como o armazenamento, importante também para os usos múltiplos da água, por exemplo, irrigação e abastecimento.
Se as hidrelétricas fossem remuneradas pelo volume de água contido nas represas, elas passariam a ter o papel emergencial hoje desempenhado pelas térmicas.
As hidrelétricas reversíveis, que têm reservatórios em níveis diferentes, também poderiam funcionar como uma forma de bateria adicional e muito barata.
Com mais energia do vento e do sol e os reservatórios das hidrelétricas como fontes complementares, não precisaríamos das térmicas, poderíamos poupar mais as represas antes do período seco e baixar muito a conta de luz.
Aumentar a participação de renováveis no mix de energia do país representa algum risco?
O Brasil só tem a ganhar ao integrar mais renováveis a sua matriz energética.
O país pode, por exemplo, recuperar sua siderurgia, que está há anos com dificuldade de competir no mercado internacional.
Com a expansão das renováveis, é possível reestruturar esse setor para o fornecimento de aço verde.
Pelo nosso potencial em renováveis, o BloombergNEF (BNEF) indica o Brasil como o país onde se pode produzir o hidrogênio verde mais barato do mundo até 2050.
No estudo, vocês afirmam que o país criou limitações para a adição de empreendimentos eólicos e fotovoltaicos centralizados. Ao mesmo tempo, as mudanças recentes no setor impõem a expansão do sistema elétrico a partir de térmicas a combustíveis fósseis.
O planejamento energético acabou?
Essas políticas arbitrárias impostas pelo Congresso Nacional criam reservas de mercado para fontes que não são competitivas. Isso gera o risco de o país abrir mão do planejamento energético, a pior coisa que poderia acontecer no setor.
Nós criticamos a aplicação dessas distorções em favor de qualquer fonte, não apenas as fósseis.
Estudo recente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) sobre o custo de cada uma das emendas da MP da Eletrobras mostra que a que tem o maior impacto financeiro sobre o sistema é o benefício para as pequenas centrais hidrelétricas (.pdf).
Quando defendemos preservar o papel das instituições do setor elétrico, nossa preocupação especificamente é com o planejamento energético.
Outra preocupação é a reforma do setor elétrico, que está em discussão e é uma tentativa de adequar a legislação do setor às transformações dos últimos 20 anos [o último marco regulatório é de 2004].
Os sinais econômicos e políticos atuais não são adequados para que as melhores soluções tecnológicas sejam implementadas.
Como você avalia as ações do governo para lidar com a organização do setor e enfrentar a crise energética?
É muito emblemático o que aconteceu na MP da Eletrobras, e este exemplo é apenas um dos muitos problemas.
A MP do enfrentamento da crise energética mostra a mesma tendência e já chega com mais de 240 emendas, uma delas propondo que o subsídio ao carvão, que seria finalmente encerrado em 2027, possa ser estendido.
O que isso tem a ver com o enfrentamento da crise?
Há um padrão no governo atual para lidar com crises de grandes proporções: nega a importância da crise, não age com a urgência e competência necessárias e, diante do agravamento do problema, oferece uma solução que não é indicada pela ciência.
No caso da crise energética, primeiro o ministro vem a público dizer que não há risco de racionamento.
Mas o problema é sim bastante grave, e o consumidor deve ser informado de que já está pagando caro para evitar o racionamento.
Depois, o governo cria um comitê que é lento em implementar soluções e, quando as apresenta, são questionáveis.
Um exemplo: o comitê propôs usar esta crise para criar contratos de longo prazo com termelétricas — é o oposto do que a melhor ciência do tema indica, fazendo das térmicas uma espécie de cloroquina do setor energético.
O fiador disso tudo será o consumidor brasileiro.
Curtas
A Câmara dos Deputados deve votar nesta quarta (18) o marco legal da geração distribuída, PL 5829/2019, disse o relator, deputado Lafayette de Andrada (Republicanos/MG) nas redes sociais…
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Do pasto ao prato: aplicativo agrega dados socioambientais para promover o consumo consciente de carne no Brasil. A plataforma traz informações sobre a origem do produto e ocorrências de desmatamento e trabalho análogo à escravidão, por exemplo.
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A Ipiranga está selecionando pesquisadores para discutir o futuro da mobilidade urbana no Brasil. Com inscrições abertas até 29/8, programa oferece bolsa de R$ 10 mil. Entre os temas propostos: mobilidade elétrica, compartilhamento de veículos, mobilidade como serviço e soluções logísticas urbanas.
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