BRASÍLIA – Os estudos para construção de um reservatório na usina hidrelétrica de Belo Monte visam a, principalmente, resolver conflitos socioambientais.
O empreendimento está localizado em Altamira, no Pará, e tem uma capacidade instalada de 11,2 gigawatts (GW). Por ser uma usina que opera a fio d’água, não tem a possibilidade de estocar água para o período seco.
A iniciativa da Norte Energia, de estudar a construção de um reservatório, partiu de uma recomendação do Ministério de Minas e Energia (MME), como forma de contar com a usina de forma mais constante ao longo do ano.
Em nota, a pasta afirmou que tem discutido com os envolvidos uma forma de conciliar a produção de energia na hidrelétrica de Belo Monte com as questões socioambientais. Os estudos são iniciais e ainda é cedo para afirmar se vão adiante.
Segundo a pasta, a “eventual construção [de barragens] atenderia exclusivamente anseios socioambientais, não devendo ser dimensionado para geração adicional no complexo de Belo Monte”.
A pasta tentou, em 2023, aprovar uma resolução no Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) para reconhecer a importância estratégica o interesse público de Belo Monte para garantia da segurança energética nacional.
E, assim, avançar com a definição de um regime de vazão (hidrograma) que ampliasse a geração da usina. Quando Belo Monte gera mais no período de chuvas, é possível poupar energia nas hidrelétricas com reservatórios para o período seco.
A discussão não avançou por resistência da área ambiental do governo, comanda por Marina Silva.
Este ano, questões ambientais voltaram aos holofotes após um gargalo na geração de Belo Monte: linhas de transmissão foram danificadas, levando a menos geração e aumento no nível das águas no Xingu, ampliando a área de desova de peixes.
Com o restabelecimento do sistema de transmissão, o Ibama demandou que a geração continuasse limitada até o fim do período de reprodução das espécies, ao longo do primeiro trimestre. O caso foi parar na Justiça Federal.
Geração irregular em Belo Monte
Segundo dados do Operador Nacional do Sistema (ONS), entre fevereiro e maio Belo Monte gera acima dos 6 GW médios (GWm) a cada dia. Trata-se do período úmido na região, com chuvas generosas e bons níveis no rio Xingu.
Nessa época, as 18 turbinas de Belo Monte são acionadas e a usina desempenha um papel importante a partir das 15h, sendo responsável por mais de 10% da carga total.
A seca chega em junho, quando a geração começa a cair para 1,6 GWm e o nível mais baixo é atingido em outubro, com uma média de 140 megawatts médios (MWm). A essa altura, apenas uma turbina é ligada.
A volta das chuvas em novembro faz com que a geração volte a subir, mas ainda em níveis discretos. De dezembro a janeiro são gerados 1,7 GWm.
Mesmo sem reservatório, Belo Monte é importante para conservar água em empreendimentos das regiões Sudeste e Sul. O ONS atribuiu à usina, no ano de 2022, ganhos de até 17,4% que deixaram de ser utilizados antes do período de seca.
Essa geração irregular ao longo do ano poderia ser mitigada com a construção de barragens, medida que precisaria contemplar uma análise de impacto ambiental.
“Estamos fazendo um rastreamento da região a montante da usina para ver se é possível encontrar uma área em que possam ser contornadas as questões ambientais envolvidas e fazer uma espécie de uma caixa d’água”, afirmou recentemente o presidente da Norte Energia, Paulo Roberto Ribeiro Pinto.
No projeto original, a decisão de construir a maior hidrelétrica 100% brasileira no Xingu sem um grande reservatório foi tomada justamente como uma forma de minimizar os efeitos nocivos ao meio ambiente, com redução da área alagada.
População depende do Xingu
Pacificar o hidrograma autorizado para a usina passa pela pesca na região, que poderia ser afetada pelo empreendimento.
As comunidades locais dependem da atividade para o sustento e a Norte Energia chegou a destinar uma verba de reparação a mais de 6 mil pescadores como medida de compensação socioambiental.
Um dos riscos apontados durante o processo de licenciamento ambiental foi a extinção de espécies de peixes nativas do Xingu. Dessa maneira, a concessionária desenvolveu, como medida de compensação, um programa de conservação que inclui um laboratório em parceria com a Universidade Federal do Pará (UFPA).
A usina de Pimental, também localizada no complexo de Belo Monte, possui uma “escada de peixes”, que é importante para o período de reprodução das espécies.
A licença prévia emitida pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (Ibama) prevê os hidrogramas A e B, que seriam alternados ano a ano. Os dois parâmetros intercalariam vazões maiores (B) e menores (A).
Em 2019, o órgão chegou a retificar a licença de operação e propôs um hidrograma de consenso ainda mais restritivo. Após a crise hídrica ocorrida nos anos de 2020 e 2021, a medida foi revertida.
Assim, a operação voltou ao hidrograma B, mas a Norte Energia pretende, com a licença de operação definitiva, que ocorra o revezamento entre os parâmetros.
O presidente da Norte Energia insiste que a hidrelétrica é imprescindível para o sistema e, por esse motivo, é necessário avançar no debate que envolve a vazão do rio. “Se tirar Belo Monte, você tem que ligar térmica. Ligando térmica, você tem que emitir CO2. Não tem jeito”, disse.
A Norte Energia vê o MME como sensível à importância da usina, mas existem órgãos que se opõem à plena operação de Belo Monte, a exemplo do MMA e do Ministério Público Federal do Pará.