Energia

Atenua uma catástrofe, acentua outra

Seguro para cobrir danos com eventos climáticos extremos não cabe na conta de luz, escreve Carlos Faria, da Anace

Cortes orçamentários na Aneel e na EPE deixam planejamento e regulação em xeque no setor elétrico. Na imagem: Carlos Faria, diretor presidente da Associação Nacional dos Consumidores de Energia – Anace (Foto: Divulgação)
Carlos Faria é diretor-presidente da Associação Nacional dos Consumidores de Energia – Anace (Foto: Divulgação)

Os eventos climáticos extremos têm vitimado milhares de famílias todos os anos no Brasil. O setor de seguros pretende enfrentar o problema por meio da criação de um fundo de amparo financeiro emergencial às vítimas desses eventos, como enchentes e deslizamentos.

Como detalhou reportagem de Alexa Salomão, na Folha de S. Paulo, o seguro garantiria um dinheiro extra, de uso livre, para que as pessoas possam se alojar em um lugar melhor, comprar comida, medicamento ou roupas, o que considerassem mais importante.

Diante da gravidade dos fenômenos, dos seus impactos sobre as pessoas atingidas e da tendência que ocorram com maior intensidade e frequência devido às mudanças climáticas, não há dúvidas quanto à relevância da proposta. O problema é como se pretende financiar o seu custo: cobrando-se R$ 3 nas contas de luz de todos os brasileiros.

O valor pode parecer relativamente pequeno, com impacto da ordem de 1% no valor pago por uma família de classe média. Mas boa parte dos cerca de R$ 40 bilhões que incidem nas contas dos brasileiros todos os anos está justamente ligada a projetos que, inicialmente, pelo menos, tinham impacto aparentemente inofensivo para o bolso do consumidor, mas cujo potencial combinado é explosivo.

Hoje, apesar da preocupação unânime da sociedade brasileira quanto aos custos da energia no país, ninguém questiona a importância do subsídio às tarifas de energia pagas pelos consumidores de baixa renda. O que se questiona, na verdade, é a sua incidência nos valores pagos pela energia pelos demais consumidores.

O fato é que os custos de políticas desse tipo, por mais meritórias que sejam, não cabem aos consumidores de energia: se a sociedade brasileira entender que fazem sentido para melhorar as condições de bem-estar das populações mais expostas aos riscos climáticos, entre outras, seus custos têm de ser cobertos por meio do orçamento da União, que terá de cortar outros gastos para conseguir combinar o atendimento de prioridades da população brasileira com os recursos disponíveis, de modo a garantir o equilíbrio fiscal.

Sem dúvida que a busca por esse equilíbrio, os impactos crescentes das mudanças climáticas sobre as famílias mais pobres e o valor explosivo da energia são temas extremamente preocupantes, que têm sido objetos, inclusive, de inúmeras manifestações de representantes de diferentes níveis do governo.

Todos têm de ser enfrentados com a devida seriedade que merecem. Mas, de maneira nenhuma, esse enfrentamento pode significar, mais uma vez, pressões injustas e desnecessárias sobre os consumidores.

Carlos Faria é diretor-presidente da Associação Nacional dos Consumidores de Energia (Anace)