Energia

Aneel revoga autorizações para térmicas flutuantes da Karpowership

Contratadas no leilão emergencial de energia de reserva, usinas a gás deveriam ter entrado em operação no dia 1 de maio

Aneel revoga autorizações para térmicas flutuantes da Karpowership
As termelétricas flutuantes da KPS estão sendo instaladas na Baía de Sepetiba, no Rio (Foto: Sara Ribeiro/Arayara.org)

BRASÍLIA — A diretoria colegiada da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) votou nesta terça (9/8) pela revogação de autorizações para as quatro térmicas flutuantes a gás natural da Karpowership (KPS), instaladas na Baía de Sepetiba, no Rio de Janeiro.

Contratadas no leilão emergencial de energia de reserva (PCS) – justificada pela crise hídrica – deveriam ter entrado em operação no dia 1 de maio de 2022, sob pena de multas por atraso e de rescisão contratual. No entanto, o prazo foi postergado para 1 de agosto, e novamente descumprido.

“Restou evidenciado não apenas a necessidade de que estes empreendimentos fossem implantados, mas que isto ocorresse até esta data, estabelecida pelo planejamento. Assim, uma vez que as usinas não estavam disponíveis nos termos pactuados em âmbito do PCS, deixaram de atender a sua finalidade”, registrou o diretor da Aneel Hélio Guerra, relator da matéria, em seu voto.

A KPS havia apresentado um requerimento solicitando o reconhecimento de excludente de responsabilidade pelo descumprimento de cronograma de implantação das UTEs Karkey 13, Karkey 19, Porsud I e Porsud II.

Durante sustentação oral, a advogada da KPS Beatriz Watanabe Silva disse que o empreendimento estaria pronto para iniciar a operação, mas ações na Justiça estão impedindo o cumprimento do cronograma.

Já a Aneel argumenta que a excepcionalidade das regras do leilão emergencial requeriam que as usinas estivessem injetando energia na data pactuada.

“O empreendimento não está pronto. Se estivesse pronto, estaria injetando potência no dia 1 de agosto de 2022 e isso não ocorreu. Portanto, não foi cumprido o principal motivo para a realização do PCS, que foi a injeção de potência no dia 1 de maio, ou no dia 1 de agosto. Os riscos foram assumidos pelo próprio empreendedor”, disse o relator.

Ainda de acordo com Guerra, as usinas podem solicitar participação em outros leilões ou solicitar outorgas para operar no mercado livre.

A agência também determinou à Superintendência de Fiscalização de Serviços de Geração que instaure processo administrativo com vistas à aplicação de eventuais penalidades em razão da não implantação das térmicas.

Em nota, a Karpowership disse que respeita o processo que ocorreu na Aneel, mas não concorda com a decisão.

“A empresa está confiante em seus argumentos e reforça que seguiu todos os procedimentos e exigências legais necessários para cumprir suas responsabilidades, mesmo com um prazo desafiador para iniciar a operação. A empresa acredita que o processo precisa de uma análise dos novos elementos que surgiram nas últimas semanas, como a liminar do TJ-RJ que determinou a suspensão do projeto”.

E ainda que “está comprometida e continuará a cumprir as leis e os requisitos brasileiros e a implementar as melhores práticas do setor. A empresa tomará todas as medidas legais disponíveis e acredita que a justiça brasileira prevalecerá”.

Entenda o caso das termelétricas da KPS

As térmicas flutuantes da KPS, que somam 560 megawatts (MW) de capacidade instalada, foram contratadas no leilão emergencial realizado pela Aneel em 25 de outubro de 2021, como parte das medidas de enfrentamento à crise hídrica, por determinação do governo federal.

As térmicas a gás da KPS representam quase a metade (47%) dos 1,2 GW contratados no leilão. O restante será fornecido por outras 17 usinas.

Os empreendimentos deveriam ter entrado em operação em maio deste ano, e tiveram prorrogação de prazo para 1° de agosto.

A KPS não foi a única a descumprir o cronograma. Onze das 17 usinas do leilão emergencial da crise energética de 2021 perderam o prazo. Todas foram notificadas e receberam 15 dias para se defender junto à Aneel.

No dia 26 de julho, a diretoria da Aneel já havia negado pedido semelhante feito pela Termelétrica Viana S.A. (Tevisa), que requeria excludente de responsabilidade pelo atraso na implantação da UTE Viana I.

Organizações pediram rescisão dos contratos com governo

Mais de 20 organizações da sociedade civil ligadas ao setor de energia e meio ambiente enviaram uma carta aberta ao Ministério de Minas e Energia (MME) nesta segunda (8/8) pedindo a rescisão dos contratos e a manutenção das penalidades por descumprimento das regras do edital.

No documento dirigido ao ministro Adolfo Sachsida, as instituições apontam que isentar a Karpowership do cumprimento das regras do leilão e de normas que regulamentam o setor elétrico violaria o princípio de isonomia.

As organizações também apontam um contrassenso em prorrogar prazo para um empreendimento contratado sob regime de urgência. Leia a carta na íntegra (.pdf)

Para aprofundar:

Ações na Justiça contra UTEs flutuantes

Além disso, as instalações são alvo de questionamentos na Justiça.

A Baía de Sepetiba é circundada de áreas de proteção ambiental e reúne cerca de 3,5 mil pescadores artesanais, o que motivou ações judiciais e administrativas questionando o empreendimento da Karpowership, desobrigado de apresentar estudos de impacto ambiental (EIA/Rima).

Uma decisão da Justiça Estadual do Rio de Janeiro, no dia 22 de julho, quando as embarcações da KPS começaram a se posicionar na zona costeira, determinou no entanto a suspensão imediata da instalação e operação das quatro térmicas flutuantes a gás natural.

Na decisão, a juíza da 2ª Vara da Fazenda Pública do Rio de Janeiro, Georgia Vasconcellos da Cruz, questiona justamente a deliberação da Comissão Estadual de Controle Ambiental que dispensou a empresa de apresentação de estudos ambientais para obtenção de licenças junto ao Inea, órgão ambiental fluminense.

A KPS foi intimada pela justiça estadual na última quarta-feira (3/8) a interromper as instalações até que sejam apresentados e aprovados os estudos de impacto ambiental, sob multa de 500 mil reais.

Ministério Público também entrou com ação

No início de junho, o Ministério Público Federal (MPF) apresentou uma nova ação civil pública para impedir instalações e atividades com alto potencial de dano ao meio ambiente na Baía de Sepetiba.

O procurador da República, Jaime Mitropoulos, autor da ação, explicou que, de forma geral, as ações de controle ambiental dos impactos causados pela construção de usinas hidrelétricas ou termelétricas caracterizam-se por serem mitigatórias ou corretivas, mas que poderiam ser evitados ou reduzidos, se fossem tomadas medidas preventivas desde as fases iniciais do planejamento.

O órgão solicitou que a Justiça determinasse com urgência e sem necessidade de justificação prévia a concessão de liminar estabelecendo que o Inea se abstenha de conceder qualquer licença ambiental destinada à instalação e operação das usinas flutuantes na baía, com geração de energia elétrica, com capacidade instalada será de 560MW, em favor da empresa Karpowership Brasil Energia.

Os relatórios e avaliações (EIA/Rima) deverão abarcar os impactos cumulativos e sinérgicos entre as quatro termelétricas, as 36 torres de transmissão de energia e demais empreendimentos que impactam na Baía de Sepetiba.

Em março deste ano, o órgão já havia ingressado com um pedido para anular a licença de instalação de 36 torres de transmissão de energia na região.

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