O avanço do mercado livre de energia e a expansão da geração distribuída e da autoprodução impõem um desafio extra às distribuidoras, que já enfrentam seus problemas operacionais. Com isso, as concessionárias terão que adaptar seu modelo de negócio, afirmam especialistas reunidos na terceira temporada dos Diálogos da Transição 2023 da epbr, que acontece ao longo desta semana (veja a íntegra da entrevista acima).
A partir de 2024, de acordo com resolução do Ministério de Minas e Energia, todos os consumidores de alta tensão, do Grupo A, com consumo em média de R$10 mil reais mensais, poderão migrar para o mercado livre.
Há ainda a possibilidade de, nos próximos anos, consumidores de baixa tensão e residenciais também acessarem essa forma de compra de energia.
Já a capacidade em geração própria de energia elétrica, a Geração Distribuída (GD), atingiu no Brasil o volume de 23 gigawatts (GW), e já representa 11% de toda energia gerada no país, com a geração solar responsável por mais de 98% do total em GD.
Entre as modalidades com grande crescimento está a energia por assinatura, que permite ao consumidor usar a eletricidade gerada por uma usina solar sem ter que instalar em sua residência ou comércio. O número de usinas aumentou 250% nos últimos dois anos, para 6.652 atualmente.
Nesta quinta-feira, nos Diálogos da Transição 2023, a agência epbr vai discutir novas tecnologias para renováveis no país, como baterias, usinas híbridas e solar flutuante
Se não pode vencê-los…
“A geração distribuída está crescendo cada vez mais. Acho que a distribuidora só tem duas opções pela frente. Ela ou monta uma empresa de geração distribuída, ou monta uma empresa de geração distribuída. Essa é a realidade”, disse Walter Fróes, CEO da comercializadora CMU Energia.
A companhia atende 135 mil consumidores de geração distribuída, concentrados em Minas Gerais, e espera chegar a 500 mil consumidores nesta modalidade até 2025.
O executivo, contudo, destaca que é necessário cautela e rigor no momento dessa transição do papel das distribuidoras.
“Isso tem que ser observado com muito critério, tanto na questão de conexão de plantas, não ter privilégio para as plantas próprias, quanto também na abordagem aos consumidores não usar a informação privilegiada. Ela é da distribuidora, que é um ente de Estado, é uma concessão, para uma empresa comercial competidora para conosco. Então, acho que a distribuidora deve vir para esse mercado, ela é bem-vinda com esse cuidado regulatório, ético, em primeiríssimo lugar”, pontua Fróes.
Divisão de papéis
Para Rafael Maia, CEO da LUZ, que pretende conquistar a fatia de 15% dos consumidores livres, “provavelmente a distribuidora vai ter que dividir o negócio em três: a geração, a distribuição e a comercialização.
“A distribuição vai ser um mercado atendido por todos (…) A distribuidora, quando olhamos de outros países, vemos que em geral ela separa o negócio, aí são outras empresas que vão fazer outras partes do processo, mas eu vejo que para a distribuidora pode ser justamente a oportunidade de otimizar o processo e ter uma redistribuição mais eficiente, a maneira de buscar a eficiência e fazer esse processo melhorar para ela”, afirma Maia.
Danilo Lima, diretor de Inteligência de mercado da 2W Ecobank também acredita que a distribuidora pode se concentrar na sua atividade principal.
“Distribuidora já tem bastante desafio, mas qual é o desafio do trabalho dela? Distribuir energia, não é comprar e vender, e isso ela faz porque ela está lá, na porta do cliente, na porta do consumidor (…) Vamos deixar a distribuidora fazendo o que ela sabe fazer de melhor e precisa fazer, que é manutenção, expansão de rede de distribuição”
Modelo de transição
Danilo, contudo, ressalta que é importante um modelo de transição seguro para as distribuidoras.
“Existe, de fato, uma transição necessária por conta dessa nova delimitação de responsabilidades que a distribuidora precisa ter. Ela, durante muito tempo, teve um papel fundamental de, de fato, levar essa energia para onde ela precisava chegar (…) Temos que ter muito cuidado com contratos legados”, afirma.
“O Danilo colocou muito bem essa transição programada, ela foi feita dentro de um acordo, onde todo mundo participou do acordo. E isso sendo respeitado, eu acho que é o caminho. Você vai ter perdas para todos os lados, ganhos para todos os lados também em algum momento, mas acho que é uma relação civilizada, foi feito um acordo sobre isso”, pontuou Walter Fróes.
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