Diesel e atraso no Proconve são vilões da saúde nas cidades

Diesel, atraso no Proconve e falta de monitoramento são vilões da saúde nas cidades
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

newsletter

Diálogos da Transição

eixos.com.br | 02/03/21

Editada por Nayara Machado
[email protected]

Até 2023, a frota de veículos pesados do Brasil deve adotar novas regras do Programa de Controle de Poluição do Ar por Veículos Automotores (Proconve), passando para a fase P8, equivalente às normas já adotadas nos Estados Unidos e na Europa, como o Euro 6.

Um estudo do Instituto Saúde e Sustentabilidade (.pdf) calcula que essa mudança tecnológica pode gerar um saldo positivo de R$ 68 bilhões em produtividade nos próximos 30 anos — contados a partir de 2023 — e evitar cerca de 148 mil mortes.

O P8 traz metas mais restritivas para a emissão de poluentes vindos da combustão do diesel, com exigência da adoção de tecnologias e motores menos poluentes.

A substituição gradual da frota também resultaria em uma economia aproximada de R$ 575 milhões, fruto da não internação hospitalar de 155 mil pessoas. Isso considerando apenas seis regiões metropolitanas brasileiras: São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Vitória, Curitiba e Porto Alegre.

Apesar desses benefícios, o início do P8 em 2023 corre o risco de ser postergado a pedido das montadoras.

No final do ano passado, a Anfavea (associação que representa fabricantes de veículos) passou a defender a postergação da mudança de fase do Proconve, alegando “falta de tempo hábil” por conta da pandemia. Veja release divulgado em dezembro (.pdf

Em entrevista à epbr, a médica Evangelina Vormittag, uma das principais especialistas em gestão de sustentabilidade do Brasil, critica o pedido de adiamento do P8 e dá um panorama sobre as causas da poluição no Brasil.

Ela explica que o principal desafio para resolver o problema da poluição nas cidades é fazer as políticas públicas funcionarem.

“A gente até tem políticas e leis, mas elas não são cumpridas, ou são desatualizadas, não têm penalidade, ou pior, não tem fiscalização”, pontua Evangelina, que também é uma das autoras do estudo do Instituto.

Entre os exemplos de políticas que não são cumpridas estão a inspeção veicular e o monitoramento da qualidade do ar.

“A inspeção veicular é uma lei, os estados do Brasil inteiro teriam que ter implementado inspeção veicular. O único que implementou foi o Rio de Janeiro e agora já não faz mais”, diz.

Já no caso do monitoramento, apenas dez estados e o Distrito Federal fazem e “desses dez estados a gente pode considerar que cinco monitoram muito mal”, alerta.

Confira os principais pontos da entrevista:

Quais as principais fontes de poluição no Brasil?

As fontes de poluição são variadas. Tem as fontes veiculares e as fontes por queimadas. As fontes veiculares têm uma importância grande por conta do uso do combustível diesel. A gente fez um estudo (.pdf) que mostrou que 25% das mortes em seis regiões metropolitanas estavam relacionadas à frota de ônibus por causa do diesel.

Mas no caso do Brasil, além das grandes metrópoles, no interior de São Paulo, por exemplo, a gente tem as grandes queimadas por cana de açúcar, as queimadas de lixo.

E na Amazônia, o nível de poluente por material particulado — o mesmo que é emitido pelo diesel, e o mais nocivo para a saúde — chega a ter níveis muito superiores ao das grandes metrópoles.

Por que existe essa impressão de que a poluição está concentrada nas grandes cidades?

O problema é que o monitoramento de qualidade do ar não ocorre no país todo. Então, a gente não tem o diagnóstico dos outros locais.

Na Amazônia, esse monitoramento só ocorre via satélite. No caso do Brasil, é uma meia verdade que as grandes cidades são as que têm mais poluição, porque existem também outros lugares com altos níveis.

Por exemplo, a Organização Mundial da Saúde monitora o nível de qualidade do ar pelas estações de monitoramento dos estados. Como são apenas dez estados e o Distrito Federal que monitoram no Brasil, quando eles fazem esses mapas [da poluição], eles acabam se referindo a onde tem o monitoramento.

Recife, por exemplo, é um local que também tem um nível de poluição alto e principalmente por fonte veicular, só que não aparece no mapa.

Qual o maior desafio para resolver o problema da poluição nas cidades brasileiras?

As políticas públicas funcionarem. A gente até tem políticas e leis, mas elas não são cumpridas, ou são desatualizadas, mal formuladas, infra legais, não têm sanção, embora tenha responsabilidade, não tem penalidade, ou pior, não tem fiscalização.

Então, no final, quem faz o papel de fiscalização e monitoramento é o Ministério Público, que atua nesse sentido, e as organizações de terceiro setor. Porque geralmente os Estados são quem tem que cumprir a maior parte das leis, mas eles não cumprem.

Dentre essas políticas, existe uma mais crítica? Isto é, que se fosse levada a sério o impacto da poluição seria bem menor?

Todas as políticas somadas são importantes para a redução de emissões. [Mas] tem uma situação gravíssima agora que a gente tem trabalhado em cima, o Proconve.

Agora, ele se encontra na fase P7, uma fase que está atrasada porque a gente se baseou no programa europeu, e corresponde ao Euro 5. Só que Europa e Estados Unidos já estão na fase Euro 6. Em 2019, houve uma reunião do Conama que determinou que em 2023 o Proconve tinha que mudar para a fase P8 [equivalente ao Euro 6].

Ou seja, já vai estar mais de dez anos atrasado. A mudança seria em 2023 para veículos pesados e em 2022 para veículos leves.

Por conta da pandemia, a indústria automobilística não quer cumprir a determinação de mudança de fase.

Qual a dificuldade das montadoras para se adequarem ao Proconve P8?

Eles alegam que a pandemia atrasou a mudança. Mas essas indústrias automobilísticas produzem os mesmos veículos que são usados na Europa e Estados Unidos. Inclusive as fábricas brasileiras produzem para exportar, mas não querem usar aqui.

Porque eles têm muitos veículos para serem vendidos, ou desovados, dessa tecnologia mais antiga.

Qual o impacto dessa postergação?

A gente tem um estudo que calcula os ganhos em saúde com a mudança de fase (.pdf). Se atrasar [o início do P8] em mais três anos, a gente vai ter 10 mil mortes por conta disso.

O que muda com a nova fase do Proconve

Regulamentação:

Data de implementação:

  • P7: Desde 1º de janeiro de 2012
  • P8: A partir de 1° de janeiro de 2022, para as homologações de novos modelos de veículos; e a partir de 1º de janeiro de 2023, para os demais veículos novos

Escopo de veículos:

  • P7: Veículos automotores pesados novos rodoviários do ciclo Diesel, nacionais e importados
  • P8: Veículos automotores pesados novos rodoviários, nacionais e importados

Melhoria da qualidade do ar e limites de emissão:

  • P7: NOx, HC, CO, CH4, MP, NMHC, opacidade e NH3
  • P8: NOx, HC, CO, CH4, MP, NMHC, opacidade, NH3 e número de partículas (NP); além de ruído

fase P8 prevê ainda a aplicação de fatores multiplicativos de deterioração da emissão e exigência da medição da emissão de poluentes, em tráfego real, no ato da homologação.

Fonte: CNT

Curtas

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) prometeu zerar de forma permanente a tributação federal sobre o óleo diesel, após enviar ao Congresso Nacional a medida provisória com a proposta de subsídio para os meses de março e abril…

…Se vingar, o subsídio permanente poderá ultrapassar R$ 20 bilhões por ano. Para atender à Lei de Responsabilidade Fiscal, instituições financeiras, a indústria química e pessoas com deficiência vão pagar a conta do subsídio. epbr

O B13 entrou em vigor oficialmente nesta segunda (1º). Todo o diesel comercializado no Brasil passa a ter o percentual mínimo obrigatório de 13% do biocombustível. A política começou em 2008, com 2%. Para atender à nova mistura, o leilão mais recente negociou R$ 6,8 bilhões por 1,3 bilhão de litros de biodiesel, a R$ 4,708 – deságio médio de 21%. ANP

A adição obrigatória de biodiesel ao diesel e etanol anidro à gasolina evita centenas de mortes por ano na região metropolitana de São Paulo por meio da redução da emissão de particulados. Estudo publicado pela Empresa de Pesquisa Energética (.pdf) indica que as políticas de biocombustíveis possuem impacto positivo “significativo” na saúde humana. Reuters/Época

CIDE-Carbono. A deputada Rosana Valle (PSB/SP) protocolou na última sexta-feira (26/2) projeto de lei que cria a Política Nacional de Incentivo às Fontes Limpas e Renováveis de Geração de Energia Elétrica (PFREE) e prevê a transição da CIDE-Combustíveis para CIDE-Carbono…

…A ideia é usar o imposto regulatório do setor de combustíveis como ferramenta de desestímulo ao consumo de derivados de petróleo. epbr

Biocombustíveis avançados. Produtores de biocombustíveis estão se mobilizando para colocar em pauta um marco legal para inserção dos chamados biocombustíveis avançados no mercado brasileiro. Na semana passada, o governo definiu o grupo de trabalho liderado pelo MME que será responsável pela proposta de inserção do diesel verde no mercado. epbr

Precificação de carbono. O API (American Petroleum Institute), uma das mais poderosas associações comerciais dos EUA, defende a precificação das emissões de carbono. Divulgado pelo The Wall Street Journal, rascunho de uma declaração da associação explica que a ideia é criar uma política que “levaria aos caminhos mais econômicos para alcançar as metas do Acordo de Paris”. Poder360

Meio ambiente no Acordo Mercosul-UE. O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, afirmou nesta terça-feira que o Brasil e seus sócios do Mercosul estão dispostos a incluir uma declaração anexa sobre meio ambiente no acordo de livre comércio com a União Europeia (UE)…

…Objetivo é facilitar a assinatura do acordo por países europeus, que têm colocado restrições à ratificação diante da alta no desmatamento da Amazônia. Valor

A EDP lançou esta semana a 5ª edição do programa Free Electrons. Startups do setor de energia podem se inscrever até 29 de março no programa que irá conectá-las a líderes das maiores utilities do mundo. Desde a primeira edição, já foram investidos mais de 100 milhões de dólares em pilotos e negócios com startups do Free Electrons.

[sc name=”news-transicao” ]