Mais de 40 países assumiram novos compromissos hoje (4) para eliminar a energia a carvão, incluindo Canadá, Chile, Cingapura, Coréia do Sul, Egito, Espanha, Nepal, Polônia, Vietnã e Ucrânia.
Dedicado ao tema energia, o quinto dia da Conferência do Clima em Glasgow foi marcado também pelo compromisso dos principais bancos internacionais de encerrar efetivamente todo o financiamento público internacional de novas usinas de carvão até o final de 2021. Veja o comunicado na íntegra
Brasil, Estados Unidos, Austrália, China e Índia não assinam o acordo, e o plano fica aquém da ambição inicial da presidência da COP26, analisa a Bloomberg.
Sob o pacto, as nações pretendem interromper o uso da geração de energia a carvão nas décadas de 2030 e 2040 e concordaram em encerrar os investimentos no setor tanto no mercado interno quanto no exterior.
Uma transição justa para a energia limpa e a rápida eliminação do carvão é um ponto importante das negociações da COP26 — mas o prazo até 2040 parece insuficiente.
Por outro lado, a demanda pelo fóssil ainda está aquecida, o que exige respostas efetivas para eliminar a fonte de energia e apresentar alternativas limpas e a preços competitivos.
Em 2021, a projeção é que o carvão sozinho avance 60% a mais do que todas as energias renováveis combinadas, sustentando um aumento nas emissões de quase 5%, ou 1,5 bilhão de toneladas de CO2, alertou a Agência Internacional de Energia (IEA, sigla em inglês) em abril.
Além disso, o conceito de transição justa — “não deixar ninguém para trás” — diz respeito também a encontrar soluções para as pessoas que vivem do carvão.
“Precisamos oferecer alternativas. Sem alternativa econômica, a simples contestação não será politicamente sustentável”, comenta Eduardo Leite, governador do Rio Grande do Sul, estado que concentra 88% das reservas de carvão mineral do Brasil.
O estado estuda como fazer uma transição energética justa para o carvão. Recentemente, teve o projeto de uma mina barrada, por falta de documentos que conseguissem comprovar a sustentabilidade do projeto.
“O caso da Mina Guaíba está arquivado administrativamente, inclusive por demandas do órgão ambiental. De outro lado, o governo está trabalhando na lógica de projetos para alternativas econômicas para as regiões mais dependentes do carvão no RS”, explica Eduardo.
O governador participou de debate sobre carvão e desafios da transição justa no Sul do Brasil promovido pelo Brazil Climate Action Hub, espaço da sociedade civil na COP26.
“Estamos buscando com as organizações envolvidas com o tema construir planos que viabilizem no mais curto prazo possível — não sei se 2030 é possível –, mas em uma meta ambiciosa e ao mesmo tempo realística de encurtar o prazo de funcionamento oferecendo alternativas econômicas”.
Além de subsídios, Eduardo defende a atração de novos investimentos, capazes de absorver mão de obra e gerar riqueza e novas oportunidades. “É um custo que precisa ser suportado pela sociedade e pelo setor privado”.
A trajetória ainda é “incipiente”, mas a proposta é que seja feita uma política de Estado, que atravesse governos e dê continuidade aos descomissionamentos de termelétricas a carvão, ao mesmo tempo em que alavanca investimentos em alternativas mais sustentáveis para geração de energia.
A grande aposta é o hidrogênio.
“Um dos projetos que mais estamos tratando aqui na COP é a possibilidade de geração de hidrogênio verde no Rio Grande do Sul a partir do que nós temos de capacidade instalada de energia eólica, estrutura portuária”, diz Eduardo.
A ambição do governador é ir além da exportação — tendência nos projetos de H2V anunciados até agora no Brasil — e buscar sustentação também no mercado interno, com a indústria de fertilizantes, por exemplo.
“Isso tem uma relação inclusive com regiões afetadas por descomissionamento de termelétricas a carvão”.
Sobre o acordo assinado nesta quinta
Em uma nova Declaração de Transição do Carvão Global para Energia Limpa, as duas dezenas de países também se comprometeram a aumentar a energia limpa e a garantir uma transição justa do carvão.
As nações desenvolvidas prometeram novo apoio para ajudar os países em desenvolvimento a fazer a transição para a energia limpa.
Enquanto, bancos e instituições financeiras, incluindo grandes credores internacionais como HSBC, Fidelity International e Ethos, afirmaram que vão interromper o financiamento para carvão.
Mais:
- 28 novos membros se inscreveram na maior aliança do mundo para a eliminação progressiva do carvão. The Powering Past Coal Alliance, lançada e co-presidida pelo Reino Unido e Canadá. Os novos membros incluem Chile e Cingapura. Aliança tem mais de 160 países membros, além de governos subnacionais e empresas.
- 20 novos países, incluindo Vietnã, Marrocos e Polônia se comprometeram a não construir novas usinas a carvão, combinando anúncios semelhantes no ano passado pelo Paquistão, Malásia e Filipinas, e agregando ao No New Coal Power Compact lançado em setembro pelo Sri Lanka, Chile, Montenegro e parceiros europeus.
- Índia, Indonésia, Filipinas e África do Sul anunciaram parcerias com os Fundos de Investimento do Clima para acelerar suas transições para longe da energia do carvão, apoiadas por fundo dedicado de US$ 2 bilhões.
- Indonésia e as Filipinas anunciaram parcerias pioneiras com o Banco Asiático de Desenvolvimento para apoiar a aposentadoria antecipada de usinas de carvão.
Os acordos seguem anúncios recentes da China, Japão e Coréia do Sul para encerrar financiamento do mineral no exterior — um corte significativo de recursos internacionais de origem pública para este tipo de energia.
Em junho, o G7 também já havia se comprometido com fim de subsídios para carvão ainda este ano. O G20 também já concordou em interromper o financiamento de projetos de carvão no exterior.
Em 2020, as nações do G20 contribuíram com quase US$ 600 bilhões para projetos de petróleo, gás e carvão, de acordo com estimativas da BloombergNEF.
Os ativistas esperam usar a declaração conjunta para ajudar a pressionar financiadores e países que não assinaram a promessa e ainda estão dedicando dezenas de bilhões a projetos fósseis estrangeiros anualmente.
Aposta arriscada
O think tank Carbon Tracker lançou nesta quinta o Levantamento de Riscos de Carvão, mostrando que os mercados financeiros mundiais estão expostos a US$ 121 bilhões de risco de encalhe, se o mundo tomar medidas para atingir as metas de temperatura estabelecidas no Acordo de Paris — a exemplo dos compromissos assumidos hoje na COP26.
O relatório avisa investidores que as empresas listadas que ainda planejam construir uma nova capacidade de carvão estão fazendo “uma aposta muito arriscada”.
“A competição crescente com as energias renováveis de baixo custo e o preço do carbono significa que é improvável que elas gerem retorno ao longo de sua vida útil e os compromissos líquidos de zero dos países podem levar a fechamentos antecipados”, explica.
Os riscos segundo o Carbon Tracker:
- 90% do risco de encalhe está concentrado nas bolsas de valores asiáticas, com as listagens na bolsa de Mumbai respondendo por US$ 59 bilhões de risco de encalhe.
- As dez maiores empresas respondem por US$ 65 bilhões do risco de encalhe listado (54% do total).
- A NTPC na Índia é a única empresa mais exposta a um potencial encalhe de ativos, com US$ 19 bilhões.
- US$ 68 bilhões do risco de encalhe total listado corresponde a empresas em índices de referência primários, investidores passivos e ativos podem, portanto, ter exposição indesejada ao carvão.
- As empresas listadas enfrentam um adicional de US$ 49 bilhões em encalhe em potencial de novos projetos de carvão.