Biocombustíveis

Compliance da Vibra apura relação comercial com BBF

Atividades da maior produtora de óleo de palma da América Latina estão cercadas de denúncias de violações de direitos humanos e territoriais na Amazônia

Vibra Energia fecha parceria com BBF para vender SAF a partir de 2025. Na imagem: Equipe de trabalho no lançamento do projeto de SAF de óleo de palma da BBF, em Roraima, em abril de 2022 (Foto: Camila Batista/Divulgação)
Lançamento do projeto de SAF de óleo de palma da BBF em Roraima, abril de 2022 (Foto: Camila Batista/Divulgação)

BRASÍLIA — Após denúncias contra violações de direitos humanos e territoriais cometidos pela Brasil Biofuels (BBF) no Pará, a Vibra Energia levou a questão ao seu compliance para “determinar as próximas decisões seguindo a política de gestão de riscos da companhia”.

A Vibra tem contratos de aquisição exclusivos do diesel verde e combustível sustentável de aviação (SAF, na sigla em inglês) que serão produzidos pela BBF na Zona Franca de Manaus, usando óleo de palma de instalações em Roraima.

Com investimentos estimados em R$ 2 bilhões, a BBF anunciou planos para inaugurar a biorrefinaria no primeiro trimestre de 2025. 

As atividades da maior produtora de óleo de palma da América Latina, no entanto, estão cercadas de denúncias de violações de direitos humanos e territoriais na região amazônica.

No final de abril, o Ministério Público do Pará (MPPA) confirmou que acusou e pediu a prisão preventiva de Eduardo Schimmelpfeng, acionista da BBF, e do supervisor de segurança da empresa, Walter R. Ferrari, por crimes de tortura, roubo e dano contra a comunidade do Vale do Bucaia, no município do Acará, no nordeste do estado.

A denúncia, assinada pelo promotor Emério Mendes da Costa, relata que um “grupo com características paramilitares” atua reprimindo comunitários que vivem em terras reivindicadas pela BBF. 

No documento, o promotor aponta, ainda, que “houve indícios de tentativa indevida de influência junto aos órgãos de segurança”. 

O caso é relatado pela agência de jornalismo independente e investigativo Amazônia Real.

E coloca uma sombra sobre a futura produção de diesel verde e SAF e a reputação brasileira no cenário internacional para fornecimento desses biocombustíveis.

Recentemente, a União Europeia lançou restrições ao consumo, no bloco, desses produtos derivados de óleo de palma e soja, justamente pelo histórico de disputa por terras, desmatamento e conflitos com as populações locais.

Questionada sobre a relação comercial com a BBF, a Vibra afirma, em nota, que tem uma “política rigorosa quanto à violação de direitos humanos” e que faz diligência prévia de todos os parceiros.

Segundo a distribuidora, seus contratos têm cláusulas que versam sobre “respeito aos direitos humanos, vedação ao trabalho infantil e análogo ao escravo, combate à discriminação e promoção da diversidade e outras que preveem cessação da relação comercial com fornecedores, clientes e parceiros que sejam flagrados em ações que violem os direitos humanos”. Leia a nota completa no final

Já BBF diz repudiar “calúnias envolvendo seus executivos”.

“Trata-se de uma narrativa fantasiosa, baseada em informações falsas relatadas por uma ex-funcionária e seu parceiro, também ex-funcionário, demitidos devido a condutas antiéticas e que buscam afetar a reputação e imagem da empresa”, diz em nota [leia a íntegra ao final da matéria]. 

Ainda segundo a produtora de óleo, os dois ex-funcionários vêm respondendo judicialmente pelos atos praticados contra a companhia. “O Grupo BBF aguarda o desfecho jurídico dos casos, permanece à disposição das autoridades para rápida solução e segue confiante em relação a todas as suas práticas sustentáveis no estado”.

Vibra é cliente âncora da biorrefinaria

A partir de 2025, a BBF espera colocar no mercado 500 milhões de litros de biocombustíveis de óleo de palma por ano. O comprador será a Vibra Energia, que fechou, em abril do ano passado, um contrato de comercialização exclusiva de SAF

O acordo é válido por cinco anos e se soma ao contrato já assinado entre as partes para compra e venda do diesel verde HVO (sigla, em inglês, para hidrotratamento de óleo vegetal).

A primeira biorrefinaria brasileira ainda nem começou a operar, mas sua produção corre o risco de vir marcada por conflitos com populações indígenas e quilombolas.

Embora a denúncia mais recente tenha vindo à tona nos últimos dias, o histórico de conflitos no Pará é longo.

De acordo com a Amazônia Real, quando a BBF adquiriu, em 2020, a planta industrial e os vastos campos de dendê da então Biopalma, empresa do grupo Vale, herdou os conflitos existentes com as comunidades pela sobreposição dos dendezais aos territórios indígenas e quilombolas e os litígios na Justiça.

A ONG Repórter Brasil conta que no final de 2021, indígenas relataram que foram xingados e espancados por funcionários ligados à BBF e quilombolas afirmam ter casas queimadas em seus territórios.

“As ações não se restringem a agressões físicas. Duas grandes valas foram abertas na estrada que liga a terra indígena e a reserva indígena Turé Mariquita II – área de 587 hectares criada em 1996 – ao quilombo Alto Acará Amarqualta, impedindo a circulação de mais de 700 famílias. As lideranças acreditam que a empresa está por trás da violência e denunciam o uso de milícias”, descreve a reportagem. 

No final do ano passado, após a divulgação, pela ONG Global Witness, de vídeo e depoimentos de uma comunidade indígena no Pará mostrando a intensificação das tentativas violentas da BBF de despejar à força a comunidade de terras em disputa, marcas internacionais decidiram suspender contratos.

A Cargill disse à Global Witness que suspendia as compras da BBF, enquanto Kellogg, Hershey’s e outras marcas internacionais confirmaram que, como fornecem diretamente da Cargill, também não estão comprando óleo de palma BBF. 

Biocombustíveis mais baratos do mundo

Durante o lançamento da biorrefinaria em abril do ano passado, o CEO da BBF, Milton Steagall, disse que a ambição da companhia é entregar o “diesel verde e o SAF mais baratos do Brasil, talvez do mundo”.

A empresa aposta na produção verticalizada. Ao contrário de outros projetos de HVO e SAF no mundo, a BBF pretende ser responsável por toda a cadeia produtiva dos biocombustíveis, desde o cultivo da matéria-prima até o refino do óleo vegetal.

Ainda segundo as declarações dadas na época, a produtividade do óleo da palma — um hectare de palma produz dez vezes mais óleo que a soja — e o menor custo das terras em Roraima tornam o diesel verde SAF mais atrativos a médio prazo, até mesmo em relação ao fósseis.

Nota da Vibra

“A Vibra esclarece que tem apenas um contrato cujo objeto é a aquisição de HVO e SAF a serem produzidos na Zona Franca de Manaus com matéria prima produzida em Roraima. A companhia tem uma política rigorosa quanto à violação de direitos humanos e para todos os parceiros fazemos due diligence.

Realizamos uma avaliação de integridade dos fornecedores que inclui aspectos de respeito aos direitos humanos e cumprimento de obrigações trabalhistas. 

Temos cláusulas contratuais que versam sobre respeito aos direitos humanos, vedação ao trabalho infantil e análogo ao escravo, combate à discriminação e promoção da diversidade e outras que preveem cessação da relação comercial com fornecedores, clientes e parceiros que sejam flagrados em ações que violem os direitos humanos.

Nosso Código de Conduta Ética dedica um capítulo específico sobre o tema “Respeito às pessoas” e estabelece como compromisso a promoção da diversidade e a equidade em nossos times, parceiros e fornecedores.

Tendo em vista as notícias divulgadas prosseguiremos apurando os fatos e em havendo uma constatação de que torne crítica a relação contratual, o compliance vai determinar as próximas decisões seguindo a política de gestão de riscos da companhia”.

Nota da BBF

O Grupo BBF (Brasil BioFuels) nega a existência da situação narrada e repudia as calúnias envolvendo seus executivos. Trata-se de uma narrativa fantasiosa, baseada em informações falsas relatadas por uma ex-funcionária e seu parceiro, também ex-funcionário, demitidos devido a condutas antiéticas e que buscam afetar a reputação e imagem da empresa.

O objetivo de ambos, como relatado por diversas vezes, é extorquir a empresa em busca de um acordo financeiro de alto valor e, sem sucesso, utilizam de métodos para difamar injustamente a empresa.

Vale destacar os dois ex-funcionários vêm respondendo judicialmente pelos atos praticados contra a companhia. O Grupo BBF aguarda o desfecho jurídico dos casos, permanece à disposição das autoridades para rápida solução e segue confiante em relação a todas as suas práticas sustentáveis no Estado.

A Companhia destaca ainda que possui relação construtiva e de parceria com a Comunidade da Bucaia, localizada no município do Acará, onde a empresa gera mais de mil empregos diretos. Dentre as benfeitorias realizada pelo Grupo BBF à Comunidade, destaca-se a recente doação de material para construção do Posto de Saúde, uma necessidade urgente e prontamente atendida pelo Grupo BBF em parceria com a prefeitura.

Os materiais doados foram entregues em solenidade realizada no dia 05 de março e contou com a presença de autoridades e membros da comunidade, sendo um tema amplamente divulgado pelos principais veículos de imprensa do Estado.

A obra está sendo realizada em parceria com a prefeitura municipal, responsável pela construção do posto de saúde e sua operação, e atenderá mais de 300 famílias que residem na comunidade.

O texto foi atualizado com a posição da BBF. Inicialmente, por um erro no contato feito pela epbr, não constava a posição da empresa. O erro foi corrigido e o espaço segue aberto.