Dois temas intrigantes, interessantes, presentes em diversos debates da atualidade são o metaverso e a transição energética. Embora aparentem ser assuntos absolutamente desconectados, o processo de transformação por trás deles guarda semelhanças entre si. A sociedade experimenta mudanças nas interações sociais e no uso da energia, com desafios pertinentes a cada um dos temas, mas com pontos em comum no movimento em curso. O virtual está se sobrepondo ao real.
O metaverso
Videochamadas através de um dispositivo móvel de pequeno porte era algo que estava, na melhor hipótese, apenas no imaginário das pessoas na década de 1990. Hoje, é algo corriqueiro. O avanço tecnológico tem sido incrível e promete uma mistura do mundo real com o virtual a nível tal que será difícil dissociar um do outro. É que o se espera do metaverso.
O que é o metaverso? É o termo usado para caracterizar um ambiente digital 3D que simula espaços físicos, replica pessoas e ações do mundo real, sendo um espaço virtual compartilhado, constituído pela soma de “realidade virtual”, “realidade aumentada” e “Internet”.
É um conceito que fará com que a comunicação, o lazer e os negócios ocorram de maneira imersiva, misturando o mundo virtual ao físico. Embora seja uma ideia já difundida para jogos on-line, a concepção vai muito além do ambiente dos gamers.
De modo geral, a realidade virtual envolve a imersão do indivíduo no ambiente digital, como ocorre nos jogos virtuais, por exemplo. Já a realidade aumentada permite sobrepor elementos virtuais à nossa visão da realidade, pelo uso de dispositivos e acessórios. Os hologramas são talvez o exemplo mais conhecido desta categoria. Quando se une tudo isso com internet ultrarrápida, de baixa latência, e dados descentralizados “em nuvem”, tem-se o metaverso.
A imaginação é o limite daquilo que pode ser feito no metaverso. As primeiras amostras contam com espaços de trabalho virtuais, com avatares, manipulação de elementos gráficos, interatividade, entre outros recursos.
O crescimento das interações sociais nos ambientes virtuais imersivos abre a perspectiva de que muitos serviços possam ser oferecidos nestes ambientes, sendo possível até comprar produtos dentro deles.
Diversas empresas estão se posicionando para se fazer presente no metaverso, com perspectivas de vendas de acessórios digitais para avatares, imóveis em terrenos virtuais, bens de consumo e itens de decoração que deixarão o mundo virtual muito próximo do real.
A priori, qualquer produto comprado no mundo físico poderá também ser adquirido no metaverso. A vida das pessoas terá uma extensão digital 3D, interconectada, que irá revolucionar as redes sociais. Tudo isso, porém, ainda é embrionário.
O metaverso e a transição energética
Há uma série de investimentos necessários para que o metaverso possa atingir todo o potencial vislumbrado. A internet precisa ser muito mais rápida e segura do que é hoje. Novos protocolos precisam ser criados. É necessário aumentar a capacidade de armazenamento e transferência de dados.
Soluções descentralizadas serão primordiais para que a rede consiga suportar tamanho tráfego de informações. O ambiente físico real precisa ser ampliado para dar suporte ao virtual. Este processo será contínuo, não disruptivo. À medida que a tecnologia avança e se torna mais barata, o metaverso e suas possibilidades se expandem.
O mesmo ocorre na transição energética. A ideia de um mundo livre de carbono se virtualizou nos debates, no noticiário e nas metas até 2050. Por enquanto, é apenas um metaverso energético.
O investimento necessário para ofertar energia limpa em substituição aos fósseis é gigantesco. Os hábitos coletivos precisam mudar. A eletrificação das frotas de automóveis exigirá robustas redes elétricas, geração distribuída, capacidade de armazenamento de energia para compensar os efeitos da intermitência das fontes renováveis, infraestrutura de recarga, etc. As tecnologias para tal existem, mas requerem avanços, ajustes e preços acessíveis.
No ambiente energético, o carvão é hoje o “telefone convencional”, é a base do sistema, a fonte “analógica”, que está sendo substituída gradativamente por novas fontes de energia mais limpas, conforme a disponibilidade desses outros energéticos no mercado aumenta. Ninguém abandonou o telefone residencial até que os celulares tivessem se expandido em rede, qualidade, confiabilidade e preço. O carvão, bem como o telefone convencional, está fadado ao desaparecimento, ao seu tempo.
O senso de urgência na transição energética faz total sentido diante dos distúrbios climáticos que já se vive, que podem ser ampliados no decorrer das próximas décadas, mas o mundo parece viver o “virtual” mais do que o “real”.
Não se pode banir o investimento em energia fóssil antes que a oferta de energia limpa esteja disponível em quantidade, qualidade e preço. Isso seria o equivalente a querer acabar com a atual infraestrutura de internet e telefonia antes que a tecnologia seguinte tenha se expandido. É querer viver no metaverso antes de a rede estar pronta para isso.
É preciso retirar os óculos de realidade virtual, planejar a expansão do sistema, executar as metas impostas (metas plausíveis) para, aí sim, viver um mundo novo, cheio de incríveis possibilidades.
Fora do pragmatismo e do mundo real, há um universo paralelo virtual impossível de se viver. O metaverso é ainda apenas uma ideia. O carbono zero também. “Mãe, faltou luz? E agora, o que eu faço sem o meu avatar?”.