Nos últimos anos, a pauta da transição energética ganhou corpo nas discussões globais e, agora, com a COP30 se aproximando, essa agenda finalmente começa a incluir um elemento até então pouco debatido: a igualdade social.
Afinal, de que adianta falarmos de descarbonização se não enfrentarmos, simultaneamente, os desequilíbrios socioeconômicos que ainda assolam o Brasil e tantos outros países em desenvolvimento?
A boa notícia é que soluções reais, viáveis e escaláveis já existem e o biodiesel é uma delas. Ao contrário de outras inovações que demandam investimentos massivos e ainda enfrentam barreiras de escala, o biodiesel já é uma realidade consolidada no país.
Mais do que uma fonte de energia renovável, ele é um instrumento concreto de transformação social, capaz de gerar emprego, estimular a agricultura familiar, impulsionar economias locais e promover inclusão produtiva em territórios historicamente negligenciados.
Desde 2006, o Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel (PNPB) instituiu o Selo Biocombustível Social, reconhecendo e valorizando empresas que fomentam a agricultura familiar.
Dados da FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura) mostram que a agricultura familiar é responsável por cerca de 80% dos alimentos consumidos globalmente. No Brasil, 5% do PIB vem dessas propriedades, sendo que 40% da produção é liderada por mulheres.
O apoio a esses agricultores é uma questão de inclusão, igualdade e desenvolvimento. Com base nessa política, mais de 25 mil famílias de pequenos produtores são hoje beneficiadas por parcerias com a Binatural, empresa que tenho a honra de liderar.
Esses agricultores cultivam soja, mamona, açaí, castanhas e outros insumos que ajudam a movimentar a economia no campo.
Esse modelo gera impactos reais: renda, segurança alimentar, sucessão rural, qualificação técnica e autonomia, especialmente para mulheres.
Em Valença, no Baixo Sul da Bahia, a Cooperativa Feminina da Agricultura Familiar e Economia Solidária (Coomafes), apoiada pela Binatural, reúne mais de 100 mulheres que comercializam seus produtos com independência financeira, rompendo ciclos históricos de invisibilidade e exclusão.
Mas os benefícios não param aí. Em regiões como o Cerrado, a combinação entre biocombustíveis, reaproveitamento de resíduos e regeneração de áreas degradadas pode abrir novos caminhos.
Estudo do Fórum Econômico Mundial mostra que a produção sustentável no Cerrado pode agregar até R$ 412 bilhões ao PIB brasileiro, por ano, até 2030, sendo R$ 108 bilhões vindos da bioenergia. Na prática, isso significa empregos, investimentos e inovação — com inclusão.
Em meio a tantos avanços, é fundamental também enfrentar um dos mitos mais recorrentes e infundados sobre os biocombustíveis: o de que eles competem com a produção de alimentos. Essa narrativa, além de simplista, não encontra respaldo nos dados.
Segundo levantamento da Embrapa, apenas 4% das oleaginosas produzidas globalmente são destinadas à produção de biodiesel. Em contrapartida, 68% vão para alimentação animal e 23% para consumo humano direto.
Ou seja: a maior parte da produção de grãos não alimenta pessoas, mas sim cadeias produtivas indiretas — e o uso energético tem um peso muito menor do que se costuma imaginar.
Além disso, o fortalecimento da agricultura familiar, contribui justamente para o oposto do que sugere esse mito: mais inclusão social, respeito aos biomas e práticas agrícolas regenerativas.
A crítica de que o biodiesel ameaça a segurança alimentar desconsidera também que, no Brasil, grande parte das matérias-primas utilizadas (como gorduras animais e óleo de cozinha usado) são cultivadas ou reaproveitadas justamente por pequenos produtores, em sistemas agroecológicos, de policultura ou de rotação, que combinam produção de energia com alimentos, respeitando ciclos naturais e fortalecendo a biodiversidade.
O biodiesel, portanto, não exclui — ele soma: à renda, à inclusão, à diversidade produtiva e à segurança alimentar.
É justamente esse o papel do setor de biodiesel que queremos defender na COP30: o de uma energia verde e justa, que respeita o meio ambiente e valoriza quem vive e trabalha nos territórios. Nossa missão, como empresa, é criar um modelo de desenvolvimento que seja regenerativo, plural e democrático.
Com a produção de 2,4 bilhões de litros de biodiesel, evitamos, desde 2006 até hoje, a emissão de 7,48 milhões de toneladas de CO2, o equivalente ao plantio de mais de 52 milhões de árvores.
Mas talvez o dado mais importante esteja fora dos gráficos ambientais: são os milhares de brasileiros e brasileiras que, por meio do trabalho digno, estão construindo uma transição energética que começa onde tudo começa — no campo.
A COP30 será, sem dúvida, uma vitrine global. Contudo, mais do que palco, ela precisa ser um compromisso com o que de fato transforma realidades. E o Brasil, com sua vocação agroenergética, tem a oportunidade única de mostrar ao mundo que é possível fazer diferente e melhor.
André Lavor é CEO e cofundador da Binatural. Ele é Administrador de Empresas com especialização na Columbia University, Stanford University, FGV e Fundação Dom Cabral. Possui um histórico comprovado de 25 anos liderando empresas de agronegócio e energia no país, sendo considerado um dos mais jovens empresários e empreendedores nesta área de atuação.
Liderou projetos ousados, apoiando a indústria brasileira de biodiesel em seus estágios iniciais, desenvolvendo ações de preservação do meio ambiente e fortalecimento da Agricultura Familiar em nosso país, apoiando a transformação da matriz energética brasileira.