RIO — A produção de etanol no Brasil deve crescer de forma significativa até 2035, puxada sobretudo pela expansão acelerada do etanol de milho, segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE).
A estatal do planejamento energético estima que o etanol de milho pode representar até 42% da oferta nacional do biocombustível em 2035.
O estudo recém-lançado pela EPE (na íntegra, em .pdf) traçou cenários de oferta e demanda de etanol entre 2026 e 2035, considerando três trajetórias distintas de crescimento — alto, médio e baixo — a partir do uso de cana-de-açúcar e do milho como matérias-primas.
A oferta total de etanol pode variar entre 44,8 bilhões e 58,8 bilhões de litros em 2035, a depender do ambiente econômico, do ritmo de investimentos no setor sucroenergético e do fortalecimento das políticas públicas de incentivo aos biocombustíveis.
Em todos os cenários, o etanol se consolida como peça-chave da transição energética brasileira.
“O Brasil se destaca na inserção dos biocombustíveis na sua matriz energética e mantém potencial para ampliar essa participação, apoiado por políticas públicas estruturantes, como RenovaBio e a Lei do Combustível do Futuro”, cita o estudo.
Segundo a EPE, compromissos internacionais assumidos pelo país, como os anúncios feitos no contexto da COP30, em Belém, de quadruplicar a produção de combustíveis sustentáveis, incluindo o etanol, reforçam essa trajetória de longo prazo.
Milho ganha protagonismo
O avanço do etanol de milho é um dos principais vetores do crescimento projetado. Em 2024, a produção a partir do cereal alcançou 7,6 bilhões de litros, cerca de 20% do total nacional.
Em 2025, a produção acumulada até novembro é da ordem de 9 bilhões de litros, o equivalente a 25% da produção total de etanol.
Até 2035, a participação do etanol de milho deve variar entre 33% e 42% da oferta total, “evidenciando sua relevância na matriz energética nacional”, destaca a EPE.
O crescimento é favorecido por características específicas do cultivo do milho, como a possibilidade de mais de uma safra por ano, majoritariamente em rotação com a soja, e o armazenamento do grão, que permite a operação das usinas ao longo de todo o ano.
Além disso, o etanol de milho se beneficia da geração de coprodutos, como o óleo de milho e o DDGS (grãos secos de destilaria com solúveis, na sigla em inglês), utilizado na nutrição animal.
A recente habilitação de plantas brasileiras para exportação de DDGS à China ampliou ainda mais o leque de receitas do setor.
Cana mais eficiente e novas rotas
No caso da cana-de-açúcar, o estudo aponta um processo de ajuste financeiro das usinas, impulsionado pela atratividade do açúcar no mercado internacional e por ganhos de eficiência no campo e na indústria.
O levantamento cita, entre os fatores positivos, a renovação de canaviais, a redução de custos de cultivo, o uso de irrigação, a produção de biogás e o avanço do etanol de segunda geração (E2G).
“O aumento projetado da oferta de etanol no Brasil na próxima década não implica, necessariamente, uma expansão proporcional da área agrícola”, ressalta o estudo.
Segundo a empresa, grande parte do crescimento deverá ocorrer por meio de técnicas poupa-terra, como ganhos de produtividade agrícola e industrial, expansão do milho de segunda safra e maior aproveitamento de resíduos agroindustriais.
Nesse contexto, a relação entre expansão da produção de etanol e uso da terra tende a se tornar cada vez mais dissociada.
“O milho segunda safra, cultivado majoritariamente após a colheita da soja em áreas já consolidadas, exemplifica um processo de intensificação agrícola sem expansão territorial”, aponta o estudo.
Bioeletricidade, biometano e emissões
Além do etanol combustível, a biomassa da cana tende a ganhar peso crescente no sistema energético. Mesmo na avaliação mais conservadora, a bioeletricidade pode injetar até 4,2 GW médios no sistema em 2035 no cenário de crescimento alto, e 3,8 GW médios no cenário de crescimento baixo.
A utilização de resíduos da cana, como vinhaça e torta de filtro, também abre espaço para a produção de biometano.
Para o horizonte até 2035, a EPE estima uma geração potencial entre 3 bilhões e 3,4 bilhões de m³, podendo variar conforme o perfil de eficiência e saúde financeira das usinas e a entrada de novos investimentos.
Do ponto de vista ambiental, os ganhos são expressivos. As emissões evitadas de gases de efeito estufa pelo uso dos produtos da cana podem variar, em 2035, entre 71,8 milhões e 80,5 milhões de toneladas de CO² equivalente, a depender do cenário de crescimento considerado.
Impactos no abastecimento e na gasolina
A EPE também avaliou os reflexos dos cenários de oferta de etanol sobre a demanda do ciclo Otto e o balanço nacional de gasolina A.
Considerando a produção de gasolina prevista no PDE 2035, o cenário de crescimento baixo exigiria importações ao longo de todo o horizonte de estudo, chegando a 3,5 bilhões de litros em 2035.
Nos cenários médio e alto, as importações ocorreriam apenas até 2028 e 2027, respectivamente.
Já em uma hipótese mais conservadora, com produção média de gasolina A de 26,3 bilhões de litros — média observada entre 2018 e 2022 —, não haveria necessidade de importação em nenhum dos três cenários analisados.
O estudo também analisou os efeitos do aumento do teor de etanol anidro na gasolina C, com a possibilidade de atingir 35%, além da maior destinação de ATR para a produção de açúcar.
