A publicação do Decreto nº 11.075, de 19 de maio de 2022, acendeu a polêmica sobre a “extinção” do RenovaBio. Quem acompanha o setor há mais tempo sabe que, periodicamente, determinados grupos trabalham esta ideia de fim do Programa e tentam usar qualquer fato novo para dar vida a esta tese.
O RenovaBio vai muito bem obrigado, ao contrário das previsões quase sempre catastróficas de que vai acabar. Em 2020, foram comercializados 14,89 milhões de CBIOs (os chamados créditos de descarbonização), tendo movimentado R$ 650 milhões.
Em 2021, mais um ano de sucesso, foram comercializados 29,8 milhões de CBIOs, movimentando R$ 1,17 bilhão.
Em 2022, a meta foi estabelecida em 36 milhões de CBIOs e já temos com os distribuidores (parte obrigada) 14,1 milhões de CBIOs; 2,8 milhões de CBIOs aposentados; e 118 mil CBIOs com a parte não obrigada.
O preço médio do CBIO está em R$ 90,45. Se mantiver esta média até o final do ano, o RenovaBio movimentará mais de R$ 3 bilhões este ano — sendo, de longe, o maior mercado do Brasil de créditos deste tipo.
Nesse sentido, o RenovaBio é um programa de Estado e sólido. Não há motivo para se sentir apreensivo com o Decreto que regula o mercado de carbono no Brasil.
- Mercado de carbono e RenovaBio: uma sinergia em construção? Um mercado nacional de carbono contribuiria tanto para alcançar economia de baixo carbono quanto para o RenovaBio, escrevem Aurélio Amaral e Erick Diniz
A Califórnia, que possui o Programa Low Carbon Fuel Standard (LCFS), uma das bases para o desenho do RenovaBio, também possui mercado de carbono, conhecido como Cap-and-Trade Program. O LCFS tem como função reduzir a intensidade de carbono da matriz de combustíveis e promover o aumento da disponibilidade de alternativas renováveis e de baixo carbono para reduzir a dependência do petróleo e alcançar os benefícios da qualidade do ar.
O Cap-and-Trade Program estabelece um limite decrescente para as principais fontes de emissões de gases de efeito estufa em toda a Califórnia e cria um poderoso incentivo econômico para investimentos significativos em tecnologias mais limpas e eficientes.
Dessa forma, na Califórnia, convivem de forma harmoniosa o LCFS e o Cap-and-Trade, possuindo objetivos complementares.
Nesse sentido, a pedido do MME, foi incluído o inciso VI, do parágrafo primeiro, do art. 8°, do Decreto n° 11.075, de 19 de maio de 2022.
Art. 8° (...) § 1º Ato conjunto dos Ministros de Estado do Meio Ambiente e da Economia estabelecerá as regras sobre: (...) VI - os critérios para compatibilização, quando viável técnica e economicamente, de outros ativos representativos de redução ou remoção de gases de efeito estufa com os créditos de carbono reconhecidos pelo Sinare, por proposição do órgão ou da entidade competente pelos referidos ativos.
Com esse inciso, os CBIOs só podem ser integrados ao Sistema Nacional de Redução de Emissões de Gases de Efeito Estufa — Sinare, a pedido do Ministério de Minas e Energia — que é responsável pelos referidos ativos.
Dessa forma, essa nova onda de cataclisma se juntará a outros sofismas que vivenciamos no passado recente como a de que todos os emissores de CBIOs seriam autuados pela questão da tributação; os cinco passos para acabar com o RenovaBio dos “inimigos” do Programa; e que a consulta pública sobre a Portaria MME 419/2019 mataria qualquer chance de desenvolvimento do mercado futuro de CBIOs e que se torne uma moeda ambiental.
Por fim, o mercado de carbono no Brasil é bom para o RenovaBio e vice-versa. Não há razão para não apoiar o desenvolvimento de ambos, pois estão na mesma direção, a de combater as mudanças climáticas.
Para aprofundar
- Perspectivas nacionais para o futuro mercado regulado de carbono Mudança de mentalidade na sociedade sobre as emissões é impulsionada por pressão mercadológica, mas deverá, em breve, ter força coercitiva
- Mercado de carbono: quais as obrigações legais e o cenário brasileiro?Mercado de carbono ainda é apenas uma iniciativa voluntária e mercadológica do setor privado, escrevem Luciana Gil Ferreira e Patrícia Mendanha Dias
Pietro Adamo Sampaio Mendes é secretário-adjunto de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis do Ministério de Minas e Energia (MME).
Este artigo expressa exclusivamente a posição do autor e não necessariamente da instituição para a qual trabalha ou está vinculado