Biocombustíveis

Governo Bolsonaro decide manter mistura de biodiesel reduzida até março de 2023

CNPE também autorizou o uso de diesel coprocessado da Petrobras para atender exigência ambiental

Governo Bolsonaro decide manter mistura de biodiesel reduzida até março de 2023. Na imagem: Adolfo Sachsida, ministro de Minas e Energia (Foto: Edu Andrade/Ascom ME)
Um dos braços direitos de Paulo Guedes, Adolfo Sachsida é conhecido por defender redução nos mandatos de etanol e biodiesel (Foto: Edu Andrade/Ascom ME)

BRASÍLIA — O Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) decidiu nesta segunda (21/11) manter o percentual de mistura obrigatória do biodiesel ao óleo diesel A em 10% até março do ano que vem, além de permitir a utilização de outros combustíveis — como o diesel verde e o diesel coprocessado com óleos vegetais da Petrobras — no mandato.

É mais um golpe para o setor de biodiesel, no apagar das luzes do governo de Jair Bolsonaro (PL), após dois anos de recuos na política que obriga a adição do renovável ao fóssil.

O setor estava confiante que, com a mudança de governo, o mandato poderia ser restabelecido em 14% em janeiro do ano que vem, subindo para 15% em março.

Logo após o resultado do segundo turno das eleições que deu vitória a Lula (PT), o atual ministro de Minas e Energia, Adolfo Sachsida, disse ao presidente da Frente Parlamentar do Biodiesel (FPBio), deputado Pedro Lupion (PP/PR), que discutiria uma posição sobre a mistura do biodiesel no diesel de 2023 com a equipe de transição.

O Ministério de Minas e Energia (MME) chegou a informar que a mistura obrigatória seria discutida na reunião ordinária do CNPE, marcada para 8 de dezembro, e que o assunto seria apresentado ao gabinete de transição para o governo Lula.

A deliberação desta segunda (21/11) foi tomada em reunião extraordinária e ganhou forma da semana passada para cá.

Segundo o MME, manter o B10 até março dá “maior previsibilidade e garantia do abastecimento” de combustíveis.

Próximos passos. As decisões do CNPE precisam ser referendadas pela Presidência da República. A inserção de novos combustíveis, por sua vez, depende de regulamentação própria pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).

Produtores de biodiesel falam em “traição”

Para a Ubrabio (associação da cadeia de biodiesel), a decisão de hoje é uma “intervenção deste governo no próximo” além de “uma traição”.

“O setor tinha esperança no bom senso do governo e acreditou na promessa do ministro Adolfo Sachsida, de que não iria interferir mais na mistura”, comenta Donizete Tokarski, CEO da Ubrabio.

Segundo o executivo, embora o governo tenha argumentado durante todo o ano de 2022 que a justificativa para que o percentual de biodiesel ficasse reduzido era o preço, essa questão não foi levada em conta na decisão do CNPE, uma vez que o renovável está competitivo com o diesel de petróleo.

Além disso, acusa o governo de desconsiderar atributos econômicos, sociais e ambientais do biocombustível, que vão além do preço na bomba.

“Não considerou a super safra de soja, o impacto para a agricultura familiar, a redução da poluição e das emissões de gases de efeito estufa”, critica Tokarski.

Na semana de 7 a 13 de novembro, o preço médio do biodiesel esteve em R$ 5,93. O diesel S10 (com menos enxofre) estava cotado a R$ 4,93 no mesmo período, de acordo com a ANP.

Já a safra de soja 2022/2023 — principal matéria-prima do biodiesel — é estimada em 150 milhões toneladas.

Hbio entra no mandato

De acordo com nota do Ministério de Minas e Energia (MME), a adição obrigatória de biodiesel ao óleo diesel comercializado ao consumidor final admite qualquer rota tecnológica de produção.

Isso significa uma autorização para que o diesel coprocessado com óleos vegetais da Petrobras (Hbio) possa concorrer com o biodiesel no mandato.

É uma disputa antiga. Petrobras e distribuidoras de combustíveis tentaram, via ANP, mudar a especificação do biodiesel para que diesel verde e hbio pudessem também ser considerados biodiesel.

“A medida robustece o suprimento de combustíveis, ampliando a possibilidade de aplicação das alternativas tecnológicas já existentes e a competitividade no setor, com potenciais ganhos de qualidade e preço para o consumidor”, diz o MME.

À época, a ANP seguiu referências científicas e internacionais e manteve a diferenciação entre os combustíveis.

O diesel verde é um combustível drop in, isto é, idêntico ao diesel de origem fóssil, com a vantagem de ser de origem renovável. O que permite que até 100% seja substituído, sem necessidade de adaptação nos motores. Porém, é mais caro que o biodiesel.

Já o biodiesel é semelhante ao diesel, e há limites quanto à substituição do fóssil sem necessidade de adaptações.

O Hbio é um diesel coprocessado com óleos vegetais na refinaria, de patente da Petrobras. Hoje, esse diesel tem 95% de conteúdo fóssil e 5% renovável, aproximadamente.

Os produtores também criticam a inserção do Hbio no mandato.

“Gera insegurança para o consumidor, porque não tem como conferir o percentual renovável. O Hbio não é um biocombustível”, afirma Tokarski.