A redução das emissões de carbono é uma necessidade que se impõe, para limitar as mudanças do clima.
Neste sentido, o Brasil tem compromissos assumidos no âmbito do Acordo de Paris. Ampliar a utilização dos biocombustíveis é um deles.
A forma de fomentar isso pode ser variada e, dependendo da escolha, a descarbonização pode ser maior ou menor.
Privilegiar uma rota tecnológica e adotar um modelo sem olhar para o ciclo de vida dos energético podem induzir a um efeito contrário ao desejado.
Mandados obrigatórios como política setorial
A adoção de mandatos obrigatórios de mistura de biocombustíveis com combustíveis fósseis é um caminho trilhado pelo Brasil por longa data.
As definições de misturas compulsórias adotadas até hoje não levam em consideração o “passeio molecular” dos biocombustíveis, além de criar reservas de mercado que vão de encontro aos compromissos que país tem a cumprir.
É preciso mirar na descarbonização, com apoio a um novo modelo de gestão das emissões e utilização de outras rotas tecnológicas em conjunto.
Nessa linha, no primeiro semestre de 2022, o Comitê ProbioQAV do Programa Combustível do Futuro deu um salto de maturidade nas discussões sobre descarbonização no Brasil.
A conclusão, ambientalmente eficiente, de que o importante para o mundo é a redução das emissões de gases do efeito estufa.
Para isso, é importante o incentivo a todos os combustíveis que possam contribuir para esse fim, com a adoção de certificações com padrões internacionais sobre as emissões em todo ciclo de vida do produto, que permitem a comprovação do atingimento das metas, e a implantação de mandatos por redução de emissões, mais efetivos que os mandatos volumétricos existentes.
Combustíveis para descarbonização na aviação civil
Com a forte participação da ICAO (Organização da Aviação Civil Internacional), IATA (Agência Internacional do transporte Aéreo), companhias aéreas, produtores de combustíveis e de biocombustíveis, além de Universidades e institutos de ciência e tecnologia, entre outros, foi discutido os riscos do modelo hoje vigente para o óleo diesel, que pode não atingir o objetivo de descarbonização.
Por exemplo, um biodiesel produzido no centro-oeste do país é transportado às regiões Norte e Nordeste para adição ao óleo diesel mineral no teor de 10 %, conforme mandato vigente.
O transporte desse biocombustível da região de produção até a região consumidora não é devidamente mensurado e a quantidade de CO2 emitido nesse transporte pode superar um eventual ganho em sua utilização.
Outra discussão relevante para a descarbonização é a possibilidade de variadas rotas tecnológicas competirem entre si.
A Iniciativa Mercado Minas e Energia (IMME) tem propostas importantes neste sentido, ressaltando a importância de incluir diversos produtos que contribuam para a descarbonização, como os biocombustíveis avançados (por exemplo, o HVO) e a parcela renovável do diesel obtido por coprocessamento de óleos vegetais e gorduras animais com o óleo diesel mineral.
Flexibilidade de rotas
Para acelerar a descarbonização, é necessário ainda incentivar as rotas não derivadas de biomassa, como os combustíveis sintéticos, obtidos a partir de hidrogênio de eletrólise e carbono capturado de processos industriais ou obtido a partir de resíduos sólidos urbanos, assim como os combustíveis minerais de menor intensidade de carbono.
Nesse sentido, o LCAF (Low Carbon Aviation Fuel), um combustível fóssil com menor pegada de carbono, já considerado no CORSIA (Carbon Offsetting and Reduction Scheme for International Aviation) da ICAO.
Todo esforço na direção da descarbonização deve ser fomentado.
Obrigações de descarbonização
A substituição gradativa dos mandatos volumétricos por mandatos de redução de emissões, via a avaliação das emissões do ciclo de vida dos combustíveis, segundo um mesmo esquema de certificação, é ponto essencial para a aceleração da descarbonização no Brasil.
A sua adoção para os combustíveis do ciclo diesel seria um primeiro passo e um grande legado ambiental para a sociedade brasileira, com impulso significativo para a economia de baixo carbono, sem a necessidade de se considerar reservas de mercado para setores específicos.
A redução das emissões de carbono é um grande desafio posto ao mundo. Avaliar o ciclo de vida dos produtos, adotar esquemas de certificação amplamente aceitos e fomentar múltiplas rotas tecnológicas, a exemplo do que se discutiu no Comitê ProBioQAV do Combustível do Futuro, são ações necessárias para uma transição com descarbonização eficaz, justa e competitiva.
Que as políticas públicas sejam norteadas por este senso. Vamos adiante!
Marcelo Gauto é Analista de Inteligência de Mercado da Petrobras
Ricardo Pinto é Consultor Sênior da Petrobras na área de Planejamento de Marketing e Inteligência de Mercado