BRASÍLIA — Os ensaios do Instituto Mauá de Tecnologia (.pdf) que atestaram a viabilidade técnica da mistura de 30% de etanol à gasolina levaram em conta critérios de dirigibilidade, desempenho e emissões.
Os testes foram feitos com 16 modelos de carros e 13 de motos, fabricados entre 1994 e 2024, com motores movidos exclusivamente a gasolina. Os modelos selecionados representaram uma amostra da frota circulante nas ruas.
O ensaio foi feito com as misturas de 27%, 30% e 32%, avaliando a partida à frio, estabilidade em marcha lenta, aceleração a frio, aceleração a quente e retomada de velocidade.
O teste avaliou veículos com as seguintes características:
- Motos de 100 a 600 cilindradas, carburadas e com injeção eletrônica;
- Carros com motores de 1.0 a 2.5, aspirados e turbo, com injeção eletrônica, monoponto, multiponto e direta e híbridos.
Uma das premissas do teste era de que não deveria ser feita manutenção nos veículos avaliados. Entretanto, um dos carros precisou passar por manutenção na bomba de combustível, que já estava com problemas sem relação com a mistura.
“É bom lembrar que esses veículos têm mais de 100 mil quilômetros, 150 mil quilômetros [rodados]. Então, a gente viu que o uso, o desgaste dessa bomba já estava limitando a sua função”, explicou Lorena Camargo, técnica do Instituto Mauá.
Nos ensaios de retomada, de 80km/h a 120km/h, veículos antigos com motores 1.0 apresentaram uma pequena diferença com a mudança da mistura, algo que não ocorreu nos testes de retomada em velocidades menores.
A aceleração de zero a 100km/h também oscilou, em alguns modelos, de 0,23 segundo mais devagar a 0,61 segundo mais rápido.
No caso das motos, também tiveram problemas com misturas superiores as carburadas, que geralmente já sofrem com partida a frio mesmo com a atual mistura. A conclusão, no entanto, é de que a dificuldade de partida em baixas temperaturas independe do teor de biocombustível.
Alguns modelos de motocicletas apresentaram resfriamento não uniforme de componentes, de modo que algumas peças ficaram mais frias do que outras. Este ponto também não teve relação com o combustível, conforme mostraram os resultados dos testes.
Nas motos, não houve nenhuma mudança de desempenho na aceleração até 100km/h. Apenas um modelo registrou 1,1 segundo a mais para percorrer o percurso estabelecido, mas houve registro de problema na embreagem, relacionado à idade do modelo.
Nos resultados, não foi divulgada a marca ou modelo de nenhum dos veículos usados no teste.
A seguir, a agência eixos apresenta os principais pontos da mudança na mistura de 27% para 30% da mistura de etanol à gasolina.
1) Variação em veículos antigos
Veículos mais rodados e com mais tempo de uso apresentaram variação no teste de retomada de velocidade, enquanto motos antigas demandaram a manipulação do afogador e do acelerador durante a partida.
O Instituto Mauá observou que carros e motos mais antigos tiveram comportamentos relacionados ao tempo de uso, quilometragem e tecnologias, e não ao combustível.
Na amostra analisada, não foram observadas diferenças no comportamento dos veículos que sejam justificadas pela alteração de combustível. Também não houve percepção de diferença na dirigibilidade pelo motorista, nem alteração relevante de emissões e consumo.
2) Autossuficiência da gasolina
A ampliação da mistura para 30% tornará o Brasil autossuficiente na produção de gasolina. Qualquer percentual acima disso, conforme cálculos do Ministério de Minas e Energia (MME), fará com que o país passe a ser exportador de gasolina.
Com o E30, haverá um aumento de 1,5 bilhão de litros de etanol por ano na demanda. A estimativa da pasta é que sejam demandados R$ 9 bilhões em investimentos para garantir a oferta do produto no novo percentual do mandato.
3) Emissões e preço
O MME projetou que o aumento do biocombustível na mistura com a gasolina deve retirar 1,7 milhão de toneladas de gases de efeito estufa por ano. Isso equivale a 720 mil veículos retirados das ruas.
Por ser um combustível mais barato do que a gasolina, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira (PSD), estimou que haja queda no preço nas bombas. Também citou que o país “vai se livrar das amarras do preço de paridade internacional” e que a gasolina terá preço de competitividade interna, em referência à política de preços da Petrobras.
4) Inflação de alimentos
O governo diz que estudará a implantação do E30 de modo que a mudança não impacte no aumento do preço dos alimentos. O argumento foi o mesmo utilizado para manter em 14% a mistura de biodiesel ao diesel, decidido pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) em fevereiro.
Embora pese o argumento da competição de insumos para biocombustíveis em detrimento da produção de alguns alimentos, governo e setor concordam que o setor de proteína animal pode se beneficiar da produção do etanol, em especial o de milho.
O processamento do milho para biocombustíveis resulta no etanol, óleo, farelo e DDG (sigla em inglês para “grãos secos de destilaria”). O DDG vem ganhando destaque como alternativa econômica para a alimentação animal, por ser rico em nutrientes, em especial proteínas.
5) Quando começa?
O MME não deu uma data, mas o ministro Alexandre Silveira garantiu que será ainda este ano. O aumento da mistura será feito de uma vez, de E27 para E30, sem elevação gradual na mistura.
Antes de propor a medida ao CNPE, o MME precisa concluir uma análise de impacto regulatório (AIR) a partir dos resultados apresentados pelo Instituto Mauá.