Biocombustíveis

Brasil usa G20 para enfrentar ‘bateria a carvão’ europeia

País defende métricas justas na contabilidade do CO2 que reconheçam as vantagens dos biocombustíveis na transição energética

Carros movidos a etanol transportam delegações que participam de reuniões de chanceleres do G20 no Rio (Foto: Divulgação MRE)
Carros movidos a etanol transportam delegações que participam de reuniões de chanceleres do G20 no Rio (Foto: Divulgação MRE)

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Diálogos da Transição

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Editada por Gabriel Chiappini
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Na cúpula do G20, que vai reunir líderes das maiores economias do mundo em novembro no Rio de Janeiro, o Brasil vai defender a criação de padrões de sustentabilidade internacionais que reconheçam o valor da biomassa e dos biocombustíveis, como o etanol, na transição energética global.

Heloisa Borges, diretora de Estudos do Petróleo, Gás e Biocombustíveis da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), conta que a criação de consensos neste tema é um objetivo central para o Brasil. Heloisa participa diretamente das reuniões no grupo de Trabalho da Transição Energética do G20.

À agência epbr, ela afirma que existe uma “divergência no conceito de sustentabilidade para combustíveis”, quando o assunto é contabilizar as emissões de carbono no ciclo de vida dos combustíveis.

Na avaliação da diretora, é necessário harmonizar os critérios globais e definir padrões que considerem especificidades regionais para que os biocombustíveis sejam reconhecidos internacionalmente pelo seu valor sustentável, incluindo biocombustíveis avançados e sintéticos derivados de biomassa.

“Temos a ambição de construir um consenso na contabilidade de carbono. E a contabilidade de carbono é fundamental para um monte de coisas. Ela é fundamental para a certificação de hidrogênio e do combustível sustentável de aviação (SAF, na sigla em inglês)”.

Biomassa no mercado internacional

O Brasil tem enorme potencial para produção de hidrogênio a partir de etanol, e de SAF a partir de oleaginosas e do próprio etanol.

Mas precisa vencer a resistência de países europeus, por exemplo, que argumentam que a produção de biocombustíveis compete com a produção de alimentos e desloca outras culturas para áreas desmatadas – conceito chamado de uso indireto da terra.

“Os critérios a partir dos quais a gente vai contabilizar emissões e os critérios de sustentabilidade são fundamentais para a gente não ficar nesse debate eterno do que é do food versus fuel, do que é ou não sustentável”, diz Heloisa.

Para superar essas divergências, o Brasil está trabalhando em documentos que comprovem a sustentabilidade do seu uso da terra. Um exemplo é o desenvolvimento de um policy brief em parceria com a Plataforma Biofuture e a Agência Internacional de Energia (IEA), que aponta boas práticas para a quantificação e governança da sustentabilidade.

Além disso, o país planeja atualizar o documento Green Ethanol Book dentro da Global Biofuels Alliance – aliança lançada no G20 do ano passado, reunindo os maiores produtores de etanol do mundo, Brasil, Índia e Estados Unidos.

Heloisa também destaca a importância da participação da FAO – organismos da ONU para segurança alimentar e combate à fome – nas discussões que comparavam que não há, uma competição no uso da terra entre alimentos e biocombustíveis.

“O que a gente quer, concretamente, é sair com documentos que comprovem isso”, diz Heloisa.

Alternativa ao carvão e à China

O caminho desejado é a contabilidade das emissões de carbono do “berço ao túmulo”, que envolve todo o ciclo de vida dos veículos e combustíveis, sem restrições de rota, conta uma fonte do Itamaraty consultada pela epbr.

Hoje a União Europeia (UE) não considera o automóvel movido a etanol como de baixa emissão, entretanto, um veículo elétrico movido com eletricidade gerada a partir da queima de carvão é considerado net-zero e tem acesso a incentivos.

Em 2022, houve um aumento de 8% na geração de eletricidade a partir do carvão e 16% a partir de produtos petrolíferos, segundo levantamento da Agência Ambiental Europeia (EEA). Com isso, a geração de um quilowatt-hora de eletricidade na região emitiu, em média, 9% mais CO2 do que no ano anterior.

Além disso, outro possível argumento para o Brasil romper barreiras aos seus biocombustíveis é que o foco europeu na eletrificação aumenta a dependência da China.

O país asiático hoje concentra em torno de 80% da produção de componentes para veículos elétricos, em especial células de baterias.

O próprio Tribunal de Contas Europeu (TCE) – órgão independente da Comissão Europeia para análise do orçamento e finanças do bloco – alertou, em abril, que a soberania industrial da UE poderia estar em risco se mantiver a decisão de proibir a venda de automóveis a combustão em 2035.

“A UE não deve acabar na mesma posição de dependência com as baterias que ficou com o gás natural; a sua soberania económica está em jogo”, afirmou na ocasião Annemie Turtelboom, membro do TCE que liderou a auditoria, ao euronews.

Oportunidades no G20

Para Arthur Pires de Campos, especialista da EPE, existe uma grande preocupação de ter um ambiente equilibrado para a competição entre rotas, considerando as características regionais na contabilidade de carbono.

Isso permitiria refletir as realidades locais sem criar barreiras aos países em desenvolvimento, explica.

Hoje, por exemplo, os modelos de uso da terra utilizam valores globais como se fossem valores regionais, o que coloca o Brasil em desvantagem, uma vez que não reconhece a área florestal nativa, a área degradada que pode ser utilizada pelo agronegócio, ou até mesmo a capacidade do país em realizar mais de uma safra em um mesmo território.

“A segunda safra, a terceira safra, a pastagem degradada, a recuperação de solos, o carbono no solo. Não consideram nada. Então existe uma grande briga de ter análises mais qualitativas e menos quantitativas da mudança do uso indireta do solo, porque mensurar isso é praticamente impossível”.

Superar barreiras políticas

Segundo Campos, existe um grande esforço do Brasil de identificar o que são barreiras técnicas e o que são barreiras políticas.

“Barreiras técnicas levam mais tempo e você vai ter que ter fóruns dedicados, baseados na ciência, para discuti-las. Aquelas barreiras que são políticas, eu sinto que há uma intenção muito forte de resolvê-las no âmbito do G20, que está todo mundo junto lá”.

A intenção é abrir caminhos principalmente em acordos da aviação (Corsia) e transporte marítimo (IMO), dois grandes novos potenciais mercados para a bioenergia brasileira.

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