A Nexway, empresa de eficiência energética da Comerc, e a Casa dos Ventos anunciaram parceria para desenvolver projetos de produção de hidrogênio verde (H2V) no Brasil. A estratégia envolve tanto projetos de larga escala, olhando a exportação de H2V, como a produção de pequeno e médio porte nas indústrias — uma espécie de geração distribuída de hidrogênio verde.
“Nos quatro estados que estamos estudando, os projetos são para exportação. São projetos de 4 bilhões de dólares cada, até 2030″, disse Marcel Haratz, CEO da Nexway, à epbr.
O primeiro projeto a sair do papel será no Piauí, começando como uma planta piloto. As empresas firmaram um memorando de entendimento com o estado na COP26, no início do mês.
Outros três projetos de grande porte em estudo são na Bahia, Ceará, Pernambuco.
A unidade de produção de H2V do Piauí será instalada na Zona de Processamento de Exportação (ZPE) do Porto de Parnaíba, e contará com um eletrolisador pequeno capaz de abastecer dois ônibus.
A Casa dos Ventos, maior desenvolvedora de projetos eólicos no Brasil, já possui 3 GW de capacidade instalada no estado e espera acrescentar mais 3,5 GW de eólicas onshore nos próximos anos.
Haratz explica que a ideia da parceria é unir o know-how da Casa dos Ventos em desenvolvimento de projetos eólicos, essenciais para produção de H2V, e a experiência da Comerc/Nexway na gestão e compra de energia.
“Decidimos juntar expertises para que a gente seja um dos principais players de hidrogênio verde no Brasil, tanto para mercado doméstico, quanto internacional. Ambas as empresas estão muito bem capitalizadas para fazer investimentos de grande porte”, afirma Haratz.
Geração distribuída de hidrogênio
Além dos projetos para produção de H2V em larga escala e exportação, as empresas também apostam na produção de pequeno e médio porte dentro das instalações das próprias indústrias.
“São projetos dentro das indústrias que já consomem hidrogênio [de origem fóssil] hoje, seja como matéria prima ou como insumo. Como a Comerc é a maior gestora de energia do Brasil e grande parte dos nossos clientes são indústrias, já estamos conversando com eles para entender como podemos ajudar nesse desenvolvimento”, conta o CEO da Nexway.
Apesar de pequenos, os projetos demandam altos investimentos. Haratz destaca que podem girar em torno de R$ 400 milhões.
“Hoje temos mais de cinco projetos em desenvolvimento de pequeno porte. Tem um super bem encaminhado. (…) É bem provável que a primeira molécula de H2V seja desenvolvida até 2024”, acredita o executivo.
Entre os segmentos industriais que já utilizam hidrogênio na sua produção, estão o de vidro, alimentos e refinarias. O grande desafio, segundo Haratz, é o preço, uma vez que o hidrogênio verde ainda será muito mais caro que o convencional.
“Por isso, estamos trabalhando com empresas que já estão muito empenhadas em transicionar para uma economia de baixo carbono”, ressalta.
A parceria Comerc/Nexway e Casa dos Ventos também está mapeando as aplicações futuras, como na mineração e siderurgia, dentro da lógica da geração distribuída.
Custo de produção e incentivos fiscais
Para superar o desafio do preço e custos altos de produção do hidrogênio verde, o desenvolvimento tecnológico de eletrolisadores será primordial, na visão de Haratz.
“Com o passar dos anos, a tendência é que o custo do equipamento caia, e teremos uma queda rápida de preço nos próximos anos (…) O hidrogênio não é mais uma questão de se é ou não é, mas de quando será viável”, afirma o executivo.
Ele defende a criação de subsídios ou mecanismos de incentivos para a utilização do hidrogênio verde, como maneira de criar demanda no mercado interno.
O governo federal já sinalizou que não haverá renúncia fiscal para incentivar o H2V.
“Entendo a situação brasileira de estrangulamento fiscal, mas precisamos de um subsídio para isso. Fomentar a indústria a consumir e dar a ela um incentivo a esse consumo (…) Nenhuma fonte renovável de energia nasceu sem subsídio, dizer que não vai haver nenhum subsidio para o hidrogênio acaba sendo injusto de alguma forma”, comenta.
Outra alternativa poderia ser a taxação de carbono para adoção do H2V nas indústrias brasileiras.
“Uma vez que não haverá subsídio, somente se você tiver uma taxação do carbono no que é exportado é que você vai ter isso”, explica.
Ele cita como exemplo utilização do hidrogênio verde em substituição ao gás natural.
“Cada metro cúbico de gás natural equivale a 2,7 metros cúbicos de hidrogênio verde na queima. Então se não há taxa de carbono, o hidrogênio terá que ser 2,7 vezes mais barato que o gás natural. E estamos bem longe disso”.
Políticas públicas que incentivem a utilização de H2V na indústria nacional também podem gerar valor agregado aos bens produzidos, diz. um exemplo é a utilização de hidrogênio verde para fabricação de fertilizantes e nos altos fornos da siderurgia.
“Se eu exporto hidrogênio, estou exportando minério de ferro, mas se eu exporto alimento verde, estou exportando produto acabado. Beneficiando a indústria brasileira, gerando o PIB no Brasil”, ressalta.
ESG facilita investimentos
Sobre a viabilidade de financiamento para todos esses projetos, o executivo justifica a mobilização de altos investimentos na cadeia de H2V e destaca a onda ESG (sigla em inglês para critérios ambientais, sociais e de governança) como um fator facilitador.
“Se paramos para pensar o quanto o mercado de combustível investiu em refinaria no mundo, estamos fazendo isso, criando um novo mercado de combustível, é obvio que faz sentido”, acredita.
“Vão ser estruturações financeiras complexas, investimentos em ESG, projetos geradores de créditos de carbono. Sabemos que tem fundos e investidores internacionais muito atentos a isso”, conclui.