Biocombustíveis

Brasil tem potencial para ser principal fornecedor mundial de SAF, afirma vice-presidente da S&P Global

Em entrevista à epbr, Carlos Pascual avalia que produtores brasileiros podem se beneficiar da Lei de Redução da Inflação dos EUA exportando etanol para SAF

Produção de SAF pode fazer do Brasil o principal fornecedor mundial do combustível sustentável, afirma Carlos Pascual [na foto], vice-presidente da S&P Global Commodity Insights (Foto: Divulgação)
Vice-presidente sênior da S&P Global, Carlos Pascual (Foto: Divulgação)

RIO – O Brasil tem potencial para se tornar o principal supridor mundial de combustível sustentável de aviação (SAF), devido aos avanços tecnológicos que o país tem feito para o desenvolvimento de biocombustíveis de segunda geração, acredita o vice-presidente sênior da S&P Global Commodity Insights, Carlos Pascual.

“O etanol de segunda geração desenvolvido no Brasil tem a tecnologia de ponta do mercado e já se provou como uma matéria-prima de custo competitivo para a produção de SAF”, afirma.

Em entrevista exclusiva à agência epbr, ele aponta, entretanto, que vai ser importante que o país desenhe uma estratégia para atuar nesse mercado. Isso inclui, por exemplo, decidir se quer produzir SAF ou exportar etanol para que o combustível final seja produzido em outras regiões.

Caso escolha exportar a matéria-prima, o consultor acredita que os produtores brasileiros podem se beneficiar da Lei de Redução da Inflação (IRA), pacote do governo de Joe Biden, que destinou US$ 430 bilhões para estimular a transição energética nos Estados Unidos

“Há companhias que estão exportando a tecnologia do etanol de segunda geração para outros países, como os Estados Unidos. Com isso, podem formar parcerias com produtores americanos que podem aproveitar os subsídios do IRA”, diz.

O marco legal brasileiro para o SAF deve entrar na agenda do Congresso neste segundo semestre com o projeto de lei do Executivo do programa Combustível do Futuro.

A proposta do governo está na Casa Civil e pretende estabelecer um mandato de redução das emissões de CO2 em 1%, no mínimo, aos operadores aéreos, para criar uma demanda doméstica pelo produto de baixo carbono.

O mandato passaria a valer a partir de 1º de janeiro de 2027, em voos domésticos, e a redução precisará ser alcançada com uso de SAF misturado ao querosene fóssil.

Mercado para o hidrogênio

Pascual foi diretor de Recursos Energéticos do Departamento de Estado dos Estados Unidos, além de ter atuado como embaixador do país no México e na Ucrânia. Ele está no Brasil esta semana para debates sobre o mercado de energia no Rio e em São Paulo.

De modo similar à estratégia para o SAF, o vice-presidente da S&P Global também acredita que as empresas brasileiras podem se beneficiar dos estímulos no mercado norte-americano para a produção de hidrogênio.

Ele lembra que as companhias dos EUA têm o benefício dos subsídios do IRA, o que pode levar a uma redução no custo da tecnologia de eletrólise, mas ressalta que o país não terá energia renovável suficiente para atender à demanda global por esse combustível.

“O Brasil precisa pensar o que pode fazer para trabalhar com as companhias americanas que estão fazendo esses investimentos”.

O consultor observa que o Brasil tem capacidade para produzir hidrogênio tanto para exportação quanto para atender indústrias locais.

“O melhor potencial para reduzir riscos é haver diversas demandas para atender no futuro”, pontua.

Mercado de carbono deve beneficiar comunidades indígenas

Para o especialista, uma das principais mudanças que a guerra na Ucrânia trouxe para o mercado global de energia foi um maior comprometimento com a aceleração da transição energética e a redução das emissões de carbono.

“Não é apenas conversa, há movimento real. Muito ainda precisa ser feito, mas o impulso é claro”, diz.

É nesse contexto que surge uma maior preocupação global com a Amazônia.

Ele acredita que o Brasil deve aproveitar o momento atual em que a atenção global está voltada à preservação da Amazônia para criar mecanismos de créditos de carbono que beneficiem as comunidades indígenas.

Isso demandará a criação de um mercado de créditos de carbono confiáveis e verificáveis, de modo a gerar um retorno de capital para as comunidades e para os projetos que estimulem o uso da floresta como um sumidouro de carbono.

“É crítico construir confiança nas comunidades que estão mudando práticas na agricultura ou colocando de pé projetos de preservação e reflorestamento. Haverá uma expectativa por parte dessas comunidades de ter um retorno justo em relação aos preços de carbono no mercado regulado”.

Já em relação à transição energética, ele cita como positiva a decisão da Petrobras de ampliar investimento em produtos de baixo carbono, ao mesmo tempo em que busca projetos que tenham retornos financeiros consistentes.

“A companhia está explicitamente se comprometendo com a agenda de descarbonização”, comenta.

A respeito da exploração e produção de petróleo na Margem Equatorial, o consultor acredita que a decisão precisa ser tomada pelos governantes brasileiros, mas reitera que as expectativas a respeito da preservação da floresta “são altas”.

Equilíbrio entre oferta e demanda de petróleo

Para Pascual, os preços do barril de petróleo têm se mantido em uma “volatilidade estável”, pois permanecem entre US$ 75 e US$ 80 nos últimos meses, mas com grandes flutuações dentro dessa faixa.

Os principais fatores que o consultor acredita que têm impactado os preços são a economia chinesa e as expectativas sobre o consumo nesse país, além dos movimentos de inflação e taxas de juros nos Estados Unidos.

Ele destaca que a Europa tem sido bem-sucedida em encontrar substitutos para o gás russo, um dos principais temores que surgiu no mercado logo após a invasão da Ucrânia, devido à alta dependência europeia do suprimento da Rússia.

Além disso, aponta que o limite de preços imposto pelos países do G7 ao petróleo russo teve sucesso, pois foi capaz de reduzir as receitas da Rússia com as exportações, ao mesmo tempo em que evitou grandes aumentos de preços no barril de petróleo que teriam ocorrido se as exportações tivessem encontrado mais barreiras no mercado internacional.

Países como China, Índia e Brasil têm continuado a importar petróleo e derivados da Rússia mesmo com as sanções europeias e dos Estados Unidos.

“A estratégia do G7 produziu resultados melhores do que muitas pessoas esperavam”, afirma.

Pascual aponta ainda que o crescimento da demanda global por petróleo tem sido atendido sobretudo pelos países do continente americano, incluindo Estados Unidos, Brasil e Guiana.

Nesse contexto, ele acredita que o mundo encontrou um bom equilíbrio entre oferta e demanda de petróleo, por isso, é provável que os preços do barril sigam dentro desses limites. Mas ressalta que o atual equilíbrio nas cotações pode ser afetado, sobretudo se ocorrerem eventuais mudanças nos níveis de produção da Opep ou na demanda chinesa.