RECIFE — O Brasil precisa institucionalizar as discussões sobre a transição energética e criar uma agenda de trabalho para o ano de 2023 para recuperar a confiança do investidor, na visão de especialistas que participaram nesta quarta (18/5) de um webinar realizado pelo Centro de Estudos em Regulação e Infraestrutura (Ceri), da Fundação Getulio Vargas.
Elbia Gannoum, presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica), afirma que a agenda é fazer uma reforma institucional urgente, o que vai dar segurança aos investimentos no setor.
“Já estávamos em uma situação difícil, que precisava de uma coordenação global e agora chegamos a uma sensação que até a nossa coordenação doméstica está em xeque”, disse Gannoum.
Para a executiva, a invasão da Rússia na Ucrânia mudou a forma de pensar a transição energética, que deixou de ser uma questão específica de mudança climática e se tornou questão de soberania.
“Os países vão pensar na segurança energética e acelerar o programa de renováveis. Vários pacotes vão surgir nesse sentido. Isso vai trazer uma pressão nos preços relativos, e nós vamos padecer a curto e médio prazo, até o mercado buscar o seu ajuste”, explica.
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Crítica da obrigatoriedade de contratação de termelétricas a gás no Nordeste do país incluída na lei de privatização da Eletrobras, Gannnoum afirma que o Brasil tem investidores com recursos disponíveis e capacidade para atrair investimentos. O que falta são sinais institucionais para dar segurança.
“Na trajetória que estamos, vamos perder credibilidade nos investimentos. Precisamos aproveitar que o investidor acredita no Brasil, apesar de tudo, e reforçar as instituições. Temos que pensar nas mudanças climáticas e na transição energética como modelo de negócios”.
Mais recente relatório da Agência Internacional de Energia Renovável (Irena, sigla em inglês), o World Energy Transitions Outlook (Weto 2022) aponta que, apesar de 192 países terem assinado o Acordo de Paris, em 2015, concordando em em buscar esforços para tentar limitar o aumento da temperatura global até 2050 a 1,5°C, diversos setores dependentes de combustíveis fósseis continuam a contribuir para as emissões.
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Desafio da governança
Um olhar institucional a partir do planejamento coordenado será um pilar essencial para a transição no setor elétrico, avalia Ricardo Gorini, Senior Programme Officer da Irena.
. “O estabelecimento de um alinhamento do que é uma visão do clima e da economia é um desenvolvimento conjunto. Outros países criaram leis, é bem estabelecido o que é transição energética, o que é a meta. É importante a coordenação e o mundo inteiro precisa acelerar a agenda de transformação”.
O Weto apresenta o caminho para alcançar a meta de 1,5°C através da eletrificação e eficiência energética como principais impulsionadores, viabilizados pela energias renováveis, hidrogênio verde e bioenergia.
“Precisamos aumentar, globalmente, o número de países utilizando energia elétrica a partir de renováveis. Hoje temos 26% [dos países utilizando energias renováveis], precisamos aumentar isso, até 2030, para 65%”.
Para Gorini, os investimentos atuais, embora significativos, ainda não são suficientes.
“Esse investimento, atualmente, é de US$ 250 bilhões por ano, mas é preciso chegar a US$ 2 trilhões por ano”.
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Apesar dos avanços, a falta de governança global no processo de fortalecimento da transição energética preocupa os especialistas.
“Eu voltei da COP com um sentimento de que houve alguns avanços, mas também uma certa resistência e diferenças sociais, geográficas e políticas no âmbito da transição energética. A gente sentia falta de uma governança global para colocar a transição energética em uma pauta mais forte”, conta Elbia Gannoum.
Diferentes rotas tecnológicas integram o caminho até 1,5°C, o que aumenta os desafios de governança e ajustes institucionais.
“As rotas tecnológicas estão relacionadas ao processo de eletrificação (transporte, residências e indústrias), eficiência energética e bioenergia. Precisamos pensar em buscar mecanismos de demanda para a nossa energia verde, além de buscar as commodities do mercado verde. Estamos falando de uma discussão importante que precisa de um ajuste institucional”, completa Gorini.
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