Agendas da COP

Brasil pode ter uma economia com emissões negativas de carbono, afirma Izabella Teixeira

País deveria retomar rota original de descarbonização do Acordo de Paris, defende ministra que participou de negociações

Izabella Teixeira, ex-ministra de Meio Ambiente (foto por IEA-USP)
Izabella Teixeira, ex-ministra de Meio Ambiente (foto por IEA-USP)

O anúncio brasileiro de zerar o desmatamento ilegal até 2028 é uma “perda de oportunidade” para o país demostrar uma trajetória de crescimento econômico e preservação das floresta, diz Izabella Teixeira, ex-ministra do Meio Ambiente e conselheira do Centro Brasileiro de Relações Internacionais.

Ela afirma que o Brasil tem condições de não apenas buscar a neutralidade, mas ter uma economia com emissões líquidas negativas.

“Como estava na NDC, em Paris: o Brasil poderia virar carbon sink, retirar mais [carbono] do que emite. O Brasil passaria a ser um país solidário ao mundo, um conceito importante – pós-pandemia, então, nem se fala – desse novo multilateralismo, [que] se significa trabalhar com a natureza (não só a floresta) de pé”, diz.

Ministra do Meio Ambiente entre 2010 a 2016, durante os governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, Izabella foi responsável pelo desenho da Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, na sigla em inglês) entregue pelo Brasil em 2015 no Acordo de Paris.

Izabella Teixeira conversou em Glasgow, com a Estratégia ESG, parceria da epbr com a Alter Conteúdo, e participou do Brazil Climate Action Hub, iniciativa de organizações da sociedade civil.

As metas revisadas foram anunciadas ontem por Joaquim Leite, atual ministro do Meio Ambiente. 

Segundo Izabella, a atualização da NDC fez um “mero ajuste e ainda insuficiente” para compensar o recuo feito pelo governo de Jair Bolsonaro no ano passado. 

“Não há ambição maior nenhuma. (…) chegaremos em 2030 com mais quantidade de carbono do que chegaríamos se cumpridos os termos acordados em 2015”, critica. “Parece um equívoco político o Brasil chegar aqui falando apenas de desmatamento ilegal. Uma coisa é combater o crime outra é produzir com base na natureza protegida”. diz.

Ontem, ao atualizar as metas de redução de emissões de carbono, o Brasil anunciou um compromisso para diminuição do desmatamento ilegal — justamente um dos principais pontos de crítica internacional em relação ao governo Bolsonaro.

O país é visto como permissivo com o setor agrícola, até mesmo por setores do agronegócio.

Os ministérios do Meio Ambiente e da Justiça estabeleceram o objetivo de reduzir o desmatamento ilegal a partir de 2022 em 15% por ano até 2024, 40% em 2025 e 2026, e 50% em 2027. O governo diz que será possível zerar o desmatamento ilegal em 2028.

Para Izabella, a estratégia brasileira precisa ter como foco tornar o agronegócio competitivo com a floresta em pé, além de implementar o Código Florestal — atrasado por conta do próprio governo. 

“O Brasil tem que construir uma mentalidade que o mundo está mudando para uma nova relação com a natureza. Ser planetário não é ser global. É produzir com a natureza como aliada. A partir de uma natureza protegida”, completa.

Além disso, será preciso maior diálogo com a sociedade. “Precisamos falar em português, não só em inglês”, disse, fazendo alusão ao fato de as discussões sobre clima e meio ambiente ficarem restritas a conferências e não conseguirem atingir as pessoas que vivem da floresta.