Para o Cônsul-Geral Britânico do Rio de Janeiro, Anjoum Noorani, o Brasil deveria focar suas políticas para ser pioneiro na indústria global de hidrogênio verde.
Segundo ele, a exploração de novas fronteiras de óleo e gás no país é importante, mas o foco deveria estar na transição energética.
Além do hidrogênio, Noorani vê o etanol brasileiro como uma importante contribuição para a descarbonização, incluindo a produção de combustível sustentável de aviação (SAF, na sigla em inglês).
“Pensando na exploração de petróleo e gás aqui no Brasil, não quero expressar uma opinião direta sobre isso, mas o que eu diria que, para mim, no mundo da transição energética tem uma grande vantagem de quem é pioneiro, o que chamamos de first mover advantage, disse em entrevista à agência epbr.
Segundo ele, a China fez isso na energia solar, o Reino Unido com a eólica offshore, e o Brasil poderia fazer com o hidrogênio de baixo carbono.
“Especialmente no hidrogênio de baixo carbono, acho que o Brasil realmente tem uma possibilidade de ter essa vantagem do pioneirismo. De ser um dos primeiros países a desenvolver, não somente a tecnologia e o uso da tecnologia, mas também portos, fertilizantes verdes, aço verde, e a exportação para uma Europa que está querendo sair da dependência do gás russo”, avalia.
Para Noorani, há uma disputa global pelo pioneirismo, e caso o Brasil abra mão da sua liderança natural para o hidrogênio verde, outros países vão ocupar essa posição, e usar essa vantagem parar capturar os mercados globais e definir padrões de certificação mundialmente, por exemplo.
“Países podem se fazer muitas coisas em paralelo. E isso é um uma escolha nos países. Só que qualquer país deve se preocupar no foco (…) E pessoalmente, o Brasil tem uma vantagem tão espetacular no hidrogênio verde no futuro, no hidrogênio limpo, que eu quero que o Brasil não perca essa vantagem”, enfatiza.
Novas fronteiras de óleo e gás no Brasil
Sobre a exploração de novas fronteiras de óleo e gás no país, com destaque para a Margem Equatorial, e a polêmica Bacia da Foz do Amazonas, o cônsul defende que cada país encontre seu próprio equilíbrio.
Atualmente, Shell e bp se destacam entre as petroleiras britânicas que atuam na exploração de óleo e gás no Brasil.
“Não acredito que vamos parar agora a exploração de petróleo e gás. Mas do outro lado, é impossível que o mundo possa usar todo o petróleo e gás que existe na terra, porque fazendo isso vamos causar uma crise climática”, pontua.
“Os dois lados extremistas são impossíveis. Então, cada país tem que buscar o equilíbrio, o que é mais apto pra eles. A transição energética é necessária e inevitável. Todo mundo fez compromissos, inclusive em Glasgow, sobre a mudança climática. E se um país faz um compromisso ele deveria cumprir com isso”, completa Noorani.
Para o cônsul, o Brasil tem capacidade de ser uma superpotência energética e colaborar nos desafios enfrentados pelos países hoje, que envolvem o quadrilema da segurança de abastecimento, energia barata, segurança econômica e redução das emissões.
“O Brasil tem um papel fantasticamente importante nesse sentido (…) O Brasil poderá ser um superpoder da energia. Da energia renovável e, especialmente, do hidrogênio”.
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4 bilhões de libras para projetos no Brasil
Recentemente, o Reino Unido relançou o programa de UK Export Finance (UKEF) no Brasil, disponibilizando 4 bilhões de libras (cerca de R$ 25 bilhões na cotação de hoje) para financiamento de projetos no país, em todos os setores.
“O UKEF tem como prioridade setores sustentáveis. Todos os setores conectados com transição energética, renováveis, etc, estão aptos para estes recursos (…) Energia e infraestrutura de portos devem representar grande parte do montante. A dificuldade está em encontrar projetos que são realmente aptos para este tipo de financiamento”.
Anjoum destaca o interesse do Reino Unido em fortalecer o papel do Brasil no mundo energético, aproveitando a relação que os países já possuem.
“Há bastante possibilidade de criar uma relação mais forte entre o Reino Unido e o Brasil, no caso da energia, em vários aspectos, a política pública, programas de comparação, os laços comerciais. Temos que usar todas essas ferramentas para aumentar essa relação”.
No caso do hidrogênio, o Reino Unido possui uma estratégia que prevê a capacidade de 10GW de produção de hidrogênio, sendo metade via eletrólise, até 2030.
Entre outras iniciativas, a estratégia britânica prevê um fundo para inovação de hidrogênio, a criação de dois cluster de hidrogênio no Reino Unido, e a cooperação internacional, tanto com possíveis países europeus consumidores de hidrogênio britânico, quanto com possíveis produtores de hidrogênio, a exemplo do Brasil.
“Poucos países no mundo tem a possibilidade de criar hidrogênio de uma escala enorme, e o Brasil é um deles”, avalia.
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Noorami também ressalta a possibilidade de cooperação entre portos brasileiros e britânicos na criação de corredores verdes para transporte de hidrogênio de baixo carbono.
“Visitei o Porto de Açu, e vi o tamanho deste porto que pode ser usado para exportação ou de hidrogênio ou de derivados de hidrogênio. Isso sem falar de outros portos, como Pecém Suape e Rio Grande”.
No mês de abril, o Reino Unido organizou uma missão com representantes dos portos de Pecém, Suape, Rio Grande e Açu, para trocarem informações com portos britânicos, especialmente na pauta do hidrogênio.
“Há um a grande vantagem da parceria entre portos, por conta da infraestrutura que existe entre os dois lados, e pela parte de financiamento”, diz o cônsul.
O cônsul ressaltou a disponibilidade de fontes de financiamento britânico para expansão de infraestrutura portuária, incluindo no Brasil.
“A cidade de Londres é um dos três maiores centros de capital do mundo. E então, temos esses fundos que podem investir no desenvolvimento dos portos, e por isso estamos explorando como atrair mais mais finanças do Reino Unido, através de programas como o Sustainable Infrastructure Program, Sustainable Markets Initiative e o UK Export Finance”.
Etanol brasileiro para uma aviação sustentável
Além do hidrogênio, Noorani vê o etanol brasileiro como uma importante contribuição para a descarbonização de diversos setores, globalmente, incluindo o combustível sustentável de aviação (SAF, na sigla em inglês).
“Eu diria que uma das vantagens competitivas do Brasil é possivelmente na produção de etanol pra ajudar a descarbonização de vários setores, inclusive SAF”, acredita o cônsul britânico.
Hoje, a rota mais conhecida para produção de SAF é a que gera o HVO – óleo vegetal hidrotratado. Mas a rota alcohol-to-jet (ATJ), que utiliza o etanol como base, vem sendo apontada como alternativa viável, no curto prazo, para atender à meta da aviação internacional de neutralidade em carbono até 2050.
Noorani destaca que o Brasil é um grande produtor de etanol, certificado, com baixo impacto no uso de terra.
“O Reino Unido não tem bastante terra. Então, é bem improvável que produziremos tanto etanol. Então, nisso entra um país como o Brasil”, acrescenta.
Ele lembra que o reiuno Unido lançou no ano passado, uma estratégia nacional para descarbonizar o setor de aviação até 2050, chamada Jet to Zero.
“Para nós é um setor bastante importante, pois somos uma ilha no centro do mundo. Então, temos bastante conexões, e sabemos que a aviação é tanto um risco para o meio ambiente, como uma oportunidade, com o SAF”.
O cônsul comenta da importância de parcerias governamentais entre Brasil e o Reino Unido capazes de criar políticas públicas que facilitem o processo de inovação, empreendedorismo e de novos negócios.
“O importante pra mim é ver como é que o governo pode ajudar esse processo de criação de relações que facilitem essa inovação. Por exemplo, estou bem feliz que a Raízen, que é 50% Shell, está inovando nessa área para ver as formas de produzir uma SAF”.