Energia

Biogás será impulsionado por demanda, não por mandato, diz Abiogás

Presidente da Abiogás, Alessandro Gardemann, acredita que alta dos combustíveis fósseis é oportunidade para o biometano

Alessandro Gardemann, presidente da Abiogás
Alessandro Gardemann, presidente da Abiogás (Foto: Divulgação)

RIO — O biogás brasileiro deve ser impulsionado pela demanda do mercado por descarbonização, e não por mandatos. Essa é a avaliação do presidente da Associação Brasileira do Biogás (Abiogás), Alessandro Gardemann, que vê com ressalvas a sustentabilidade de políticas de compras obrigatórias — como ocorre com a mistura do biodiesel ao diesel.

“Sou terminantemente contra algo obrigatório”, afirmou Gardemann à agência epbr, durante evento realizado, na semana passada em Londrina (PR), pela Geo Biogás & Tech, empresa da qual também é presidente e fundador. “Estamos criando uma indústria sem obrigar ninguém a comprar”, completou.

Ao comentar sobre os riscos de o setor depender de mandatos, ele citou o caso da indústria de biodiesel — que esperava vender 8 bilhões de litros em 2021, mas fechou o ano com uma comercialização de 6,8 bilhões, após a redução da mistura obrigatória do biodiesel dos 13% para 10%.

“Queremos algo sustentável, que fique de pé”, pontuou Gardemann.

O mercado de biogás vem ganhando adeptos e reúne, hoje, projetos de empresas como a Raízen, Orizon, Gás Verde (Urca Energia) e Marquise para produção do gás renovável.

A expectativa no setor é que o biometano ganhe escala, impulsionado pelas metas de descarbonização assumidas pela indústria.

Os produtores apostam na estabilidade de preços como um diferencial do produto, uma vez que o gás renovável não é indexado aos preços internacionais, como o gás natural e derivados do petróleo — que convivem, atualmente, com um ambiente de mercado de preços altos e voláteis.

Para Gardemann, o momento é uma grande oportunidade para o biogás ser percebido como estratégico pelas empresas, tanto na perspectiva dos negócios quanto da segurança energética.

“Mesmo que o preço [do óleo e gás] volte ao normal, todo mundo vai lembrar que ele pode subir”, disse o presidente da Abiogás. “Segurança energética é um tema importante. Se garantir apenas com gás natural liquefeito (GNL) importado será uma boa estratégia a longo prazo? Temos que pensar em um mix de soluções para a segurança energética”, comentou o executivo.

Créditos de metano e selo verde em debate

Apesar dos avanços no setor, existem apenas 670 usinas de biogás em operação no Brasil — somente três delas voltadas para produção de biometano. A participação do biogás na oferta interna de energia é de somente 0,09%.

Segundo a Abiogás, o gás renovável tem potencial para deslocar 34,5% da demanda de energia elétrica do país, que é de 482 TWh. Já o biometano pode substituir 70% da demanda de diesel nacional, de 67 bilhões de litros.

No caso específico do biometano, o mercado aguarda com interesse os detalhes dos incentivos previstos nos programas Metano Zero e Combustível do Futuro, do governo federal. Ambas as iniciativas tentam valorar os benefícios ambientais do combustível renovável em todo o ciclo de vida e permitir, assim, a geração de créditos de metano complementares aos créditos de descarbonização (CBIOs) do Renovabio.

“O Renovabio considera a pegada de carbono da planta de produção para frente, mas não da planta para trás. É importante considerar todo o ciclo de vida”, defendeu o vice-presidente da Abiogás, Gabriel Kropsch.

Além desses créditos, está em discussão a criação do selo verde para biometano — uma espécie de certificado dado aos consumidores de biogás, para que eles possam contabilizar a descarbonização em suas atividades por meio do uso do combustível renovável.

“As empresas consumidoras precisam saber quanto estão reduzindo de emissões”, afirmou Kropsh. “É importante que essa certificação seja feita com base na ciência e seja  juridicamente rastreável. Rastreabilidade que permita que o consumidor industrial, a transportadora, saiba que aquele combustível tenha todo o histórico da sua origem”, completou.

Segundo o vice-presidente da Abiogás, apesar de algumas agências estaduais estarem discutindo a criação de um selo verde regional, seria importante que ele tivesse validade e aceitação internacional.

A associação vem discutindo com a Science Based Targets Initiative (SBTi), iniciativa multilateral que auxilia na criação de parâmetros globais de sustentabilidade baseados na ciência.

“Tem que ter um documento que seja entendido e aceito lá fora. Esse selo vai permitir que se tenha acesso ao mercado internacional, demonstrando cientificamente que o seu produto tem uma pegada de carbono mais baixa e , em função disso, permitir levantar recursos e  financiamento”, explica Kropsh.