Contrariando as previsões do mercado, o fertilizante feito a partir do hidrogênio verde (H2V) será vendido no mercado brasileiro ao mesmo preço que o convencional, produzido com gás natural, afirma Rodrigo Santana, diretor de operações da Atlas Agro em entrevista à epbr.
A companhia planeja produzir 500 mil toneladas por ano de fertilizantes nitrogenados com hidrogênio verde a partir de 2027, na fábrica que está sendo construída em Uberaba, Minas Gerais.
“Esse é o grande diferencial do nosso modelo de negócio inovador. Não vai ser mais caro. Os produtores para quem vamos entregar naquela região vão ter acesso a um fertilizante verde, zero carbono, com o qual eles podem adicionar maior valor aos produtos deles, sem pagar um real mais caro”, disse o executivo à epbr.
Segundo ele, a empresa aposta exclusivamente em soluções sustentáveis e na rota da eletrólise com eletricidade renovável.
“A nossa empresa é 100 % verde. Esse é o grande motivo da gente existir hoje. A rota que definimos é de eletrólise e utilizando hidrogênio verde, porque o gás natural, hoje, é um dos grandes emissores de carbono para a atmosfera”.
Santana destaca que a indústria mundial de fertilizantes nitrogenados, que utiliza basicamente gás natural, emite mais de 1 bilhão de toneladas de CO2 equivalente por ano.
“Nosso projeto não vai precisar de gasoduto. Vamos ter os parques solares e eólicos, que não precisam estar em Uberaba, vão ser conectados à rede elétrica”.
Escolha de Uberaba
A empresa com sede na Suíça, conta com um escritório em Madrid, na Espanha, e além do Brasil, tem um projeto similar de produção de fertilizantes a partir de hidrogênio verde no estado de Washington, Estados Unidos.
Além da demanda por fertilizantes, a grande oferta de energia solar, e a conexão à rede elétrica, bem como acesso à água e à logística de transporte, influenciaram na escolha da companhia por Uberaba.
“Uberaba é uma região com uma forte demanda. Num raio de até 500 quilômetros, tem uma demanda de mais de 2 milhões de toneladas de fertilizantes nitrogenados. Basicamente, vamos suprir de 25 a 30 % do mercado da região”, afirma o diretor da empresa.
Custo da energia
Este ano, a empresa já recebeu 76 propostas de contrato de compra e venda de energia (PPA, na sigla em inglês), de 23 atores do mercado elétrico. A decisão final do contrato deve acontecer ao longo do ano que vem.
“Temos várias possíveis opções, 100% solar ou misto de solar e eólica. Tanto em Minas como fora de Minas também”, comenta o executivo.
Segundo ele, a preocupação é garantir uma boa negociação para que no final haja um preço competitivo que viabilize o fertilizante verde no mercado. Cerca de 80% do custo de operação de uma planta de fertilizantes nitrogenados é energia, diz Santana.
“Hoje, o que eu posso é que os preços que estão circulando no mercado sendo negociados atendem a viabilidade do projeto”.
Há dois meses, a Atlas também começou o processo de seleção das empresas de EPC (Engineering, Procurement, Construction), responsáveis pelo projeto de engenharia para construção da planta. Serão quase US$ 850 milhões em investimentos, ou pouco menos de R$ 5 bilhões.
De olho no mercado nacional fertilizantes
Ele lembra que o Brasil hoje importa uma quantidade de 12 milhões de toneladas de nitrogenados e que a planta vai ser 100% voltada para atender ao mercado doméstico.
Com a planta de Uberaba de pé, o plano da companhia é replicar de sete a nove fábricas nesse modelo no Brasil.
“Nossa ambição aqui no Brasil, pelo tamanho do mercado, é ter várias. Tem um apetite no Brasil de pelo menos entre 8 plantas para construirmos nos próximos anos”.
Por enquanto, estão descartadas outras rotas de produção de fertilizante verde, seja a partir do biometano, ou do hidrogênio feito de biomassa.
“Vamos ter plantas grandes e padronizadas. Isso vai fazer com que tenhamos um modelo de negócio mais competitivo e mais barato. Não faz muito sentido termos uma rota tecnológica específica para cada mercado”.
Santana também salienta que a oferta de biometano no país ainda é insuficiente para atender a escala de produção da Atlas.
“O Brasil hoje ainda não possui uma oferta de biometano suficiente para essa primeira planta. O Brasil tem um potencial gigantesco de biometano. Mas, hoje, a oferta que existe hoje no mercado ainda não é suficiente para abastecer essa e outras plantas também”.
Oportunidade do hidrogênio verde para o Brasil
Ao contrário dos Estados Unidos, que já definiu enormes subsídios para produção de hidrogênio, bem como incentivos para o consumo de fertilizantes feitos a partir do energético, o Brasil ainda patina nas discussões sobre regulamentação e incentivos para a nova indústria.
O executivo chama a atenção para a curta janela de oportunidade que o país tem.
“O potencial no Brasil é gigantesco, mas estamos competindo com o resto do mundo e existe uma janela de oportunidade, que eu enxergo, apenas até 2030”.
Ele defende que o hidrogênio verde pode ser um grande impulsionador do PIB brasieliro e da neoindustrialização no Brasil, mas que isso “não vai acontecer se não houver algum tipo de suporte inicial”.
Na avaliação de Santana, os incentivos na primeira década, podem garantir a chegada dos investimentos no país.
“Se demorarmos muito a decidir isso, os outros países estão fazendo os Estados Unidos, a União Europeia, o Canadá, o Japão também. Boa parte das indústria e do capital global vai para esses países onde tem os incentivos”, alerta.
“No Brasil, não estamos falando de incentivos ou de suporte a um nível dos EUA, muito longe disso. Pequenos ajustes que precisam ser feitos já vão dar um significativo resultado”, completa.
A Atlas Agro é uma das empresas avaliadas pelo Departamento de Energia dos EUA para integrar o Centro de Hidrogênio do Noroeste do Pacífico (Washington, Oregon, Montana) que deve receber até US$ 1 bilhão em financiamento da Lei Bipartidária de Infraestrutura.