Gás Natural

ANP ganha reforço para acelerar a extensa (e atrasada) agenda do gás

Agência dobra equipe técnica responsável pela agenda regulatória do gás natural

ANP ganha reforço para acelerar a extensa (e atrasada) agenda do gás. Na imagem: Estande da ANP na Rio Oil and Gas (Foto: Saulo Cruz/MME)
Agência Nacional do Petróleo (ANP) está com a agenda regulatória atrasada (Foto: Saulo Cruz/MME)

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Editada por André Ramalho
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PIPELINE Agenda regulatória da ANP para abertura do mercado de gás atrasa e preocupa os diferentes elos da cadeia. Agência ganha reforço de pessoal para agilizar regulamentações. E agentes traçam suas prioridades na agenda.

Portocem contrata obras de termelétrica no Ceará. Novo CEO da Petrobras defende substituição do diesel por gás. E mais. Confira:

Uma agenda, poucos avanços

A abertura da indústria de gás natural entra em 2023 em seu quarto ano, desde o lançamento do Novo Mercado de Gás, em 2019, com avanços tangíveis na dinâmica do setor. São novos fornecedores, consumidores livres, novos tipos de contrato… Mas poucos avanços na agenda regulatória da ANP.

No clima de otimismo do NMG, há quatro anos, a agência abraçou uma agenda ampla, com a perspectiva de concluí-la em 2021. As discussões atrasaram, nenhum dos itens foi, de fato, sacramentado e novas pautas não param de chegar.

Com a mudança de governo, é natural que novas diretrizes venham a ser definidas e que a ANP tenha que readequar suas prioridades.

Fato é que os agentes — dos diferentes elos da cadeia — compartilham da preocupação de que a ANP não seja capaz de responder a todas as demandas com celeridade.

Mas como chegamos até aqui? O que a ANP tem a dizer? Quais as prioridades da agenda dos diferentes players? Quais as saídas possíveis para que a regulamentação da abertura de gás ganhe tração?

ANP ganha reforço

Desde o lançamento do NMG, a ANP pede à União o reforço de seu quadro pessoal, a fim de atender às demandas da abertura do mercado.

A ideia era que colaboradores do BNDES fossem cedidos à agência. O assunto, inclusive, foi tratado pelo gabinete de transição de governo, que mapeou, à época, um déficit de 125 funcionários.

O reforço demorou a chegar, mas chegou. Entre servidores de outros órgãos e profissionais contratados em regime temporário, a equipe responsável pela regulamentação do mercado de gás, que contava com dez pessoas, dobrou de tamanho este ano, segundo a ANP. Ainda precisam passar por capacitação.

A falta de pessoal é apontada recorrentemente pela própria ANP como um motivo para os atrasos na agenda. Entre os agentes do setor, há quem veja problemas além.

“A ANP precisa se preocupar mais com a simplificação de ritos, que são desproporcionais”, opina o secretário-executivo da ABPIP (produtores independentes), Anabal Santos Jr.

Com a palavra, a ANP

O diretor da ANP, Fernando Moura, explica que, fora a execução da agenda regulatória, a agência assumiu outras tarefas para viabilizar os primeiros passos da abertura de mercado.

Exemplos: a aprovação dos aditivos contratuais que resultaram na liberação de capacidade de transporte pela Petrobras; a aprovação das tarifas de transportes dos contratos extraordinários que viabilizaram o acesso de novos agentes à infraestrutura; e o envolvimento da ANP com as chamadas públicas de capacidade dos gasodutos.

“Não podemos nos esquecer de que houve um rápido processo de abertura do mercado de gás brasileiro, cujos efeitos ocorreram, principalmente, a partir de 2022, e que elevou substancialmente a carga de trabalho da equipe envolvida no tema”, afirmou Moura à agência epbr, por email.

Ele cita o aumento dos pedidos de autorização de atividade por parte dos novos agentes. Tudo isso implica em mais consultas, reuniões de esclarecimento e apresentação de projetos — além de adequações de muitos aspectos da sistemática de funcionamento do setor.

“O que não ocorria na situação anterior, na qual a Petrobras era praticamente o único agente atuando em diversos segmentos da indústria do gás natural”, completou.

De acordo com o diretor, a ANP tem buscado simplificar processos e padronizar procedimentos — um exemplo está na contratação de capacidade de transporte. Além de buscar a automatização de processos e visualização de dados.

A movimentação dos agentes

De uma forma geral, a agenda regulatória da ANP mexe — direta ou indiretamente — com os negócios de todos os elos da cadeia. Algumas pautas, porém, são mais caras a uns agentes que outros.

ATGás. O presidente da associação das transportadoras, Rogério Manso, pontua que a abertura da indústria de gás é um processo complexo — e, portanto, naturalmente longo. “Não deveria ser surpresa para ninguém os atrasos na agenda”, afirma.

A ATGás defende a simplificação da contratação de capacidade e acredita que o fim das chamadas públicas, por si só, já deverá contribuir para desafogar a ANP para outras tarefas.

Um outro passo esperado com o mesmo fim, segundo Manso, é a harmonização dos contratos de transporte — os diferentes agentes trabalham, hoje, com redações diferentes que demandam mais trabalho da ANP na análise da papelada. Facilitaria também para os usuários.

Os carregadores, aliás, estão costurando a criação de um conselho de usuários de gasodutos para monitorar os planos de investimentos e de expansão propostos pelos transportadores; a escolha da metodologia utilizada para o cálculo da capacidade física e comercial de transporte etc.

A iniciativa reúne o IBP, Abrace (grandes consumidores), ABPIP, Abraceel (comercializadoras) e Abraget (termelétricas).

Abrace. O diretor de gás da associação, Adrianno Lorenzon, conta que a ideia do conselho é, justamente, funcionar como uma via auxiliar da ANP na fiscalização do setor de transporte — sem, claro, a incumbência do regulador.

Agentes também tem recorrido à contratação de estudo de consultorias para acelerar algumas discussões na ANP. É o caso do gas release.

A Abrace recorreu à consultoria global Brattle Group para sugerir uma modelagem para o programa de desconcentração da oferta — tema que é objeto de estudo interno da ANP, mas que também está atrasado. “O mercado quer ajudar a ANP a destravar as regulações”, disse Lorenzon.

ABPIP. Está junto da Abrace nas pautas do gas release e conselho de usuários dos gasodutos. Os produtores independentes também acompanham com interesse os debates sobre o acesso de terceiros às infraestruturas essenciais — tema ainda embrionário na agenda da ANP.

“O mercado está andando lá na frente e a ANP vai ter que correr atrás”, afirma Anabal.

IBP. Mira com atenção discussões como a independência do transportador e a transparência das regras de acesso às infraestruturas essenciais e de tarifas de transporte — como, por exemplo, o que entra ou não na base de ativos regulatórios.

“Os players podem contribuir fomentando as discussões nos workshops e consultas prévias da ANP. E pressionar, quem tem a caneta, para que de fato a ANP receba os recursos que precisa. E lutar contra medidas que tentam diminuir a atuação das agências reguladoras”, conta a diretora de gás natural do IBP, Sylvie D’Apote.

Abegás. Entre as distribuidoras, a percepção é de que a pauta da ANP, muitas vezes, está “fora de sintonia” com as necessidades do mercado, diz o diretor de Estratégia e Mercado da Abegás, Marcelo Mendonça. Ele cita o caso das discussões sobre a especificação do gás.

“Mas essa medida só vai beneficiar os produtores caso a agência encontre uma maneira de fazer esse gás chegar em terra”, afirma.

A Abegás é uma das vozes mais ativas na defesa do aumento da infraestrutura de oferta de gás e combate a excessos na reinjeção. A associação aliás, é parte da Coalizão pela Competitividade do Gás Natural Matéria-Prima.

Mendonça defende que o Ministério de Minas e Energia lidere uma agenda de políticas públicas para aumentar a oferta de gás. “Não existe Novo Mercado de Gás sem aumento de oferta de gás novo”, comenta.

Colaborou Luiz Fernando Manso

Lista de pendências ‘invade’ 2024

A agenda regulatória do gás é bem ampla. Levantamento da epbr, comparando as agendas 2020-2021 (a primeira pós NMG) e 2022-2023, mostra que os atrasos são generalizados e há discussões que, em alguns casos, podem superar atrasos de quatro anos.

  • Gás Natural Liquefeito (GNL): Revisão da portaria 118/2000 que trata da distribuição de GNL a granel e construção, ampliação e operação dessas centrais de distribuição. Previsão de conclusão atual: agosto/2023. Previsão original (agenda 2020/2021): setembro/2021;
  • Distribuição de Gás Natural Comprimido (GNC): revisão da Resolução 41/2007. Previsão de conclusão atual: agosto/2023. Previsão original: setembro de 2021;
  • Interconexão e interoperabilidade de gasodutos de transporte: Elaboração de resolução nova. Previsão de conclusão: novembro/2023. Não constava na agenda anterior;
  • Ampliação de gasodutos de transporte: Revisão da resolução 37/2013, com critérios para caracterização da ampliação da capacidade. Previsão de conclusão: julho/2023. Previsão original: julho/2021;
  • Autonomia e de independência dos transportadores: Elaboração de ato normativo. Previsão de conclusão: fevereiro/2024. Previsão original: maio/2020;
  • Comercialização e carregamento: Revisão, para unificação das resoluções 52/2011 e 51/2013, e adequação de normas a novas disposições. Previsão de conclusão: julho/2024. Previsão original: de abril a julho/2021;
  • Tarifas de transporte: Revisão de critérios para cálculo das tarifas e receitas; definição de procedimento para aprovação das propostas de tarifas; e diretrizes para repasse de receita entre os transportadores interconectados. Previsão de conclusão: janeiro/2024. Previsão original: novembro/2020;
  • Códigos comuns de acesso: Ato normativo com diretrizes para elaboração conjunta de códigos comuns de acesso ao sistema de transporte pelos diferentes agentes. Previsão de conclusão: setembro/2024. Previsão original: fevereiro/2021;
  • Serviço de transporte: Revisão da Resolução 11/2016 que regulamenta a oferta de serviços pelos transportadores; a cessão de capacidade contratada sob a modalidade firme; a troca operacional de gás; a aprovação e o registro dos contratos de serviço de transporte; e a promoção das chamadas públicas para contratação de capacidade. Previsão de conclusão: novembro/2024. Previsão original: julho/2021;
  • Acesso às infraestruturas essenciais: Novo ato normativo que regulamenta o acesso não discriminatório e negociado de terceiros às infraestruturas essenciais. Previsão de conclusão: dezembro/2023. Não constava na agenda anterior;
  • Simplificação e padronização dos procedimentos de contratação de capacidade: Objetivo de dar celeridade às chamadas públicas. A ANP, inclusive, considera dispensar a obrigatoriedade desses processos para contratos firmes de gasodutos existentes. Previsão de conclusão: julho/2023. Não constava na agenda anterior;
  • Qualidade do gás natural: Revisão da Resolução 16/2008, com a especificação do gás comercializado no país. Previsão de conclusão: novembro/2023. Previsão original: Julho/2020.

Fora esses temas, há outras pautas, mais amplas, mas que impactam diretamente a produção de gás. Caso dos critérios dos preços de referência que baseiam o cálculo dos royalties; e a regulamentação dos planos de desenvolvimento dos campos — onde pode ser inserida, por exemplo, a discussão sobre os limites à reinjeção.

GÁS NA SEMANA

Portocem fecha contrato para construção de térmica no Ceará. Consórcio formado por Consag e Mitsubishi Power fornecerá os serviços de EPC da termelétrica Portocem (1.572 MW). Projeto vai consumir GNL da Shell e será abastecido por um novo terminal de regaseificação no Porto do Pecém. Diário do Nordeste

Prates defende gás no lugar do diesel. O presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, afirmou que o gás ainda é pouco explorado no Brasil como combustível da transição energética. E citou o potencial de substituição do diesel por gás nas frotas pesadas. “Isso tem duas funções para o Brasil: depender menos de diesel importado e também descarbonizar o transporte”, afirmou.

Governo, aliás, prorroga desoneração sobre o GNV. Gás veicular fica com impostos federais zerados por mais quatro meses.

Compagas testa GNV no transporte público no Paraná. Um ônibus movido a gás passou a integrar o transporte coletivo urbano da Região Metropolitana de Curitiba (PR). Parte do projeto de mobilidade sustentável da distribuidora com o governo estadual e a fabricante Scania.

Potigás volta a comprar gás da Petrobras. O contrato é válido por oito anos.  Serão entregues, imediatamente, este ano, 40 mil m3/dia à distribuidora potiguar. A partir de 2024, o volume sobe para 100 mil m3/dia.

Consumo de gás cai 24% em 2022, para 57,8 milhões de m3/dia. Queda reflete o menor despacho das termelétricas. O mercado não termelétrico, contudo, subiu 7,2%, para 45,08 milhões de m3/dia, puxado pelas indústrias (+7,2%) e GNV (+5,5%), segundo a Abegás.

NTS autorizada a pré-operar Gasig. Nova Transportadora do Sudeste obteve aval da ANP apara pré-operar o gasoduto Itaboraí-Guapimirim e, assim, capitalizar uma oportunidade de mercado — adquirindo o gás de empacotamento a preço competitivo (11% do Brent).

Governo pede que Petrobras suspenda venda de ativos por 90 dias. Solicitação inclui novos processos de desinvestimento e eventualmente aqueles em curso e não concluídos, desde que a interrupção dos negócios “não coloque em risco os interesses intransponíveis” da empresa. Lista de potencias negociações afetadas inclui TBG, Polo Bahia Terra e Polo Potiguar.

Independentes preocupadas. Os produtores defendem uma articulação entre os agentes da indústria de óleo e gás, junto ao governo Lula (PT), para garantir a continuidade da abertura do setor. Em especial, a venda de ativos da Petrobras e a diversificação do mercado de gás natural.

Importações de GNL da Europa cresceram 63% em 2022. Forte demanda europeia impulsionou os preços, levando o mercado mundial a duplicar seu valor em 2022, para US$ 450 bilhões, apesar de um crescimento de 6% no volume, diz a Agência Internacional de Energia. Para 2023, previsão é que o mercado mundial cresça 4,3%. AFP

EUA devem se tornar maiores exportadores de GNL do mundo em 2023. Segundo estimativas da Wood Mackenzie, o aquecimento da demanda global abre caminho para investimentos de US$ 100 bilhões no desenvolvimento de novos projetos, nos próximos cinco anos.

Shell compra maior produtor de biometano da Europa. Petroleira concluiu, semana passada, a aquisição de 100% das ações da Nature Energy Biogas, sediada na Dinamarca.

Compagas recebe 22 propostas em edital de compra de biometano. A distribuidora recebeu propostas de 12 empresas diferentes. Juntas, as propostas somam um potencial de fornecimento superior a 380 mil m³/dia.