Meio ambiente

Agro é principal emissor em 67% dos municípios brasileiros

Segunda edição do Seeg Municípios mostra que emissões não resultam em ganhos econômicos para as cidades

Seeg Municípios: Agro é principal emissor em 67% dos municípios brasileiros. Na imagem: Foto aérea de área preparada para monocultura ou pecuária, próxima a Porto Velho; em 07 de agosto de 2020 (Foto: Bruno Kelly/Amazônia Real)
Imagem aérea de área preparada para monocultura ou pecuária, próxima a Porto Velho (Foto: Bruno Kelly/Amazônia Real)

BRASÍLIA — Em 2019, o setor agropecuário foi o maior emissor em 67% dos municípios brasileiros, com destaque para a fonte gado de corte, mas os dez maiores emissores não estão entre aqueles com maior PIB Agropecuário.

Os dados fazem parte da segunda edição do Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa — Seeg Municípios.

Lançado nesta segunda (13/6) pelo Observatório do Clima (OC), o levantamento mostra que as emissões não resultam em ganhos econômicos para os municípios. A plataforma cruzou dados de emissão com o valor do PIB Agropecuário nos municípios apurado pelo IBGE.

“Os dez com maior PIB Agropecuário possuem o perfil de emissões e de uso do solo mais relacionados com atividades de produção agrícola, diferentemente dos dez que mais emitem, que têm atividades relacionadas com a pecuária. Isso demonstra como as escolhas de uso da terra influenciam as emissões nos municípios”, diz o OC.

A plataforma também aponta que, de 2000 a 2019, os dez municípios mais emissores aumentaram a área de pastagem em 2,13 milhões de hectares ao todo — ao invés de aproveitarem áreas já abertas — e mais da metade (56%) já encontra-se em algum estágio de degradação.

“Isso indica o potencial de recuperação dessas áreas, que podem se tornar mais produtivas e contribuir para a remoção de carbono, quando bem manejadas e sem a abertura de novos pastos”, explica a organização.

Dos dez municípios que mais emitiram no setor em 2019, a maior parte das emissões foi gerada no bioma Amazônia (64%), seguido por Pantanal (18%), Cerrado (11%) e Pampa (7%). No Pantanal, apenas dois municípios, Corumbá (MS) e Cáceres (MT), são responsáveis, juntos, por 49% das emissões no bioma.

Os municípios que mais emitiram no setor são os que apresentam os maiores rebanhos bovinos (corte e leite): o processo de digestão dos animais é o maior responsável pelas emissões de metano (CH₄), principal gás de efeito estufa do setor.

São Félix do Xingu, no Pará, que tem o maior rebanho do país, foi o que mais emitiu em 2019, totalizando 4,5 MtCO₂e, seguido por Corumbá (MS) e Vila Bela da Santíssima Trindade (MT), com 3,6 MtCO₂e e 2,4 MtCO₂e, respectivamente.

Amazônia concentra os maiores emissores

Oito dos dez municípios que mais emitem gases de efeito estufa no país estão na Amazônia, onde o desmatamento é a principal fonte de emissões.

Altamira e São Félix do Xingu, no Pará, lideram a lista, seguidos por Porto Velho (RO) e Lábrea (AM). São Paulo (5º) e Rio de Janeiro (8º) são os únicos de fora da Amazônia entre os campeões de emissões, neles, energia é a principal fonte.

De acordo com o Seeg Municípios, em 2019, esses dez municípios emitiram juntos 198 milhões de toneladas brutas de dióxido de carbono equivalente (MtCO₂e), mais do que todas as emissões de países como Peru e Holanda.

O Seeg calculou as emissões de gases de efeito estufa de todos os 5.570 municípios brasileiros, cobrindo duas décadas (2000-2019) e incluindo mais de uma centena de fontes de emissão nos setores de energia, indústria, agropecuária, tratamento de resíduos e mudança de uso da terra e florestas.

As emissões em Altamira (PA), líder do ranking, atingiram 35,2 MtCO₂e em 2019. Se fosse um país, o município do Pará seria o 108º do mundo em emissões, à frente de Suécia e Noruega, segundo dados do CAIT, o ranking global de emissões do World Resources Institute.

Na última década, as emissões na Amazônia se concentraram no sudoeste do Pará, em Porto Velho (RO) e Lábrea (AM). A maior parte dessas emissões é resultado do desmatamento.

Levantamento do MapBiomas, rede colaborativa de ONGs, universidades e startups, mostra que quase 98% dos alertas de desmatamento no Brasil desde janeiro de 2019 não possuem registro de ação de fiscalização ou autorização. Além disso, 98% do desmatamento na região tem indícios de ilegalidade.

Emissões per capita

A Amazônia também encabeça o ranking de emissões per capita, mostra o Seeg. Dos dez municípios com mais emissões por habitante, seis são de Mato Grosso, três do Pará e um do Amazonas.

“Em Novo Progresso (PA), por exemplo, epicentro do desmatamento no eixo da BR-163, foi registrada a décima maior emissão por habitante do país: 580 toneladas de CO₂e por ano, ou seja, 14 vezes a emissão de um cidadão do Qatar, o país com maior quantidade de carbono per capita do planeta”, destaca o OC.

“É como se cada morador de Novo Progresso tivesse mais de 500 carros rodando 20 km por dia com gasolina. A média global é de 7 toneladas de CO₂e ao ano por habitante”, completa.

Por outro lado, municípios amazônicos extensos com muitas áreas protegidas também têm grandes remoções de carbono.

De acordo com o levantamento, Altamira também é campeã de remoções. Maior município brasileiro em área, as remoções somaram 25,7 MtCO₂e em 2019, o que, para o OC, mostra a importância de criar e manter unidades de conservação e terras indígenas.

Desmatamento ameaça credibilidade de mercado de carbono

O setor de mudanças de uso da terra — onde está o desmatamento — é o que tem a maior participação nas emissões totais brutas do Brasil.

Em 2020, respondeu por 46% das emissões totais brutas, seguido por agropecuária (27%), energia (18%), processos industriais (5%) e resíduos (4%), de acordo com o Seeg.

Naquele ano, as emissões totais brutas do Brasil somaram 2,16 bilhões de toneladas de CO₂ equivalente, um aumento de 9,5% em relação a 2019.

Enquanto isso, o setor industrial — que responde por cerca de 10% das emissões do país — aguarda a definição do mercado brasileiro de carbono, peça fundamental da política ambiental para setores econômicos que precisam se financiar e exportar em um mercado cada vez mais exigente.

Em maio, o governo federal editou o decreto que cria o mercado regulado de carbono no Brasil, mas deixou diversas pontas soltas ao excluir a definição dos setores que deverão ter metas de redução de emissões de GEE, e frustrou parte do mercado que esperava que a regulação viesse com a aprovação do PL 528/2021, do deputado Marcelo Ramos (PL/AM).

O decreto estabelece que caberá ao governo federal propor os Planos de Mitigação das Mudanças Climáticas aos setores responsáveis pelos maiores volumes de emissões, e aprová-los em um comitê interministerial.

Além disso, ao listar os nove setores que fariam parte desse mercado, o governo deixou de fora o setor florestal.

Para a indústria, um ponto importante para dar credibilidade ao comércio de emissões é reverter a perda florestal e a degradação do solo até 2030, fomentando o desenvolvimento sustentável e promovendo uma transformação rural inclusiva.

“É certo que já não existe qualquer outra possibilidade de desenvolvimento que não seja ambientalmente correto, socialmente justo e economicamente viável”, afirma o CEBDS em uma carta aberta aos candidatos à presidência da República em 2022.

A carta também traz críticas ao modelo atual de gestão, em que “a preservação do meio ambiente e a garantia dos direitos humanos são, na maioria das vezes, preteridas pelo desenvolvimento econômico”.

“Isso provoca impactos nas presentes gerações e que também serão sentidos pelas futuras, em grau ainda mais profundo”, completa.

Os empresários afirmam que o mundo está em transformação para uma economia verde, mais limpa, inclusiva e atenta aos direitos humanos e que qualquer ação em direção oposta significa perda de competitividade, represálias comerciais e prejuízos ao mercado nacional.