É necessário avançar no processo de abertura e transparência dos custos do gás natural como forma de estímulo à concorrência
O processo de abertura e desverticalização do mercado do gás natural teve um enorme avanço a partir do TCC celebrado pela Petrobras com o CADE e da sanção da nova lei do gás.
A saída da Petrobras da atividade de transporte com as vendas da sua participação na NTS e na TAG e, mais recentemente, o arrendamento do TR-BA, Terminal de Regaseificação de GNL da Bahia e a venda da sua participação nas distribuidoras, com a saída da Gaspetro, constituíram etapas importantes desse processo.
No setor de petróleo, a venda de algumas refinarias e dos maiores campos produtores onshore no Nordeste, também ajudará a criar competição no segmento e a explicitar os custos dessa etapa do processo.
A chegada dos novos agentes nos diversos elos da cadeia e a entrada dos primeiros consumidores livres, desencadearam a necessidade de segregação dos custos da compra da molécula do gás natural (entregue na UPGN, no citygate em Corumba/MS ou no terminal de GNL) do serviço de transporte e do serviço local de gás canalizado prestado pelas distribuidoras.
Estas informações também precisam ser prestadas para o consumidor cativo pelas distribuidoras, mediante discriminação de cada parcela do custo na sua fatura, inclusive os impostos, de forma a possibilitar uma melhor avaliação da viabilidade e conveniência da sua migração para o mercado livre. Mas esse processo não pode parar por aí.
É fundamental avançar na abertura de custos das demais atividades, como o escoamento e o processamento do gás.
Essa é mais uma medida que servirá para gerar transparência e competitividade no setor e, certamente, redução dos custos, possibilitando que as atividades de escoamento, processamento e regaseificação também possam ser eventualmente desenvolvidas por outros agentes.
O valor cobrado pelo acesso não discriminatório de terceiros às infraestruturas essenciais estabelecido na lei, de forma negociada entre as partes ou por mediação da ANP, deverá ter como referência os custos de escoamento e processamento, mesmo enquanto essa atividade permanecer na titularidade de um produtor, ressaltando a importância da publicidade e transparência do código de conduta e prática de acesso à infraestrutura.
Sendo feita a separação das atividades de escoamento e processamento, outros agentes poderiam realizar investimentos em escoamento e tratamento de gás, aumentando a eficiência da infraestrutura e permitindo, por exemplo, que consumidores reservassem capacidade, ajudando a mitigar riscos ao produtor e viabilizando o escoamento de maior volume de gás à costa e, consequentemente, a sua oferta ao mercado brasileiro.
Dessa forma, além da apropriação e individualização dos custos de cada atividade efetivamente exercida, também deveremos ter a adequada correção dos seus valores de forma a remunerar os investimentos nas infraestruturas e os custos das suas operações e manutenções, de forma desvinculada do valor da molécula.
O custo de escoamento do gás do pré-sal com mais de 300km de extensão não pode ser o mesmo do gás a ser produzido em Sergipe, cujos campos estão a 100 Km da costa.
Nessa mesma linha de pensamento, o processamento de um gás com baixo teor de CO2 e poucos contaminantes não pode ter o mesmo custo do tratamento de um gás com especificação diversa.
O setor de transporte do gás natural também precisará adotar mecanismo de rateio que considere parcela de custo com base no critério locacional, especialmente quando a produção e o destino do gás estiverem no mesmo estado.
As tarifas de transporte de gás no Brasil representam uma importante parcela do custo total do gás que chega aos consumidores livres e distribuidoras, superior às médias internacionais, encarecimento este que afeta o mercado de gás brasileiro e que precisa ser equacionado com brevidade, mediante otimização do uso dessa infraestrutura.
Na medida em que cada custo dos diversos serviços passe a ser apurado de forma separada, teremos também destacada a parcela que representa o custo de produção da molécula na boca do poço.
A molécula deverá ter o seu valor e a sua correção vinculada à paridade internacional, com indexação a referências desse mercado ou a um indicador nacional a ser criado quando o mercado brasileiro tiver maturidade.
Na forma que hoje o mercado atua, o valor relativo às atividades de escoamento e de processamento do gás natural terminam por ser corrigidos com base em variação do Brent, Henry Hub ou JKM, quando deveriam ser calculados através de retorno do investimento e dos custos de operação e manutenção dos gasodutos de escoamento e UPGNs.
Nessa perspectiva, passaremos a ter uma maior previsibilidade do valor do gás, reduzindo a volatilidade de diversas parcelas do seu preço final, restando, entretanto, tratar as questões tributárias para evitar que a separação das atividades possa trazer alguma ineficiência e aumento de custo.
O país precisa criar mecanismos para estimular investimentos em infraestrutura para o escoamento de um maior volume de gás e as condições para atração de mais agentes para atuar nos diversos elos da cadeia.
Somente com o aumento da oferta de gás nacional teremos de fato competitividade nesse mercado.
O Brasil tem reservas de gás natural que possibilitam alcançar a autossuficiência e até mesmo passar a exportar GNL.
A evolução da produção nessa dimensão traria uma nova lógica econômica ao mercado, na medida em que passaríamos a ter, além da referência de preço de paridade do custo de importação de GNL, o parâmetro do valor do gás a ser pago ao produtor para liquefação e exportação de forma competitiva.
Isso certamente criaria um contexto favorável à redução do preço do gás natural no país e uma sustentável ampliação do mercado consumidor doméstico.
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Marcelo Menezes é superintendente executivo da Secretaria de Desenvolvimento Econômico do estado de Sergipe (Sedetec/SE).