RIO – A demanda emergente por combustíveis sustentáveis de aviação (SAF, em inglês) está ajudando a mostrar que os biocombustíveis são uma solução para o futuro e não uma tecnologia de transição, afirmou nesta terça (2/7), o embaixador André Corrêa do Lago, secretário do Clima, Energia e Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores.
Segundo Corrêa do Lago, as discussões sobre biocombustíveis estão sendo recebidas com “muito interesse” no grupo de trabalho sobre Transição Energética do G20, apesar da resistência ao tema por diversos países.
O Brasil ocupa em 2024 a presidência do grupo que busca construir consensos entre as 20 maiores economias do mundo.
“Um dos exercícios que o Brasil está fazendo é trazer muita informação, muita ciência, muito conhecimento para mostrar a contribuição que o biocombustível já pode dar. É uma tecnologia comprovada e que se aplica particularmente bem a alguns dos países do G20 e outros países em desenvolvimento ou desenvolvidos”, disse a jornalistas após participação em evento do T20, grupo paralelo ao G20 para discussões entre think thanks, no Rio de Janeiro.
Foco na bioeconomia
A bioeconomia é um dos temas prioritários para o Brasil durante a presidência do G20. A maior adoção de biocombustíveis como solução de descarbonização enfrenta uma resistência histórica sobretudo de países europeus, que evocam receios a respeito de insegurança alimentar e problemas de desmatamento.
Para o embaixador, é necessário “desmistificar” o tema, dado que relatórios da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) já comprovaram que a causa da fome não é a produção de alimentos insuficiente, mas sim a distribuição desigual.
“É inegável o impacto positivo que os biocombustíveis poderiam ter ao serem adotados por outros países. É uma solução barata, que se adapta a vários países e que tem uma tecnologia já comprovada”, defendeu.
O embaixador lembrou que esse mercado tem vivido avanços tecnológicos, como o desenvolvimento do etanol de segunda geração, que é produzido a partir do bagaço da cana-de-açúcar. Citou ainda o potencial do etanol para o transporte de hidrogênio.
“Há pouquíssimo conhecimento sobre os progressos que continuam sendo feitos com biocombustíveis, então tem sido uma discussão muito rica”.
Novos mercados
Uma das expectativas do Brasil é aproveitar o atual momento para avançar nas discussões sobre harmonização de regras e certificações para a bioenergia dentro da Aliança Global pelos Biocombustíveis (GBA, na sigla em inglês). A aliança é uma iniciativa entre Brasil, Índia e Estados Unidos para ampliar o mercado global de biocombustíveis.
Os dois países têm se mostrado alinhados aos pleitos do Brasil nos debates no G20, segundo o embaixador. Também são simpáticos a essas discussões Argentina, Indonésia e Emirados Árabes Unidos.
“Há uma nova compreensão da relevância dos biocombustíveis”, disse.
O exercício brasileiro de propor sugestões à agenda econômica e ambiental global deve ser seguido no próximo ano, quando o país vai ocupar a presidência dos Brics – grupo que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul – e vai sediar a COP30.
Segundo Corrêa do Lago, o diálogo ao longo deste ano está ajudando a sensibilizar os sherpas sobre o tema do clima. Os sherpas são enviados especiais dos chefes de Estado que conduzem as discussões prévias à Cúpula de Líderes de grupo.
Transição justa
Outro tema que tem sido levado pelo Brasil ao G20 é sobre a disponibilização de recursos financeiros para a descarbonização. O embaixador reconheceu que os países desenvolvidos têm grande relutância em disponibilizar os recursos financeiros que se comprometeram a fornecer.
“Os países ricos muitas vezes têm essa grande insensibilidade de não entender o que significa para o orçamento de um país em desenvolvimento juntar todas as agendas e mais a agenda climática. Porque os países ricos tiveram uma agenda de cada vez: primeiro, a questão social, depois a tecnológica, a educação, a saúde. Nós temos todas essas ao mesmo tempo e a climática junto”.
Ele lembrou, inclusive, que muitos países em desenvolvimento também estão destinando recursos próprios para redução das emissões e que não condicionam esses esforços aos recursos internacionais.
Margem Equatorial
No cenário doméstico, o embaixador enxerga ainda que há espaço para discutir a exploração de petróleo na Margem Equatorial. Corrêa do Lago defendeu que o debate seja científico e informado e que leve em consideração o uso futuro dos recursos.
“Eu acho que há espaço para esse debate, porque se os Estados Unidos produzem petróleo, se a Noruega produz petróleo, se o Reino Unido produz petróleo, como é que essa lógica se aplica a um grande país em desenvolvimento como o Brasil?”.
A exploração da região que fica na costa do Norte e Nordeste do país está em evidência depois que o Ibama negou em 2023 um pedido de licença da Petrobras para perfurar um poço exploratório na Bacia da Foz do Amazonas. A estatal recorreu, mas ainda não há conclusão.
“É um tema que tem que ter um certo consenso nacional, porque, afinal, vai ser uma política de Estado, não vai ser apenas esse governo”, acrescentou.