O governo federal é capaz de adotar medidas para que o custo da energia da usina nuclear de Angra 3 (RJ) fique abaixo de R$ 500 por MWh, abaixo de outras térmicas contratadas hoje, defende o presidente da Associação Brasileira para o Desenvolvimento de Atividades Nucleares (Abdan), Celso Cunha.
O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) confirmou, em nota esta semana, que estão em curso debates para ampliar as reduções na tarifa final da usina.
Algumas das medidas defendidas pela associação para manter a tarifa nesse nível incluem a redução das taxas de retorno dos bancos públicos que financiam o projeto, além da retomada do programa Renuclear, que isentava projetos nucleares da cobrança do IPI e do Imposto de Importação, mas foi suspenso no governo Bolsonaro.
As propostas da Abdan foram levadas ao Ministério de Minas e Energia (MME) e ao BNDES, que é responsável por contratar os estudos independentes sobre a conclusão do empreendimento.
A Frente Parlamentar de Atividades Nucleares defende que a discussão ocorra por meio do PL 1379/23, apresentado por Julio Lopes (PP/RJ) e que restabelece o Renuclear.
Em paralelo, a Abdan está se movimentando para incluir a fonte nuclear no texto do projeto de lei que cria o Programa de Aceleração da Transição Energética (Paten) durante as discussões no Senado.
O programa prevê o uso de créditos de empresas junto à União como garantia para financiamento de projetos sustentáveis. Cunha explica que a sinalização é importante para demonstrar que o país considera a energia nuclear como uma fonte de energia “limpa”.
TCU estima R$ 43 bi para concluir Angra 3
Em construção desde a década de 1980, Angra 3 pode ser a maior usina nuclear do país, com capacidade de 1,4 gigawatt (GW).
Na quarta-feira (12/4), o Tribunal de Contas da União (TCU) avaliou a viabilidade da retomada das obras da usina e concluiu que a usina vai custar R$ 43 bilhões a mais do que outras fontes e representaria um aumento médio 2,9% nas tarifas das distribuidoras para os consumidores.
Entretanto, a Eletronuclear, que opera as usinas nucleares brasileiras, rebateu os cálculos do TCU, pois afirma que o tribunal usou como base um relatório preliminar apresentado pela a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) ao Ministério de Minas e Energia.
A EPE também se posicionou sobre o tema e ressaltou que o informe usado pelo TCU foi elaborado em janeiro de 2023, considerando as informações disponíveis naquele momento, o que ainda não incluía os estudos independentes sobre o tema.
O BNDES confirmou, em nota, que as modelagens feitas desde o final de 2022 levaram a uma redução no preço da energia proposto para a usina. O banco também confirmou que ainda avalia outras medidas para reduções adicionais no custo.
A Abdan afirma que a conclusão do TCU leva em consideração uma comparação entre fontes com características distintas.
“Não é possível comparar coisas diferentes. As fontes solar e eólica são intermitentes”, diz Cunha.
Os estudos independentes sobre a conclusão de Angra 3 foram encomendados em 2019, durante o governo de Jair Bolsonaro, quando o projeto foi incluído no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI).
Uma primeira versão foi concluída pelo BNDES e entregue em novembro de 2022 à Eletronuclear e ao Tribunal de Contas da União (TCU). Com a troca de governo, em 2023, foi necessário encomendar uma revisão, que está quase finalizada.
Segundo Cunha, a reunião do TCU ocorreu um dia depois da entrega pelo BNDES ao MME de uma versão preliminar da análise independente, que deve ser concluída até julho. Os estudos estão sendo conduzidos pela Tractebel, do grupo Engie.
A decisão final sobre a usina ficará a cargo do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), que vai estabelecer o preço final da tarifa e concluir se autoriza a outorga do projeto.
Estudos elaborados pela Abdan apontam que a conclusão da usina poderia reduzir os custos da energia elétrica para os consumidores finais em 3,8% em períodos de hidrologia ruim, ou seja, de menor geração nas hidrelétricas.
Já em momentos de alta geração hidrelétrica, o impacto seria de um aumento de 1,3% aos consumidores finais de 2029 até 2045.
Já uma análise realizada pelo Instituto Escolhas em parceria com a consultoria PSR em 2020 apontou que o custo da energia gerada em Angra 3 seria menos competitivo do que o de 11 outras fontes.
Desde então, no entanto, houve alterações nas premissas usadas no estudo, que considerava que os custos para abandono da obra seriam de R$ 11,92 bilhões e para a conclusão da usina, de R$ 15,5 bilhões. Além disso, também houve grande variação no câmbio. Cerca de 35% dos custos do projeto são em moeda estrangeira.
Os defensores da conclusão do projeto argumentam que a fonte nuclear não tem emissões de gases de efeito estufa e funciona como energia de base, que pode dar segurança ao sistema elétrico em meio à ampliação da geração variável, com as fontes intermitentes como solar e eólica.
Além disso, apontam que a retomada das obras da usina vai dar estabilidade à cadeia produtiva do setor nuclear no país. Argumentam ainda a contribuição do projeto para o desenvolvimento da tecnologia nuclear para outros usos no país, como na agricultura e na área médica.
O presidente da Abdan afirma que o ponto de equilíbrio econômico da Indústrias Nucleares do Brasil (INB), estatal responsável pela mineração de urânio, somente será atingido se o país tiver três usinas nucleares em funcionamento. Ele lembra que o Brasil tem a sexta maior reserva de urânio do mundo e está entre os poucos países que dominam o ciclo do combustível nuclear.
“Angra 3 tem uma caraterística de estabilidade no centro de carga do país”, diz.
Um dos pleitos da associação é que a usina seja incluída no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). No momento, consta no PAC apenas o estudo de viabilidade técnica, econômica e socioambiental do projeto, sem previsão de conclusão das obras.
A construção de Angra 3 teve início na década de 1980, mas foi interrompido em 1984 e, após breve retomada em 2009, foi novamente pausado em 2015, na esteira dos desdobramentos da Operação Lava Jato. O ex-presidente Michel Temer e o ex-ministro de Minas e Energia Moreira Franco foram acusados de desvios em contratos da usina.
Com 65% de avanço no projeto, no momento, a Eletronuclear conduz as obras do plano de aceleração do caminho crítico, que visam preparar a área para a chegada da companhia que fará o projeto, engenharia e construção (EPC) para concluir a usina. O edital do contrato para o EPC está em consulta pública, com previsão de término em 26 de abril.