RIO – A Ponte Nova Comercializadora de Gás recebeu, este mês, sua primeira autorização da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) para importação de gás natural da Bolívia, de olho no desenvolvimento de um novo projeto termelétrico.
O plano é ancorar, na usina, um volume para trazer gás a preços competitivos também para clientes industriais.
A empresa é o braço de comercialização de gás da desenvolvedora de projetos Ponte Nova Energia e foi autorizada a importar 4 milhões de m3/dia – o volume de fato a ser importado dependerá, ao final, da demanda que a companhia conseguirá desenvolver.
A comercializadora está de olho em oportunidades no Sudeste e Centro-Oeste, com foco no Mato Grosso do Sul, por onde chega o gás da Bolívia.
O presidente da Ponte Nova, Paulo Monteiro, conta que a companhia mira oportunidades nos leilões de reserva de capacidade, na forma de potência. A empresa também está de olho na contratação compulsória das termelétricas prevista na lei de privatização da Eletrobras (14.182/2021). Nesse caso, porém, a fonte do gás não deve ser a Bolívia.
Plano é associar demanda térmica com industrial
Em paralelo ao desenvolvimento da térmica, a Ponte Nova quer construir uma base de clientes industriais para absorver parte do gás importado, dado o caráter flexível da demanda termelétrica.
“Como importar gás para uma térmica flexível? Tem que ter toda uma estratégia montada”, afirmou o executivo. Ele foi fundador da MPX, que veio a se tornar a Eneva. Era o braço de geração de energia, criado por Eike Batista – uma das poucas a florescer após a quebradeira do grupo.
“Acreditamos que vamos ter competitividade, mas não é fácil montar um preço de venda com todas as incertezas que se tem pela frente”, acrescentou Monteiro, sem entrar em maiores detalhes sobre a estratégia para tornar o gás competitivo para a indústria.
Bolívia e futuro das térmicas são incertos
A partir do aval da ANP, o passo seguinte será concluir as negociações com os bolivianos – atualmente em andamento.
Embora a Ponte Nova tenha obtido autorização para importação já a partir de 2024, Monteiro afirma que ainda é prematuro traçar uma previsão de início do fornecimento. Algo no curto prazo, segundo ele, não está no planejamento.
“Mas também não é uma coisa que vá acontecer só a longo prazo. É uma questão de se aproveitar as janelas de oportunidade”, disse.
O executivo destaca que a Ponte Nova busca um “trabalho de aproximação” com a Bolívia.
Ele se diz otimista com a retomada dos investimentos para reversão do declínio da produção boliviana e que a companhia está, desde já, se posicionando no mercado acreditando nesse cenário.
“Em algum momento, vai começar de novo o desenvolvimento desse gás na Bolívia… Os poços estão depreciados e precisam de investidores, mas o gás existe. Acreditamos que haverá investimento na produção de gás”, comentou.
A estatal boliviana YPFB anunciou, na semana passada, planos de investir US$ 277 milhões em 2024, sendo mais da metade – US$ 159 milhões – em exploração. A atual gestão conduz, desde 2021, um plano para recuperar o atual declínio de sua produção.
A redução dos investimentos em exploração na Bolívia, ao longo de anos, cobra o seu preço hoje: o país vive dificuldades de repor suas reservas e negociou com a Petrobras a flexibilização dos envios.
Em 2023, a Wood Mackenzie publicou um relatório em que projeta um declínio da produção mais rápido do que o esperado no país vizinho – que, na virada da década, pode passar a ser importador de gás, se não houver sucesso exploratório no país.
O presidente da Bolívia, Luis Arce, chegou a afirmar no ano passado que a produção de gás do país “chegou ao fundo”. A produção da estatal YPFB caiu de 59 milhões de m³/dia para 37 milhões de m³/dia em nove anos.
O momento também é de incertezas sobre o futuro das contratações de térmicas, depois de um 2023 sem novos leilões de reserva. O setor ainda aguarda uma definição do governo Lula sobre o calendário de licitações.
Para 2024, estão previstos, originalmente, um leilão na forma de energia de reserva (segundo os termos da lei 14.182/2021), para julho; e um leilão de reserva de capacidade, na forma de potência, para novembro. Os editais ainda não foram publicados.
No fim de 2023, a Câmara aprovou, no projeto do marco legal das eólicas offshore, mudanças na contratação das térmicas.
O texto, ainda em tramitação no Senado, renova o compromisso com a contratação das térmicas a gás previstas na lei de privatização da Eletrobras, embora numa quantidade menor, e traz mudanças na forma de cálculo do preço-teto das térmicas, para torná-las mais atrativas nos leilões.
O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, já afirmou que o governo pretende tratar do assunto por medida provisória. O mercado ainda aguarda a publicação da MP.
Monteiro, contudo, acredita que os leilões sairão do papel: “Para se fazer transição energética, tem que fazer com que o Operador Nacional do Sistema, o ONS, tenha nas suas mãos as condições de segurar as intermitências”, comentou.
Ponte Nova também mira interiorização do gás
A empresa também está de olho nos leilões de contratação compulsória das termelétricas prevista na lei de privatização da Eletrobras, mas que a Ponte Nova mira, nesse caso, “outras portas” de acesso ao gás que não a Bolívia.
A desenvolvedora de projetos chegou a cadastrar, no primeiro leilão das térmicas locacionais, em 2022, projetos no Piauí e Maranhão, mas sem sucesso.
Os projetos tinham como premissa a importação de gás natural liquefeito (GNL) via Pecém (CE), pelo terminal que seria construído pelo consórcio Portocem, liderado pela Ceiba Energy, mas que não se viabilizou. Monteiro afirma que a empresa tem outras alternativas de originação do gás em avaliação.