Energia

Geradores e distribuidoras se unem às indústrias contra contratação obrigatória de térmicas e PCHs

Após aprovação de emendas em projeto das eólicas offshore, temas são aguardados em medida provisória

Geradores e distribuidoras de energia se unem às indústrias contra contratação obrigatória de usinas térmicas e PCHs. Na imagem: Parlamentares assentados durante sessão no Plenário da Câmara dos Deputados, fotografada do alto, na Galeria (Foto: Bruno Spada/Agência Câmara)
Sessão no Plenário da Câmara dos Deputados (Foto: Bruno Spada/Agência Câmara)

RIO – Batizado de Transição Energética Justa, um grupo formado por oito entidades do setor elétrico tenta convencer o governo Lula e o Congresso Nacional a recuar com as medidas colocadas como emendas no projeto das eólicas offshore: uma regulação de preço de gás para viabilizar térmicas, contratações de PCHs, dentre diversas outras.

O texto do PL 576/2021 está no Senado, após ter passado na Câmara com apoio da base do governo federal – foram mais de 400 votos. Para a próxima semana, contudo, o presidente Lula deve assinar a medida provisória, inicialmente para reduzir tarifas de energia elétrica, mas que deve incorporar ao menos parte dos textos do PL das eólicas.

“Essa contratação não possui respaldo técnico, ou seja, não passa pelo crivo dos estudos de planejamento”, criticou o CEO da PSR, Luiz Augusto Barroso, nesta quinta (14/12). A consultoria foi contratada pelas entidades para subsidiar o cálculo dos impactos das emendas na “bolha tarifária” do país.

Custo de R$ 25 bilhões por ano

Estima que o custo anual das medidas até 2050 será de da ordem de R$ 25 bilhões por ano, com um impacto tarifário de 11% na conta de luz e, portanto, reflexos inflacionários.

Barroso abriu a coletiva de hoje afirmando que falava também como ex-presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE).

“Desorganiza a governança institucional do país, ao transferir para o Legislativo a atividade de planejamento energético, que é de responsabilidade do poder concedente”, disse.

As críticas foram reforçadas por Luiz Eduardo Barata, presidente da Frente Nacional dos Consumidores, que criticou o Ministério de Minas e Energia (MME) pela falta de interlocução com os consumidores.

Além da frente, o grupo é composto pela ABCE (empresas de energia), consumidores (Anace e Abrace), comercializadores (Abraceel), distribuidores de energia (Abradee), geradores (Abrage) e produtores independentes (Apine).

Articulação no Congresso

O PL 11247/2018, aprovado na Câmara, foi mais um capítulo da privatização da Eletrobras: os leilões de 8GW de térmicas a gás natural tem um teto de preço na lei que liquidou o controle da maior empresa do país em 2021.

A tentativa de viabilizar os projetos voltou ao Congresso Nacional com medidas para garantir que o preço futuro do gás natural seja contabilizado no preço-teto da energia e, assim, viabilizar a contratação de térmicas em locais que ainda dependem da construção de gasodutos.

O estudo da PSR calcula que o projeto poderia aumentar as tarifas de energia em R$ 25 bilhões por ano, caso seja aprovado.

Segundo Barroso, o cenário levaria a uma alta de 11% no custo de energia, com impactos na inflação, no poder de compra da população e na competitividade industrial do país. A estimativa é que o acréscimo seja igual para o mercado livre e para consumidores cativos.

Foram considerados no cálculo:

  • Novos preços para contratação compulsória de térmicas a gás inflexíveis;
  • Postergação do prazo para renováveis entrarem em operação, com subsídio;
  • Postergação do prazo para geração distribuída entrar em operação com subsídio;
  • Contratação compulsória de PCHs;
  • Novas condições para extensão dos contratos do Proinfa por 20 anos;
  • Construção de projeto de hidrogênio;
  • Manutenção da operação de térmicas a carvão até 2050;
  • Contratação compulsória de eólicas no Sul

Desorganização do sistema elétrico

O cenário pode ter um peso de R$ 660 bilhões por ano nas contas de luz até 2050, segundo a PSR.

Outra simulação, publicada hoje (14/12) pela TR Soluções, estimou que as medidas podem provocar uma alta média de 2,29% a 8,78% nas tarifas de energia, a partir de 2027. Considera que as emendas, combinadas, terão um impacto da ordem de R$ 35 bilhões por ano.

Barroso afirmou que as medidas propostas vão levar a um excesso de oferta de energia no sistema, além de deslocar outras fontes mais limpas e baratas da matriz elétrica nacional. O impacto nas renováveis ainda vai ser analisado em uma segunda fase do estudo.

“Essa combinação cria, por definição, a possibilidade de deslocar fontes mais competitivas, que sejam mais interessantes para o sistema, sob todas as lógicas”, disse o consultor.

Articulação no governo federal

Segundo representantes das entidades, os dados serão levados aos ministérios de Minas e Energia, da Fazenda e à Casa Civil, assim como aos parlamentares.

A expectativa, afirmam, é que o estudo ajude a fazer com que as medidas sejam revertidas durante a discussão no Senado.

“Não houve tempo suficiente para o assunto ser discutido com a devida e necessária avaliação”, disse o presidente da Abradee, Marcos Madureira.

Representantes das entidades presentes na entrevista coletiva criticaram a atuação do Congresso Nacional na concessão de benefícios que aumentam os custos de energia no país.

Luiz Barata afirma que a situação é resultado da atuação de grupos de interesse junto aos parlamentares, assim como o desconhecimento dos deputados e senadores dos impactos que as medidas teriam nos preços de energia.

“É preciso que se faça um debate amplo com a sociedade antes de uma decisão com esse impacto tão forte”, acrescentou Fernando Teixeirense, da Abrace.

Tarifas do Amapá

Também existe a expectativa de que o material elaborado pela PSR contribua para as discussões sobre a medida provisória que vai atenuar o aumento de 44% previsto nas tarifas de energia do Amapá, que deve ser assinada pelo presidente Lula na segunda-feira (18/12).

Em entrevista à agência Infra esta semana, o ministro de Minas e Energia disse que a expectativa é tratar por meio de medida provisória o tema da contratação das termelétricas previstas na MP de privatização da Eletrobras.

“A nossa expectativa é que esse trabalho, que obviamente tem um foco direcionado para os senadores, sirva também de subsídio para o MME em qualquer iniciativa que não seja para tratar questões de redução do custo da energia, através de medidas provisórias”, afirmou Barata.

Ele disse ainda que as entidades têm encontrado dificuldades em debater os temas com o MME. “Pedimos três audiências ao ministro [Alexandre] Silveira, mas ainda não fomos atendidos. Temos procurado uma interlocução com a secretaria-executiva, mas também não fomos atendidos”, disse.

Com Hanrrikson de Andrade