Offshore

Descomissionamento de plataformas multiplica desembolso com seguros

Petroleiras devem ampliar de R$ 7 bilhões para R$ 80 bilhões os valores garantidos para desmontar unidades de produção

Descomissionamento de plataformas de petróleo e gás no Brasil multiplica desembolso das petroleiras com seguros garantia. Na imagem: Petrobras realiza a desancoragem do FPSO P-32, no Campo de Marlim, na Bacia de Campos, que será descomissionado pela Ecovix e Gerdau (Foto: Agência Petrobras)
Petrobras realiza a desancoragem do FPSO P-32, no Campo de Marlim, na Bacia de Campos (Foto: Agência Petrobras)

O avanço do descomissionamento de campos de petróleo e gás no Brasil tem levado a um aumento das despesas das petroleiras com itens que não estão diretamente ligados a essa atividade, mas que também são necessárias para realizá-las, como a contratação de seguros e outros serviços bancários.

Em 2022, a soma do seguro contratado pelas petroleiras para o descomissionamento foi de R$ 7 bilhões em valores garantidos. Em 2023, pode ultrapassar R$ 80 bilhões, segundo o diretor comercial de novos negócios da corretora de seguros Galcorr, Fernando Prado.

Com a aproximação do fim da vida útil dos campos brasileiros que começaram a ser desenvolvidos nas décadas de 1980 e 1990, a tendência é de aumento no valor total segurado para desmontar as estruturas antigas.

Impacto em outras atividades

A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) prevê o direcionamento de R$ 57,1 bilhões para descomissionamento entre 2023 e 2027. Nos cálculos do consultor Mauro Destri, pode haver um impacto na economia nacional até 30% maior do que o valor previsto pela agência.

Segundo ele, o desmonte das estruturas dos campos impacta pelo menos outras 54 atividades econômicas para além das previstas nos planos de descomissionamento, incluindo atividades bancárias, de seguros e manutenção de sondas, por exemplo.

“Existe todo um outro mundo de atividades, que podem gerar empregos, como contabilidade, tributação, direito”, diz.

Destri lembra o exemplo recente da P-32, unidade que produziu na Bacia de Campos foi descomissionada e leiloada pela Petrobras em julho. O leilão da plataforma foi vencido pela Gerdau, em parceria com a Ecovix.

A estatal realizou, na última quinta-feira (23/11), a desancoragem da P-32, do Campo de Marlim, na Bacia de Campos, e no sábado (25/11) iniciou a navegação da plataforma para o estaleiro. A unidade será desmontada no estaleiro Rio Grande (RS), para posteriormente ser usada como matéria-prima na produção de aço. As companhias estimam a geração de 300 empregos diretos no desmonte da unidade.

Outras 11 unidades flutuantes seguirão nos próximos 5 anos a mesma diretriz.

No caso da contratação de seguros, o alto valor desembolsado para o descomissionamento se dá porque a garantia para essas atividades é exigida pela ANP, de modo a assegurar que o desmantelamento dos campos seja executado mesmo em casos de problemas com os operadores das áreas. A agência define anualmente o valor a ser garantido por cada operadora de acordo com o campo.

“A garantia de descomissionamento segue um crescimento numa fórmula prevista em lei. Quanto mais perto estiver do fim da vida útil dos campos, maior tem que ser o valor garantido”, explica Prado.

Pequenas recorrem a seguro garantia

A garantia financeira dada pelo seguro no caso do descomissionamento pode ser apresentada de outras formas além do seguro, como uma garantia bancária, por meio de uma carta de fiança emitida por um banco, ou por uma garantia corporativa, baseada na avaliação de crédito da empresa.

Prado explica que a opção do seguro garantia para essas atividades têm ajudado companhias menores, pois tende a ser uma opção mais barata.

“O seguro-garantia possibilitou a entrada de diversos players no Brasil”, afirma.

Como funciona?

O seguro garantia para o descomissionamento visa garantir que as estruturas de produção de petróleo sejam desmontadas mesmo que ocorra algum problema com a operadora do campo. No seguro garantia existem três participantes: a seguradora; o tomador, que é a petroleira; e o segurado, que é a ANP. Uma vez que a apólice é emitida, o tomador não tem mais influência no processo e toda mudança na apólice tem que ser solicitada pela ANP.

A agência pode executar o seguro quando ocorrer um sinistro, como no caso de uma petroleira falir, por exemplo. Quando ocorre a execução, a seguradora paga a ANP para realização das atividades de descomissionamento. Se a apólice não for executada e a petroleira realizar o descomissionamento, ao término do contrato a ANP avisa a seguradora que pode encerrar a apólice.

Para além do descomissionamento, o mercado de seguros para outros riscos no setor de petróleo, como danos materiais, também tem crescido no país. Prado aponta que, nos últimos 12 meses, esse mercado chegou a R$ 2 bilhões em prêmios pagos às seguradoras. O Brasil se beneficia do fato de não ter incidência de catástrofes naturais como terremotos, o que faz com que a taxa inicial seja mais barata para esse tipo de operação do que em outros países.

“Antes, isso era algo muito novo, mas esse valor [dos últimos 12 meses] foi significativo”, diz.

Transição energética dificulta financiamento

No mercado global, Prado aponta que a aceleração da transição energética e a dificuldade de petroleiras de obter financiamentos tende a dar impulso também aos seguros garantia para a obtenção de recursos para a realização de projetos. Nessa modalidade, pode haver um adiantamento do pagamento do financiamento, de modo a assegurar as operações.

“Existem alguns formatos em que é necessário um aporte ou uma antecipação de recebíveis pelo contratante dos projetos, na construção de plataformas e de dutos, por exemplo. Existe uma dificuldade global de capacidade financeira para financiar grandes projetos de óleo e gás”, afirma.

As mudanças climáticas, inclusive, também têm aumentado o interesse por seguros paramétricos, aqueles que protegem o segurado de prejuízos causados por comportamentos do clima diferentes do esperado. No entanto, a contratação dessa modalidade ainda é pouco usual e está muito concentrada em segmentos ligados ao agronegócio, segundo Prado.

“É um seguro que ainda está em desenvolvimento, é uma coisa muito pouco utilizada”, diz.

Renováveis têm desafios

Já no setor de energia elétrica, a tendência é de contratação de seguros para proteger o plano de negócios de projetos de geração renovável, como eólica e solar. É possível contratar apólices que garantam a incidência de ventos ou de sol média de uma região, por exemplo, de modo a garantir o fluxo de caixa dos projetos.

“É possível ‘cobrir o sol’ nesse cenário. Mas não é muito comum, ainda é algo muito caro e pouco explorado aqui no Brasil. É um desafio para o mercado de seguros criar uma percepção de valor maior para os produtos, mostrar a transferência de risco”, afirma o diretor da Galcorr.

Outra grande dificuldade, nesse caso, é o mercado de seguros acompanhar a evolução das tecnologias. Projetos de novas modalidades, como placas fotovoltaicas flutuantes e eólicas offshore, tendem a ter maior dificuldade na precificação e menos opções de seguros, por exemplo.