Biocombustíveis

Combustível do Futuro: busca será pelo menor custo, diz diretor da GOL

Limite de emissão para aviação dispara corrida pelo menor custo por carbono evitado

Eduardo Calderon, diretor do Centro de Controle de Operações (CCO) e Engenharia da GOL (Foto: Divulgação GOL)
Eduardo Calderon, diretor do Centro de Controle de Operações (CCO) e Engenharia da GOL (Foto: Divulgação GOL)

BRASÍLIA — Com compromisso internacional de atingir a neutralidade de carbono até 2050, a brasileira GOL está em busca de um combustível eficiente energética e ambientalmente e defende que o Brasil avance em uma política de incentivos para ajudar as companhias aéreas na transição energética.

Em entrevista à agência epbr, Eduardo Calderon, diretor do Centro de Controle de Operações (CCO) e Engenharia da GOL, conta que a companhia é agnóstica em termos de matérias primas para o combustível sustentável de aviação (SAF, em inglês) e está mais preocupada com o custo e a eficiência do produto.

“Pode ser uma rota ATJ, Fischer-Tropsch, até o e-SAF, desde que feche as contas no final. Somos agnósticos em termos de matérias-primas e processos. A busca é por eficiência energética e de custo. Mas é fundamental que exista uma política pública que permita fazer essa transição da maneira mais suave possível”, explica.

De autoria do governo federal, o projeto de lei do Combustível do Futuro (PL 4516/23) traz um mandato para as companhias aéreas reduzirem suas emissões em 1%, a partir de 2027, usando o SAF.

A rota é livre. As empresas podem escolher o produto que tiver o melhor custo-benefício dentre os disponíveis no mercado – e o percentual de mistura vai variar com a capacidade de descarbonização do combustível.

Na visão de Calderon, rotas mais eficientes em termos de emissões devem ganhar competitividade nesse modelo.

“Quando você tem uma rota mais eficiente o custo [de produção], naturalmente, vai ser maior. Mas nossa expectativa é que a rota mais eficiente tenha um custo menor [para o operador] porque eu preciso adicionar um volume menor para chegar no percentual de descarbonização definido”, diz.

“Se você precisa de 2% de um determinado produto para poder fazer essa descarbonização de 1%, e 3% do outro, melhor usar o de 2% porque as diferenças de preço não vão ser tão diferentes assim”, explica.

O papel do hidrogênio

Um dos insumos para a produção do SAF, o hidrogênio usado hoje no refino convencional é o cinza, de origem fóssil (gás natural), mas os projetos de biorrefino no mundo estão integrando o hidrogênio verde (eletrólise com renováveis) nos processos, em busca de uma intensidade de carbono cada vez menor.

Embora não haja um impedimento para uso do hidrogênio cinza nos novos combustíveis de aviação, a tendência é que os produtores adotem o verde como insumo, em busca dessa relação – menor custo por redução de carbono.  

“O que importa é quanto você consegue descarbonizar na rota como um todo. Se você tiver um hidrogênio renovável vai ser uma rota mais eficiente, mas hoje, como o custo é muito alto, às vezes acaba não compensando”, observa o executivo.

O custo, aliás, é a grande questão para a indústria.

“Hoje, o SAF é três a quatro vezes mais caro do que o combustível convencional fóssil. E o QAV já representa em torno de 40% do nosso custo”. 

Calderon calcula que cada 1% de adição de SAF ao querosene fóssil representa um aumento de 3% na despesa total com combustível.

“É muito significativo. Por isso temos uma preocupação muito grande em saber como é que o governo pensa em fazer essa transição energética. É uma preocupação de todos os setores”.

Incentivos para o consumo

O Brasil ainda não tem produção de SAF, mas os primeiros anúncios de investimentos já começaram a aparecer: BBF na Zona Franca de Manaus, Acelen na Bahia e Petrobras.

O setor de etanol também avalia entrar nesse mercado, com a rota ATJ. Em agosto, a Raízen anunciou a certificação do seu biocombustível para produzir SAF.

Embora a produção ainda esteja dando os primeiros passos no país, a GOL vê o início do mandato em 2027 factível – desde que o governo forneça uma política pública que viabilize o consumo.

“O problema do SAF é aquele do ovo e da galinha. Quem vem primeiro? Não tem investimento em biorrefinaria porque não tem demanda, mas também não tem demanda porque não tem oferta. Ficamos nesse looping e ninguém consegue sair do lugar”, diz o diretor da GOL.

Ele cita exemplos de algumas regiões que já estão mais avançadas nesse sentido, como Europa e Estados Unidos.

A Europa tem um modelo de mandato. Com datas e percentuais obrigatórios de misturas estipulados até 2050, o que dá uma certa previsibilidade para oferta e demanda planejarem seus investimentos.

Por outro lado, a passagem corre o risco de sair mais cara, com o preço do combustível aumentando enquanto a paridade do renovável com o fóssil não chega.

“O modelo dos EUA é diferente. Traz essa conta da transição energética em um bolo maior em que toda a sociedade participa”.

“O governo criou isenções de taxa, um incentivo fiscal para o produtor do SAF, que faz com que, hoje, o valor do SAF nos Estados Unidos versus o valor do jet fuel fique, mais ou menos, no mesmo nível. Isso tem incentivado investimentos no aumento da produção”.

Política híbrida no Brasil

Para Calderon, o PL do Combustível do Futuro tenta dar algum tipo de segurança jurídica aos fornecedores, para que eles comecem a investir no biorrefino, mas ainda não está claro qual modelo será adotado pelo Brasil. 

Embora o PL 4516/23 proponha um mandato de redução de emissões com uso do SAF, o executivo considera que falta uma indicação do que será feito para lidar com o custo da transição.

“A gente entende que o modelo dos EUA, nesse processo de transição energética, faz mais sentido do que um modelo só de mandato”. 

No caso do Brasil, que não tem um espaço fiscal como o dos Estados Unidos para lançar mão de enormes subsídios, e cujas dimensões continentais também induzem a um uso cada vez maior do transporte aéreo, Calderon acredita que o ideal seria optar por um modelo híbrido. 

“Em um modelo só de mandato o incremento de custo vai ser muito alto, começa a ter um custo muito alto das passagens. Em um país de dimensões continentais como o Brasil, isso faz muita diferença”, explica.

Ele defende, assim, a criação de um incentivo para o consumidor, no caso, as companhias aéreas, o que funcionaria também como um estímulo para os produtores investirem no biorrefino.

“Tem que ter algum tipo de incentivo fiscal, que faça com que os custos [entre fóssil e renovável] fiquem mais parecidos, mais equilibrados. O que a gente quer é que haja incentivo para as companhias aéreas comprarem o produto e, com isso, o produtor começar a produzir”, completa.